PSD diz que Governo foi “omisso” na RTP; ministra e esquerda questionam se deviam interferir

Debate de actualidade no Parlamento sobre a polémica na direcção de Informação da RTP a pedido do PSD.

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Graça Fonseca, ministra da Cultura LUSA/José Sena Goulão

Foi um jogo do empurra aquele em que se envolveu a direita, a esquerda e a ministra da Cultura esta tarde de quinta-feira no plenário da Assembleia da República. Empurram-se responsabilidades mas sobretudo uma acusação latente - interferir ou não, governamentalizar ou não a RTP.

O PSD marcou um debate de actualidade para debater a polémica em torno da Informação da RTP e chamou ao Parlamento a ministra da Cultura. O deputado social-democrata Paulo Rios de Oliveira não se cansou de, ao mesmo tempo, deixar latente a acusação de instrumentalização política sobre a direcção de Informação e também acusar a ministra da Cultura de não garantir a independência da mesma. 

Tanto a ministra como a esquerda devolveram a bola à direita: lembraram que o novo modelo de governação da RTP foi desenhado pelo executivo de Pedro Passos Coelho e pressupõe que o Governo não tenha qualquer palavra na escolha da administração ou das direcções e quiseram saber se o PSD quer realmente que a estação pública volte a ser governamentalizada.

No final, o PSD vincou que “gostava de ter ouvido alguém dizer que é tudo mentira e que não aconteceu”. A esquerda “não consegue negar o que foi dito” sobre o caso Sexta às 9, atiraram os sociais-democratas.

“Algo de grave se passa na RTP e algo de grave se passa no Governo”, começara por apontar Paulo Rios de Oliveira. Que depois desfiou as “coincidências” da história do programa Sexta às 9, cujo regresso foi empurrado de Setembro para depois das eleições de Outubro, com o consequente adiamento de uma reportagem sobre o “escândalo do lítio” em Montalegre com “acções e omissões do Governo, intervenção do Ministério Público e que estava a causar embaraço ao Governo”. Lembrou as versões contraditórias apontadas numa audição parlamentar pela directora de Informação e pela coordenadora do programa, assim como a história de um contacto directo do secretário de Estado João Galamba que, após recusa insistente em responder ao programa, foi depois directamente à direcção de Informação pedir para ser ouvido. A reportagem foi “congelada e a jornalista silenciada (...), reforçando a ideia do frete político ao PS e ao Governo”, acusou Paulo Rios de Oliveira.

Ao “nebuloso episódio”, como lhe chamou o deputado, somou-se o da investigação a uma alegada fraude no Iscem. E depois a demissão da directora de Informação, Maria Flor Pedroso, e o plenário de jornalistas que a acusou de violação dos deveres deontológicos e deslealdade para com a redacção.

“E o Governo desaparece de cena e quem tem a tutela e devia reagir remete-se ao silêncio”, apontou o deputado do PSD. “Quem passa o cheque não manda.” Estes episódios, disse Paulo Rios de Oliveira, “mancham a imagem do Governo por acção do secretário de Estado João Galamba e pela omissão da ministra da Cultura” e são para a RTP “graves e injustos, com danos reputacionais que comprometem a qualidade, rigor e seriedade da sua informação. O exemplo tem de vir de cima e não veio. São injustas para os 1600 trabalhadores da RTP.”

Foi do PCP que veio a pergunta que depois seria repetida pelo resto da esquerda e pela ministra Graça Fonseca. “O que é que o PSD pretende com este debate? É vir meter a colherada relativamente à independência editorial de um órgão de comunicação social? É para criticar uma direcção de Informação que já não existe? Também não faz sentido.”

O deputado António Filipe insistiu: “É para questionar o Governo sobre a sua ausência de intervenção? Mas não foi o PSD que fez aprovar aqui um novo estatuto da RTP que era absolutamente blindada à intervenção do Governo porque toda a estratégia seria ditada por um CGI cuja independência era à prova de bala? E queriam acabar com a intervenção governamental. E agora vem criticar porque o Governo não intervém?”

Apanhado na contradição, Paulo Rios de Oliveira limitou-se a lembrar que todos os deputados votaram favoravelmente a audição da directora, da jornalista e da administração da RTP e argumentou que o tema é “actual e relevante” e que é competência do Parlamento “fiscalizar um conjunto de órgãos e o Governo”.

O Bloco preferiu defender que a RTP precisa de mudar o sistema de governação, acabando-se com o CGI que só tem servido para “entronizar um presidente - um ex-deputado do PSD” e que “nunca tratou seriamente qualquer dos problemas estruturais da empresa”. O deputado Jorge Costa desafiou o PSD a dizer qual o balanço que faz do órgão de fiscalização que criou - “uma entidade obscura e não escrutinada”. Na Primavera, os bloquista entregaram um projecto de lei em que propunham acabar com o CGI e a nomear o presidente da RTP pela AR, sob parecer do conselho de opinião - e vão insistir nessa proposta.

O socialista José Magalhães usou da ironia para ligar a “vozearia, zaragata e guerrilha interpartidária ao mais baixo nível” que o PSD quer fomentar à sua campanha interna pela liderança do partido. O episódio “faz parte da descida do PSD ao inferno da política trauliteira e das fake news"; é uma “intrigalhada plantada”, disse, lembrando que é Rui Rio quem agora faz “justiça de tabacaria” com um “chorrilho de inverdades que parece uma boneca espanhola”. O deputado do PS citou o que diz o programa eleitoral do PSD sobre a RTP para concluir que a intenção é “destruir a diversidade” da estação e extinguir a empresa.

O CDS preferiu manter-se ao lado da discussão e recusou que a AR se possa imiscuir em questões internas da Informação da RTP porque isso “seria ingerência do poder político na comunicação social”. Mas Ana Rita Bessa salientou que deve fazer o “escrutínio” da actividade da RTP para garantir a sua independência. “A RTP é uma TV pública e nunca deve resvalar para ser uma TV do Estado.” E a deputada do PAN Cristina Rodrigues quis saber quando é que o orçamento da RTP vai ser reforçado - mas ficou sem resposta.

A ministra da Cultura seguiu o guião socialista: alegou que o Governo, “nos termos da lei, não tem nenhum poder relativamente à RTP”, acusou o PSD de “desestabilização e ingerência” na estação pública “para descredibilizar, denegrir e poder voltar a defender a privatização” como fez no passado. “Ao contrário do PSD, nós nunca defendemos a privatização e não interferimos na RTP. (...) Não, o Governo não intervém e não tem tutela como querem porque em 2014 aprovaram um modelo de governação que retirou qualquer possibilidade de o Governo intervir no conselho de administração e na direcção de Informação.”

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