Alterações climáticas põem em causa avanços para as crianças

Comissão de peritos convocados pela Organização Mundial de Saúde, a Unicef e a The Lancet concluem que nenhum país está a cumprir o objectivo de garantir às crianças um futuro em que elas se possam desenvolver plenamente.

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Crianças na Beira, em Moçambique, afectadas pela passagem do ciclone Idai, em Março de 2019 Daniel Rocha

Apesar de os cuidados de saúde, nutrição e educação para a infância (dos 0 aos 18 anos) terem melhorado muito nas últimas décadas, eles estão em risco de começar a regredir, em grande parte, por causa das alterações climáticas. A degradação ecológica, as migrações, os conflitos, as desigualdades e as “práticas comerciais predatórias”, que incentivam os mais novos a tipos de consumo que lhe são prejudiciais são outras das razões apresentadas por um grupo de especialistas que exige que os governos do mundo mudem as suas metas de desenvolvimento sustentável (SDG, na sigla inglesa), colocando as crianças no seu centro. E deixando-as participar nas decisões.

As conclusões constam de um relatório divulgado esta quarta-feira, com o título Um futuro para as Crianças do Mundo? (A future for the World’s Children?, no original). O documento foi construído por uma comissão de mais de 40 peritos em saúde para a infância de todo o mundo, convocados pela Organização Mundial de Saúde, a Unicef e a publicação científica The Lancet.

“As nossas crianças enfrentam um futuro de grandes oportunidades, mas estão no limiar de uma crise climática. Trabalhando em conjunto, os países do mundo concordaram com a estrutura das SDG para darem início a um mundo mais limpo e saudável, mas a agenda dessas SDG ainda não ganhou força. O nosso desafio é enorme e parecemos estar paralisados”, lê-se nas conclusões do documento.

O primeiro passo tem de ser acabar com essa paralisia, defendem os responsáveis pelo relatório, e a melhor forma de o fazer é colocando as crianças “no centro do conceito de sustentabilidade e do nosso esforço humano partilhado.” “Os governos devem desenvolver coligações através de vários sectores para ultrapassar as pressões ecológicas e comerciais e garantirem que as crianças têm acesso aos seus direitos agora e a um planeta habitável nos anos que se seguem”, acrescentam.

Argumentando que as alterações climáticas e as consequências que lhes estão associadas – como o aquecimento global ou a subida do nível médio do mar – ameaçam o futuro de todas as crianças do mundo, os especialistas defendem que nenhum país está a cumprir a obrigação de garantir à geração mais nova a possibilidade de se desenvolver em plenitude. E num índex com 180 países em que é analisada a qualidade do desenvolvimento infantil, torna-se claro que os países mais pobres são os que têm mais dificuldade em garantir vidas mais saudáveis às suas crianças.

Paradoxalmente, refere-se no comunicado que divulga o estudo, estes são também os países com menores emissões de gases com efeito de estufa. E entre os países que mais qualidade de vida conseguem garantir para os mais pequenos (Portugal está na 22.ª posição) encontram-se alguns que aparecem como tendo o pior desempenho na redução de emissões de dióxido de carbono (CO2) per capita.

“Embora temerosos pela escala da nossa tarefa, esta comissão está optimista em relação à possibilidade de melhorarmos o mundo para melhor, para e com as crianças. Vão ser precisos políticos ousados, líderes comunitários corajosos e agências internacionais disponíveis para mudar radicalmente a forma como trabalham. Sem desculpas e sem tempo a perder”, concluem.

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