Centeno admite recessão agora e retoma até ao fim do ano

Ministro das Finanças reconhece que a “paragem temporária” no tecido económico será “substancial”. Alinhado com Costa, atira a avaliação dos impactos para daqui a alguns meses.

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Mário Centeno diz que o SNS está mais bem equipado para “responder aos desafios” Daniel Rocha

A magnitude da crise económica associada à pandemia do novo coronavírus, por causa da interrupção da actividade de milhares de empresas e a suspensão das trocas comerciais, colocará Portugal e outros países em recessão no conjunto do ano de 2020, admite o ministro das Finanças português.

A previsão de Mário Centeno é, porém, a de que à redução “muito acentuada” da actividade no segundo trimestre de 2020 se seguirá uma recuperação até ao fim do ano. Esta é, afirma o também presidente do Eurogrupo, uma “crise temporária” embora de “duração indeterminada”.

Centeno falou destes impactos numa declaração aos jornalistas, através do Twitter, que teve como ponto de partida o resultado das contas públicas em 2019, ano em que — confirmou nesta quinta-feira o Instituto Nacional de Estatística — Portugal registou pela primeira vez em democracia um excedente orçamental nas suas contas públicas, o que significa que as receitas foram superiores às despesas em contabilidade nacional.

Com a crise da covid-19 a surgir nos primeiros meses de 2020, Centeno calcula que a “paragem temporária” no tecido económico será “substancial” e sublinha que isso terá um inevitável impacto nas contas públicas deste ano. Depois do excedente do ano passado, 2020 será de regresso ao défice. Mas, vincou o governante, neste momento é preciso que todo o país se concentre, não nessa dimensão, mas sim “nas tarefas imediatas” de conter a crise sanitária.

Questionado pelos jornalistas sobre o reflexo no saldo orçamental, o ministro não adiantou valores concretos, admitindo, porém, que os efeitos ao nível da quebra de receita e de aumento da despesa das administrações públicas “podem facilmente fazer com que o saldo orçamental em 2020 se venha a deteriorar em alguns pontos percentuais do PIB”.

Num discurso alinhado com a estratégia comunicacional do primeiro-ministro, Centeno afirmou que será preciso avaliar “dentro de alguns meses” o “impacto real desta crise” para depois avançar com a “mesma confiança” com que se vivia até meados de Março, altura a partir da qual a situação epidemiológica do novo coronavírus se agravou no país e noutros parceiros europeus.

“Nada disto se vai dissipar a partir do primeiro dia em que retomarmos a nossa normalidade, mas as empresas, trabalhadores, famílias e o Estado têm que estar todos concentrados em retomar a nossa vida tal como a conhecíamos no dia 15 de Março assim que tal for possível”, afirmou, considerando que, “vencido o desafio da crise sanitária, esse é o desafio seguinte”.

Medidas “alinhadas” com a UE

Na praça pública já surgiram apelos à concertação global, e não apenas a nível europeu, para ser desenhado um amplo programa de recuperação económica como o Plano Marshall, mas, neste discurso, Centeno passou ao lado desses apelos — como aquele que foi protagonizado pelo secretário-geral da OCDE, Angel Gurría —, aproveitando para dizer que as medidas de apoio anunciadas pelo Governo português para aplacar os efeitos da crise nas empresas e famílias estão “alinhadas” com a de outros países europeus.

“Estamos confiantes que, atendendo àquilo que são as medidas que temos adoptado, que estão em tudo alinhadas com as que os restantes países da União Europeia têm vindo a tomar, se possa continuar a cumprir o plano de financiamento com as adaptações necessárias àquilo que é o impacto temporal desfasado das medidas, em particular, as que têm a ver com a receita fiscal e daquilo que depois for a retoma da economia na segunda metade do ano”, disse.

Centeno saudou o saldo positivo nas contas públicas em 2019 e, fazendo a ponte para a crise sanitária que hoje se vive, salientou o investimento realizado no Serviço Nacional de Saúde (SNS) para afirmar que o país está hoje “muito melhor” equipado “para responder aos desafios que se nos colocam”.

O “rigor da execução orçamental”, disse, tem permitido adaptar o orçamento e, agora, responder a uma situação “sem precedentes na exigência que se coloca a todos — ao Estado e à sua execução orçamental”.

Em 2019, o saldo positivo foi de 403,9 milhões de euros, o equivalente a 0,2% do Produto Interno Bruto (PIB), com a despesa das administrações públicas a ser de 90.604 milhões de euros e a receita a totalizar os 91.008 milhões, segundo as estimativas divulgadas nesta quarta-feira pelo Instituto Nacional de Estatística.

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