Duas cerimónias de tomada de posse ao mesmo tempo agravam crise política no Afeganistão

Ghani venceu as presidenciais de Setembro, segundo as autoridades eleitorais, mas Abdullah não reconhece o resultado. Ambos prestaram juramento esta segunda-feira.

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Braço-de-ferro entre Ghani (à esquerda) e Abdullah (à direita) está para durar Reuters/Jonathan Ernst

Ashraf Ghani e Abdullah Abdullah, adversários políticos nas eleições presidenciais de Setembro do ano passado, no Afeganistão, prestaram, ambos, juramento, esta segunda-feira, em diferentes cerimónias de tomada de posse. Os representantes dos dois dirigentes afegãos ainda encetaram negociações para se suspenderem os eventos até se encontrar um entendimento satisfatório para as partes, mas sem sucesso, num sinal claro de que o braço-de-ferro está para durar.

Pouco depois de Ghani iniciar a sua cerimónia, no Palácio Presidencial, em Cabul – que contou com a presença de diplomatas estrangeiros e representantes das forças militares norte-americanas e da NATO –, Abdullah também avançou com a sua própria tomada de posse.

A Comissão Eleitoral afegã só oficializou em Fevereiro o vencedor de uma eleição marcada por alegações de fraude, problemas técnicos com os dispositivos biométricos utilizados para votar, ameaças à segurança dos eleitores e outras irregularidades, declarando que Ghani obteve 50,64% dos votos, contra 39,52%, de Abdullah.

Mas o candidato derrotado não reconhece o veredicto das autoridades eleitorais e depois de impedir a invalidação dos votos fraudulentos, autoproclamou-se vencedor. 

“Ninguém deve subestimar o nosso compromisso com a democracia genuína. A invalidação dos votos fraudulentos é o caminho”, escreveu Abdullah no Twitter, esta segunda-feira, citado pela Reuters.

Para além de prejudicial para a situação política interna, muito frágil, no Afeganistão, esta situação de impasse está a bloquear as negociações de paz, protagonizadas por múltiplos actores – incluindo os Estados Unidos e os líderes dos grupos islamistas taliban – num país em guerra civil há várias décadas e que se prepara para a retirada das tropas norte-americanas do seu território.

“É quase certo que este impasse político vai atrasar as negociações entre afegãos e que vai trazer dificuldades na composição da equipa de negociações do Governo e nas suas posições sobre questões críticas”, diz à Al-Jazeera Andrew Watkins, analista do Afghanistan at the International Crisis Group.

Em declarações à cadeia televisiva qatari, Suhail Shaheen, porta-voz dos taliban, também considera que a disputa de Ghani e Abdullah pela presidência “não é um bom sinal para as perspectivas de paz no país”.

Ashraf Ghani e Abdullah Abdullah já tinham protagonizado um braço-de-ferro semelhante, depois das eleições de 2014. Após mediação dos EUA, acabaram por integrar os dois o mesmo governo, com o primeiro ficar com o cargo de Presidente e o segundo a assumir o papel de chefe-executivo, posto criado de propósito para se ultrapassarem as divergências.

No seu discurso, esta segunda-feira – que chegou a ser interrompido, quando dois rockets, supostamente disparados pelo grupo terrorista Estado Islâmico, atingiram as imediações do palácio –, Ghani prometeu que o seu Governo não vai ser composto apenas por membros da sua família política.

“Vamos fazer consultas e formar um Governo inclusivo”, afiançou o Presidente.

O chefe de Estado revelou que irá apresentar na terça-feira a sua equipa para as negociações directas com os taliban. Esperam-se, por isso, novidades, em relação à decisão final de Ghani sobre a exigência dos islamistas para se sentarem à mesma mesa – querem a libertação de cerca de cinco mil combatentes taliban das prisões afegãs

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