Coronavírus: especialistas não defendem rastreios à entrada de Portugal

Especialista em saúde pública defende que, face à previsível “grande pressão” que a epidemia do coronavírus vai colocar no futuro sobre o sistema de saúde, os casos suspeitos deveriam ficar em isolamento em casa em vez de irem para os hospitais.

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Manuel Roberto

Face ao rápido aumento de casos de infecção pela nova estirpe do coronavírus (Covid-19) no Norte de Itália, que até segunda-feira à noite infectou mais de duas centenas de pessoas e provocou sete mortes, o nível de preocupação disparou na Europa e Portugal decidiu também reforçar as medidas de prevenção e contenção. Passam agora a estar disponíveis mais cinco hospitais para receber casos suspeitos, para além dos três que já o estavam a fazer, e foram activados mais quatro laboratórios para os testar. Nos voos vindos de Itália, começarão também em breve a ser distribuídos folhetos informativos.

O reforço das medidas de contenção faz sentido para os epidemiologistas e especialistas em saúde pública ouvidos pelo PÚBLICO, mas, se alguns crêem que são suficientes, outros consideram que, tendo em conta a alteração de paradigma face à realidade de há alguns dias, seria necessário ir mais longe e activar um plano de contingência mais vasto, para além das orientações técnicas já divulgadas. É o caso de Ricardo Mexia, presidente da Associação Nacional dos Médicos de Saúde Pública. Todos concordam, porém, que não faz sentido avançar com rastreios à entrada do país e lembram que nem sequer há recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS) nesse sentido.

Ainda antes de conhecer as novas medidas anunciadas na tarde de segunda-feira pela Direcção-Geral da Saúde (DGS), Ricardo Mexia admitia que a transmissão generalizada e rápido aumento de casos em Itália está a deixar os profissionais de saúde “muito preocupados”. “É necessário que sejamos muito ágeis a fazer a detecção rápida e registar os contactos dos casos suspeitos”, recomenda.

Já o ex-presidente da Associação Portuguesa de Epidemiologia, Jorge Torgal, preconiza que Portugal deve “continuar a fazer o que tem feito” e seguir as recomendações da OMS. “A situação continua a ser tranquila, sem lugar para alarmismos, apesar de o surto em Itália ser preocupante”, considera também o médico. A atitude da DGS e do Ministério da Saúde tem sido correcta, não há lugar para novas medidas enquanto não houver casos (de infectados) em Portugal”, sustenta.

Frisando que não se deve alimentar a “paranóia” gerada em torno de toda esta situação, o especialista em saúde pública e epidemiologia Henrique Barros defende que seria necessário ter a “coragem” de adoptar outro tipo de estratégia em Portugal. 

Tendo em conta o previsível aumento de casos suspeitos nos próximos tempos e a consequente “pressão muito grande que vai ser colocada sobre o sistema de saúde”, Henrique Barros acredita que faria mais sentido colocá-los em isolamento em casa. As equipas de profissionais de saúde iriam às residências das pessoas recolher amostras para fazer análises laboratoriais, como “está a ser feito em Inglaterra”. E o risco de contágio de familiares? “É muito pequeno, se as pessoas mantiverem um metro de distância, se não tossirem nem espirrarem” para cima destes, garante.

Seja como for, há razões para preocupação, corrobora. “Aparentemente, esta infecção tem potencial de grande disseminação. Mesmo com as quarentenas todas já vai quase em 100 mil infectados. O exemplo do que aconteceu no navio de cruzeiro Diamond Princess [no Japão] é preocupante. Deviam ter retirado logo as pessoas, porque em ambientes fechados a contagiosidade é brutal. Era mais lógico permanecerem num local arejado e sossegado.”  Mas o que é fundamental, advoga, “é ter calma, um bom sistema de informação e registar os contactos dos infectados”.

Por enquanto, o padrão de mortes registado em Itália é semelhante ao verificado na China. São as pessoas mais idosas e com doenças associadas, como cancro, diabetes, doenças respiratórias e outras que deprimam o sistema imunitário, que estão a ser mais afectadas.

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