EDP vende seis barragens por 2,2 mil milhões

Centrais hídricas do Douro vendidas a consórcio de empresas francesas, onde entram a Engie e o Crédit Agricole.

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A polémica barragem do Foz Tua está entre os activos que foram vendidos a um consórcio liderado por franceses. MANUEL ROBERTO

Foi num dia de dilúvio e ventos fortes que a EDP anunciou a venda de seis barragens na bacia do Douro.

A operação, que permitirá à eléctrica encaixar 2200 milhões de euros, e que deverá ficar concluída só no segundo semestre de 2020, vai marcar a entrada de um novo operador no mercado da produção hidroeléctrica em Portugal: o comprador, um consórcio de empresas francesas liderado pela Engie, ficará com a segunda maior fatia do mercado (21%), seguida da Iberdrola, que terá 15% da produção das grandes barragens quando puser em funcionamento o complexo hidroeléctrico do Tâmega.

Quanto à EDP, continuará a ser o maior produtor hídrico em Portugal, mas a sua quota descerá dos 100%, para 64% (com uma capacidade de geração hídrica instalada de 5,1 Gigawatts).

Essa é uma das razões que leva o presidente da empresa, António Mexia, a dizer-se “optimista” quanto à aceitação do negócio por parte do Governo: a operação “aumenta o nível de concorrência no mercado”, frisou hoje o gestor, em conferência de imprensa.

Além disso, a Engie - que tem 40% do consórcio onde também estão o Crédit Agricole Assurances (35%) e Mirova - Grupo Natixis (25%) - é um investidor “estratégico”, que tem “uma visão de longo prazo para o mercado”.

Logo, a questão da “confiança e credibilidade técnica” do comprador também não será um entrave a que o negócio se faça, referiu.

Além do escrutínio da Agência Portuguesa do Ambiente (APA), a operação terá também de ser analisada pela Autoridade da Concorrência (AdC) e haverá que garantir licenciamentos por parte da Direcção-geral de Energia e Geologia. 

O processo passará pela criação de uma empresa autónoma, onde serão concentrados todos os  activos e pessoas das seis centrais: três centrais de fio de água (Miranda, Bemposta e Picote) com 1,2 Gigawatts (GW) de capacidade instalada e três centrais de albufeira com bombagem (Foz Tua, Baixo Sabor e Feiticeiro) com 0,5 GW de capacidade instalada.

Será essa empresa que será vendida ao consórcio de capitais franceses, explicou o administrador financeiro da EDP, Miguel Stilwell de Andrade.

Já o administrador responsável pela EDP Produção, Rui Teixeira, sublinhou que “não está em causa nenhum despedimento” e que os trabalhadores das seis centrais (cerca de 50) serão livres de escolher se querem ou não passar para a nova empresa.

A venda das barragens não é propriamente uma surpresa porque, em Março, a eléctrica anunciou um programa de venda de activos, com o objectivo de arrecadar cerca de dois mil milhões de euros em 18 meses.

Tratou-se de um processo “muito competitivo”, em que “a Engie apresentou inequivocamente a melhor proposta”, disse Mexia.

O objectivo desta recomposição de portefólio “era essencialmente reduzir dívida” (a empresa comprometeu-se em Março a reduzir o endividamento em dois mil milhões, para 11,5 mil milhões em 2022. Em Junho deste ano a dívida estava nos 14 mil milhões). Mas a operação também ajudará a eléctrica “a reduzir a volatilidade nos resultados” e a melhorar o seu perfil de risco (isto porque diminuirá a fatia dos seus resultados que fica exposta ao preço de mercado e ao risco hidrológico, num futuro que se perspectiva com menos chuva).

Apesar de manter “o compromisso” com a tecnologia hídrica, porque é renovável, a EDP quer apostar no solar, na eólica e em projectos inovadores como o hidrogénio verde.

Carvão corta lucro

O último é um dos cenários que está a ser estudado para viabilizar o futuro da central a carvão de Sines (que o Governo pretende encerrar até 2023), que este ano obrigará a empresa a reconhecer na contas uma imparidade de 300 milhões de euros.

A empresa reconheceu que “a perda de rentabilidade” das centrais a carvão retirará 200 milhões ao resultado líquido deste exercício e assegurou que não haverá encargos futuros relacionados com Sines (que emprega cerca de 400 pessoas), pois todos os custos de descomissionamento da central estão já provisionados.

Frisando que o reconhecimento da imparidade de 300 milhões “não tem impacto nenhum na política de dividendos” (pagamento de 19 cêntimos no período entre 2019 e 2022), Mexia quis deixar claro que não se trata de um “anúncio de encerramento” de Sines, mas também reconheceu que a central só deverá continuar a funcionar enquanto for rentável.

A central tem estado neste ano muitos dias parada e é expectável que isso continue a acontecer, num contexto em que a sua competitividade face a outras centrais é penalizada pelo aumento do preço das licenças de emissões de CO2, pela redução dos preços do gás, e pelo agravamento da fiscalidade.

Ontem, a EDP também anunciou a assinatura de um novo contrato de 15 anos para venda de energia eólica na Polónia, a partir de 11 projectos eólicos, num total de 370 megawatts de potência. Um dos objectivos da empresa passa por conseguir, a partir do próximo ano, ter 80% do seu lucro operacional assente em contratos de longo prazo.  Além disso espera ter, já em 2020, 80% da produção assente em fontes renováveis.

São passos para “para um crescimento saudável” e para “entregar uma política de dividendos, que nunca esteve em causa nos últimos 15 anos”, frisou Mexia.

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