Los Angeles acusa Weinstein no dia em que se inicia julgamento em Nova Iorque

Primeiro dia do produtor em tribunal marcado por novas acusações de violação e por uma conferência de imprensa em Manhattan com as actrizes Rosanna Arquette e Rosie McGowan e outras vítimas de Weinstein.

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As actrizes Rosanna Arquette e Rose MCGowan com a jornalista de televisão Lauren Sivan no início do julgamento de Harvey Weinstein em Nova Iorque JASON SZENES/ EPA

No próprio dia em que se inicia o seu julgamento em Nova Iorque, por violação e outras agressões sexuais contra duas mulheres ainda não identificadas, o produtor Harvey Weinstein foi esta segunda-feira formalmente acusado em Los Angeles de ter violado uma mulher e agredido sexualmente outra em Los Angeles, em dois dias consecutivos (18 e 19 de Fevereiro) de 2013. “Acreditamos que as provas mostrarão que usou o seu poder e influência para ter acesso às vítimas e cometeu crimes violentos contra elas”, disse a procuradora responsável, Jackie Lacey.

A segunda destas mulheres poderá vir a testemunhar no processo de Nova Iorque, adianta a agência Associated Press, segundo a qual o ministério público de Los Angeles está ainda a investigar queixas de crimes sexuais que outras três mulheres apresentaram contra Weinstein, às quais se somarão ainda mais três pelas quais o produtor já não poderá ser acusado em tribunal por os alegados crimes estarem prescritos.

Weinstein, que já enfrenta uma possível pena de prisão perpétua em Nova Iorque, pode vir a ser condenado a 28 anos de prisão neste novo processo, que deverá iniciar-se logo que termine o julgamento em Nova Iorque, onde os seus advogados viram esta segunda-feira recusado o pedido para chamar a depor Nicholas DiGaudio, um polícia que foi afastado da investigação por alegadamente ter ocultado provas que poderiam ter auxiliado a defesa do produtor.

Operado há alguns meses, Weinstein chegou esta segunda-feira ao tribunal de Nova Iorque a mover-se com o auxílio de um andarilho. À sua espera estavam algumas das muitas mulheres que já o acusaram publicamente, incluindo a actriz Rosanna Arquette, a primeira a intervir numa conferência de imprensa montada nas imediações do tribunal. “Acabou o tempo para o assédio sexual nos locais de trabalho, acabou o tempo de culpar as vítimas, acabou o tempo das desculpas vazias e sem consequências, e acabou o tempo da disseminada cultura de silêncio que permitiu abusadores como Harvey Weinstein”, afimou a actriz.

Enquanto se iniciava, no interior do edifício, o moroso processo de constituição do júri, sete mulheres subiram à improvisada tribuna em representação das mais de 90 que já vieram a público contar as experiências de agressão ou abuso sexual que terão sofrido às mãos de Weinstein. São as silence breakers (as que romperam o silêncio), como se chamam a si próprias, e vieram exigir justiça, mas também celebrar o que consideram ser já uma mudança cultural irreversível.

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"Oiçam as sobreviventes" lia-se à porta do tribunal no início do julgamento de Harvey Weinstein Jeenah Moon/REUTERS

“Estamos aqui para garantir que este processo criminal se focará nos perpetradores e nas suas acções, e não nas vítimas, e que seja feita justiça”, disse ainda Arquette, que cedeu depois a vez à actriz Rose McGowan, uma das primeiras a denunciarem publicamente Weinstein, em 2017, vinte anos após o produtor alegadamente a ter violado num quarto de hotel durante o Festival de Sundance. “Querido Harvey, não importa que mentiras contas a ti próprio: tu fizeste isto, e hoje a D. Justiça está a olhar para um super-predador”, começou McGowan, explicando que fizera questão de participar neste encontro com jornalistas para “ser uma voz” ao serviço de todas aquelas que se mantêm em silêncio, como ela própria se manteve durante muito tempo.

“Este é um dia para honrarmos o caminho que já fizemos e tudo o que sofremos para aqui chegar, mas não é o fim”, acrescentou a actriz, deixando um aviso: “Saibam que somos livres, que somos lindas, que somos fortes e que nunca nos tirarão isso — as sobreviventes nunca desistirão”.

A comediante e escritora Sarah Ann Masse, que em 2008 foi a casa do produtor enquanto babysitter e se viu recebida por um Weinstein em cuecas que a terá abraçado contra a sua vontade, acusou-o de “desenvolver tácticas de terror para silenciar aquelas que durante anos não conseguiram falar”. O processo que agora chega a tribunal “mostra que os abusadores serão responsabilizados”, argumentou, fazendo votos de que “o juiz e o júri tomem a decisão correcta e ponham este homem perigoso atrás das grades, onde poderá passar o resto dos seus dias a pagar pelos seus crimes”. Mas seja qual for o desenlace jurídico, assegurou que continuará “a lutar por um mundo que acredite nos sobreviventes e responsabilize os abusadores, e no qual o respeito e a segurança sejam a regra e não a excepção”.

Se as actrizes Louise Godbold e Dominique Huett e a modelo Paula Williams fizeram apenas breves declarações, a jornalista Lauren Sivan contou como, após “vinte anos a tentar construir um nome como jornalista”, acabou “conhecida como ‘a rapariga da planta envasada’” por causa de um encontro casual com Weinstein em 2007. Este tê-la-á encurralado numa zona de acesso restrito de um restaurante, obrigando-a a assistir enquanto se masturbava e ejaculava para uma planta de interior que decorava o local. “Não me importo de ser conhecida como a ‘potted plant girl’ se ele for conhecido para sempre como o predador e violador que é”, garantiu Sivan. “Weinstein receia agora que não o lembremos por todo o trabalho que realizou pelas mulheres, mas está enganado”, observou. “Sem dúvida que o vamos lembrar: ele pôs o MeToo no mapa, um movimento que conquistou o país e o mundo, ele mudou a política relativa ao assédio sexual no local de trabalho (…), ele tornou as denúncias de abuso sexual mais eficazes e mais seguras”.

Na fase reservada às questões dos jornalistas, um repórter perguntou a Rose McGowan como lhe parecera Weinstein na chegada ao tribunal, ao que a actriz respondeu: “Pareceu-me um homem muito alquebrado, acho que recebeu bons conselhos de interpretação”. E Rosanna Arquette acrescentou: “O problema é que há muita gente que tem pena do violador, especialmente em Hollywood”.

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