Coronavírus: suspensos voos para Itália e eventos com milhares de pessoas em Portugal

Plano de contingência prevê duplicação do número de médicos e enfermeiros quando houver muitos casos de internamento e admite uso de máscaras por pessoas sem sintomas numa fase mais tardia. Há 39 casos de infecção confirmados.

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Há 39 casos de infecção confirmados em Portugal LUSA/MANUEL DE ALMEIDA

O Plano Nacional de Preparação e Resposta à Doença por novo coronavírus (covid-19) prevê que as autoridades de saúde possam ordenar o “isolamento coercivo" de casos suspeitos e confirmados de infecção em “situações extremas”, se o doente se recusar. As situações de isolamento que “ocorram fora de um contexto de declaração do estado de emergência” devem, porém, estar “previstas e tipificadas”, sublinham os especialistas que assinam este documento com a estratégia nacional de resposta à epidemia, em que se preconiza a duplicação do número de médicos, enfermeiros e assistentes operacionais quando o número de casos em que seja necessário internamento hospitalar for elevado.

Assinado por vários especialistas, o plano de contingência foi divulgado esta segunda-feira pela Direcção-Geral da Saúde (DGS), que o coordena, numa altura em que são já 39 os casos de infecção confirmados, e em que foi alterada a definição de caso suspeito, passando a estar incluídas e com possibilidade de serem testadas pessoas com graves doenças respiratórias, mesmo sem que se saiba a causa.

Governo decidiu, entretanto, suspender os voos com destino ou origem nas zonas mais afectadas pela epidemia em Itália, e recomendou a suspensão de eventos em espaços abertos com mais de cinco mil pessoas e de eventos à porta fechada com mais de mil participantes, além dos que reúnam mais de 150 pessoas nos concelhos onde há clusters de covid-19, como é o caso de Felgueiras e de Lousada. As medidas vigoram até 3 de Abril, segundo a ministra da Saúde citada pela Lusa.

São orientações que vão sendo conhecidas à medida que aumenta o número de infectados no país, o que obriga a activar mais hospitais e reforçar o stock de equipamentos de protecção individual. Esta última medida não está, porém, a revelar-se fácil, como admitiu a directora-geral da Saúde na conferência de imprensa que serviu para fazer o balanço da evolução da epidemia em Portugal.

Referindo-se aos concursos para a aquisição de equipamento de protecção individual anunciados no passado dia 5 pela Administração Regional de Saúde do Norte, Graça Freitas revelou que Portugal não está a conseguir adquirir todo o material que tem requisitado. “Há empresas que têm o material esgotado”, justificou na conferência de imprensa em que foi feito o balanço da epidemia em Portugal.

Reserva estratégica de medicamentos

No plano de contingência nacional, um documento com 80 páginas, está prevista a constituição de uma reserva estratégica de medicamentos e de dispositivos médicos que será armazenada no Laboratório Militar de Produtos Químicas e Farmacêuticos e gerida por uma Comissão de Gestão da Reserva, que ainda vai ser criada por despacho.

Também se preconiza a formação e treino dos profissionais dos diferentes sectores, com a realização de simulacros, sublinhando-se que as medidas a adoptar vão ser determinadas em função da evolução da situação e tendo em conta cada uma das fases de resposta à epidemia – após a fase de preparação, a de contenção, em que existem apenas casos importados, seguindo-se a fase de contenção alargada, quando há já cadeias secundárias de transmissão na Europa. Portugal encontra-se neste momento nesta fase. Segue-se a fase de mitigação, em que existe transmissão comunitária disseminada e o número de casos é já muito elevado.

Nesta última fase admite-se “condicionalmente” o uso de máscaras de protecção por pessoas sem sintomas mas com susceptibilidade acrescida em “grandes aglomerados populacionais ou de frequência de serviços de saúde” e por “cuidadores de indivíduos doentes no domicílio”, apesar de “não existir evidência que comprove a redução da propagação da infecção” da utilização de máscaras nestas situações.

Nesta fase pode igualmente ser ponderado o rastreio na admissão hospitalar ou a visitantes, aconselham os especialistas. Mas isto mesmo já está a ser feito actualmente em muitos hospitais do país.

Mais médicos , enfermeiros e assistentes operacionais

O encerramento de escolas é também equacionado, mas os especialistas aludem a medidas menos radicais que passam, por exemplo, pela redução do tamanho das turmas e pelo aumento do espaço entre alunos.

De igual forma o isolamento de locais de trabalho pode "ser contemplado em epidemias de gravidade extrema”, ainda que as medidas aconselhadas nas fases preliminares passem por horários de trabalho “flexíveis e desencontrados”, a promoção do trabalho à distância, a maior utilização do correio electrónico ou a teleconferência.

Para dar resposta à necessidade de internar um número elevado de doentes nos hospitais, aconselham os especialistas, será necessário um reforço considerável dos recursos humanos, mais médicos, enfermeiros e assistentes operacionais — 1,5 a duas vezes mais no caso dos adultos e 1,5 vezes mais médicos e três vezes mais enfermeiros e assistentes operacionais no caso das crianças, uma vez que os pais podem estar ausentes por doença. Deve ser ponderado igualmente o recurso a voluntários, lê-se no documento.

Além dos objectivos a atingir em cada área, no plano são elencados os “pontos críticos”. No capítulo sobre as medidas de saúde pública, assumem-se como “pontos críticos” as dificuldades em garantir a aplicação de medidas de prevenção e controlo de infecção em estruturas residenciais fechadas como lares e estabelecimentos prisionais.

Quanto a restrições à entrada de pessoas no país, esta pode ser uma medida “ineficaz que causa profunda disrupção económica e social”, enfatizam. Aos viajantes para áreas afectadas aconselham que reconsiderem viagens não essenciais e, a agentes de viagens, uma eventual mudança temporária das rotas turísticas que integram zonas de risco.

Doente com quadro clínico grave

O total de casos de infecção pelo novo coronavírus (covid-19) em Portugal aumentou esta segunda-feira para 39, mais nove do que no domingo e há uma doente com um quadro clínico mais grave, que se encontra em “vigilância apertada”. O ponto da situação foi feito pelo secretário de Estado da Saúde, António Lacerda Sales, em conferência de imprensa conjunta com a directora-geral da Saúde. Neste momento, há dez hospitais de referência para receber casos suspeitos e confirmados, entre os quais o de Faro. “À medida que a situação vai evoluindo, são activadas mais unidades e, com a evolução do surto, todos os hospitais poderão estar aptos a receber doentes”, disse o secretário de Estado.

Dos novos infectados, sete estão internados na região Norte e dois em hospitais da região de Lisboa e Vale do Tejo. Havia ainda 67 suspeitos de terem contraído a doença a aguardar resultados dos testes. Existem “à data cadeias de transmissão activas em Portugal”, que têm por base os primeiros casos de infecção, importados de Itália e Espanha, acrescentou o governante.

“Tirando no foco da região Norte, que é um foco mais activo, a situação está relativamente controlada”, assegurou Graça Freitas. “Não temos tido um crescimento desproporcionado e exponencial da doença. As medidas de contenção parecem estar a funcionar”. “Até ao momento estamos tranquilos, o que não quer dizer que amanhã ou dentro de dois ou três dias não possamos estar numa situação semelhante à de Itália. Não sabemos”, salientou ainda.

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