Nova Zelândia lança plano arriscado para resgatar desaparecidos no vulcão Whakaari

Suspeita-se que os desaparecidos estejam mortos. As autoridades vão tentar recuperá-los, numa operação precipitada pelo “desespero” das famílias. “Muita coisa tem de dar certo para que isto funcione.”

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O vulcão Whakaari – o seu nome na língua do povo maori Reuters/Jorge Silva

As autoridades neozelandesas vão voltar ao local da erupção do vulcão Whakaari na manhã de sexta-feira para devolver os corpos das vítimas às suas famílias “desesperadas” – apesar do risco de uma nova erupção. O plano para a “recuperação de alta velocidade” das vítimas da erupção vulcânica desta sexta-feira está traçado e foi anunciado esta quinta-feira.

Este regresso à ilha Branca constitui uma mudança de planos: há menos de 24 horas, o aumento da actividade sísmica da ilha ditou o adiamento das operações de recolha dos oito turistas desaparecidos. A recuperação destas pessoas – que a polícia presume estarem mortas, juntando-se aos oito mortos já confirmados – foi dada como “uma prioridade”, mas “para enviar as equipas é necessário ter a certeza absoluta de que é seguro”, sublinhou Bruce Bird, comissário da polícia, numa conferência de imprensa em Whakatane, na última quarta-feira.

No entanto, o “desespero” das famílias das vítimas fez com que as autoridades repensassem o arriscado plano, revelou a presidente da câmara de Whakatane, Judy Turner, citada pela BBC e pela Reuters. “A frustração daquelas famílias é completamente compreensível. A ausência de notícias não são boas notícias para estas pessoas.”

Qual é o plano?

Oito especialistas das Forças Armadas neozelandesas vão descer à ilha na sexta-feira de manhã (noite de quinta-feira em Portugal) para tentar recuperar os oito corpos dos turistas ainda desaparecidos. Em Whakatane, a cerca de 50 quilómetros do local do desastre, vão estar vários vulcanólogos a dar indicações em tempo real aos militares que estarão na ilha, detalha o The Guardian.

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As autoridades já sobrevoaram a ilha várias vezes e conseguiram identificar o paradeiro de seis corpos – a localização dos outros dois ainda não é conhecida e vai haver “oportunidades limitadas para os encontrar”, declarou Mike Clement, vice-comissário da polícia, aos jornalistas. Os militares vão entrar e sair da ilha tão depressa quanto possível devido ao alto risco que correm. E, no entanto, vão ter de arranjar tempo para recolher o maior número de provas das identidades dos corpos.

O vulcão da ilha Branca mantém-se “altamente volátil”, descreve Clement. As condições meteorológicas, a direcção do vento e o estado do mar também vão ter de colaborar para que o plano chegue a bom porto. “O risco de que vos falei esta manhã [quarta-feira] ainda não passou. Não esperamos que nada mude durante a noite ou amanhã no que diz respeito ao perigo”, disse Clement. “Muita coisa tem de dar certo amanhã para que isto funcione.”

A pressão das famílias falou mais alto, admitiu o vice-comissário. O risco de uma nova erupção pode significar que os corpos fiquem perdidos para sempre. Por isso, Clement diz que o resgate é prioridade absoluta, mesmo que isso implique a destruição de provas. 

“Não há ninguém nesta sala com mais vontade de ir para aquela ilha do que a polícia – é este o nosso compromisso com esta comunidade, com estas famílias, eu sei que toda a gente está de olhos postos em nós.”

O que dizem os cientistas?

Graham Leonard, cientista nos serviços geológicos neozelandeses, disse que o equipamento de monitorização vulcânica da ilha ainda está activo — apesar da erupção — e que, nesta quarta-feira, a probabilidade de uma nova erupção se situava entre 40% a 60%. “Hoje ainda é menos seguro do que ontem e o dia anterior.

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O perigo está constantemente a ser avaliado. “Este nível de actividade vulcânica é o mais alto que já observámos desde a erupção de 2016.” 

No caso de uma nova erupção, todas as pessoas que estiverem na ilha podem acabar “esmagadas” por rochas projectadas ou apanhadas por gases e fumos cujas temperaturas podem ascender às centenas de graus Celsius, explicou o vulcanólogo Nico Fournier, ouvido pela Reuters.

Na quinta-feira, os gases representavam também um dos maiores perigos para as equipas de resgate.

Maori abrem excepção para resgate

Vários grupos maori, povo nativo na Nova Zelândia, decretaram que o acesso às águas ao largo do vulcão está proibida a visitantes e pescadores desde o desastre. Este tipo de declarações está longe de ser uma proibição formal, mas o seu carácter simbólico faz com que sejam normalmente respeitadas pelos neozelandeses. Os maori abriram uma excepção para as equipas de resgate.​

Este tipo de interdições é normalmente aplicada a algumas áreas depois de mortes, acidentes, ou para proteger os recursos naturais de uma área específica.

A primeira-ministra neozelandesa, Jacinda Ardern, disse que iria lançar uma investigação à tragédia e que iria rever os acessos a locais vulcânicos na Nova Zelândia.

Como estão os feridos?

Estavam 47 pessoas na ilha no momento da erupção, com idades compreendidas entre 13 e 72 anos — 24 eram originárias da Austrália, nove dos Estados Unidos, cinco da Nova Zelândia, quatro da Alemanha, dois da China, dois do Reino Unido e uma da Malásia.

Oficialmente, morreram oito pessoas. Muitos sobreviventes ainda estão nos cuidados intensivos, a maioria com queimaduras em mais de 70% do corpo. As unidades de queimados de diversos hospitais no país estão no limite das suas capacidades (ou perto dele).

De acordo com o jornal neozelandês New Zealand Herald, as autoridades já decretaram a importação de 120 metros quadrados de pele humana dos Estados Unidos e da Austrália de modo a tratar os sobreviventes. A quantidade de pele necessária equivale à que resultaria de 60 doadores. Na Nova Zelândia, apenas cinco a dez pessoas doam pele a cada ano (após a morte).

erupção vulcânica ocorreu às 14h11 de segunda-feira (mais 13 horas do que em Portugal) e expeliu detritos rochosos, cinzas e uma densa coluna de fumo a 3600 metros de altura. O Whakaari – o seu nome na língua do povo maori – é o vulcão mais activo da Nova Zelândia e quase 70% está debaixo de água (ou seja, apenas 30% se encontra visível), o que faz com que seja uma das maiores estruturas vulcânicas do país. Era um destino concorrido para viagens de um dia — este tipo de passeios trazem mais de 10 mil visitantes por ano à ilha Branca (que é propriedade privada), publicitada como “um dos vulcões marinhos mais acessíveis do mundo”.

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