20 anos de Putin

A mão de Vladimir Putin estende-se da Ucrânia à Líbia, de Barcelona aos Estados Unidos e o país que governa, o maior do mundo, é mantido sob estrita vigilância.

Nos balanços da década, tem surgido uma figura, não tanto como determinante para o sentido da história, mas exemplar no sentido que ela foi tomando nos últimos anos. Viktor Orbán, o primeiro-ministro da Hungria, é referido como exemplar – foi eleito em 2010 – dos populismos construídos na capacidade de torcer e encolher a democracia até a transformar na contradição em termos que é “democracia iliberal”.

Mas seria injusto não salientar que há alguém que na última década – mas ainda antes disso, pois em 31 de Dezembro cumprem-se 20 anos que, num discurso de passagem de ano, lhe foi entregue o poder – tem sido, ele sim, determinante no inclinar da História para idêntico pendor autoritário. Mesmo na sombra, a mão de Vladimir Putin estende-se da Ucrânia à Líbia, de Barcelona aos Estados Unidos e o país que governa, o maior do mundo, é mantido sob estrita vigilância. A experiência bem sucedida de isolar a Internet da Rússia, o assalto às instalações da fundação do líder da oposição, ou a entrada ao serviço de um míssil hipersónico capaz de escapar às defesas dos EUA, tudo eventos desta semana, são o que é já habitual no percurso de um ditador ambicioso.

O foco norte-americano no alargamento da influência chinesa não pode deixar os europeus distraídos da ameaça que representa o seu vizinho continental. A notícia de anteontem de que três espiões russos se deslocaram à Catalunha em vésperas do referendo é só mais um sinal, a juntar à interferência nas eleições norte-americanas ou no referendo britânico, que mostra a vontade de Putin de vingar através da desestabilização das democracias ocidentais.

Podemos achar que o estereótipo do agente russo, fonte do mal, que dominou o cinema de espionagem e acção durante décadas caiu em desuso. Mas devíamos recordar que Putin é um filho do KGB e que o livro The Foundations of Geopolitics de Alexandre Dugin, publicado em 1997, ajudou a forjar o novo nacionalismo russo. Para a Rússia afirmar o seu poder, escreveu, é necessária a “rejeição do atlantismo, o controlo estratégico dos EUA e a recusa em permitir que os valores liberais dominem [o país]”.

Importante, para Alexandre Dugin, é cultivar a ideia da Rússia enquanto império, enquanto potência capaz de se afirmar para lá das suas fronteiras. Sem uma economia ou tecnologia capazes de ser fonte de influência, a estabilidade e a capacidade de os russos continuarem a ser actores no palco internacional tem sido determinante para Putin manter e alargar o seu poder. Quanto mais ele tiver sucesso, mais as nossas democracias e a nossa liberdade estarão ameaçadas.

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