Argentina tem novo Presidente, sob o olhar dos mercados financeiros e do populismo de Kirchner

Alberto Fernández, visto como um representante moderado na esquerda peronista, tomou posse como chefe de Estado. A sua missão é recuperar a economia cortando com a austeridade, mas sem permitir o regresso em força da sua vice-presidente, Cristina Kirchner.

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Alberto Fernández e Cristina Kirchner LUSA/Juan Ignacio Roncoroni

A viragem da Argentina à direita, em 2015, após a eleição do Presidente Mauricio Macri, chegou ao fim esta terça-feira com a tomada de posse do novo chefe de Estado, Alberto Fernández. Visto como um moderado de centro-esquerda no poderoso movimento peronista, Fernández tem pela frente um difícil exercício de malabarismo: recuperar a economia com políticas contrárias às indicações do Fundo Monetário Internacional, sem fazer grandes cedências à ala populista do seu partido, onde espreita a nova vice-presidente, Cristina Kirchner.

A vitória de Alberto Fernández nas eleições de Outubro começou a ser dada como certa no fim do Verão, com as sondagens a indicarem que os eleitores não iam dar um segundo mandato a Mauricio Macri.

Entre 2015 e 2018, a governação de Macri não cumpriu a promessa de mudança que levou os argentinos a penalizarem o movimento peronista. E tudo piorou no último ano, quando o país pediu 50 mil milhões de dólares ao Fundo Monetário Internacional e aprovou medidas de austeridade semelhantes às que foram aplicadas nos casos recentes da Grécia e de Portugal, por exemplo.

"Estamos de volta"

Esta terça-feira, Alberto Fernández chegou ao Congresso ao volante do seu automóvel, acenando à multidão que se juntou na histórica Plaza de Mayo, em Buenos Aires.

“Hoje vai haver festa. Estes últimos quatro anos foram terríveis para mim”, disse à agência Reuters Rafael Mantero, de 45 anos, um vendedor ambulante de Rosario.

Ao lado de Mantero, apoiantes do novo Presidente estavam vestidos com t-shirts com a cara de Cristina Kirchner e com a frase “Estamos de volta”.

Kirchner, chefe de Estado entre 2007 e 2015, regressou ao poder na Argentina como vice-presidente de Alberto Fernández, e a sua popularidade junto das camadas mais desfavorecidas pode vir a ser um ponto de tensão na relação entre os dois.

Depois das medidas de austeridade de Macri, que agravaram os indicadores económicos e a taxa de pobreza no país, espera-se que o novo Governo tente reverter a situação com medidas de apoio ao crescimento.

E é em cima desse fio que Alberto Fernández terá de caminhar, estimulando o crescimento económico com mais investimento público sem desiludir as exigências de reposição de salários e prestações sociais. E tudo isto ao mesmo tempo que procede a uma restruturação dos cerca de 100 mil milhões de dólares em dívida soberana, incluindo os 50 mil milhões do empréstimo do FMI.

“Alberto tem de melhorar a situação económica e social”, resumiu Verónica Quintana, de 34 anos, que vendia bandeiras na praça central de Buenos Aires. “Há muitas pessoas com fome e estamos numa situação crítica.”

Vários analistas dizem que se as medidas de Alberto Fernández não derem os resultados pretendidos, é possível que Cristina Kirchner volte a ser vista como a resposta mais indicada para os problemas do país. Kirchner saiu do poder com uma economia em queda e envolvida em suspeitas de corrupção, mas as suas propostas próximas das reivindicações dos argentinos mais afectados pela crise podem vir a ter influência nas relações de poder no país.

Na cerimónia da tomada de posse, esta terça-feira, foi notada a ausência do Presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, crítico da linha seguida por Alberto Fernández. É a primeira vez desde 2002 que um Presidente do Brasil não está presente na investidura de um Presidente argentino.

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