Bruxelas volta a colocar Portugal entre os países em “risco de incumprimento”

Na análise aos planos orçamentais enviados ainda pelo anterior Governo, num cenário de políticas invariáveis, a Comissão Europeia voltou a considerar que, como nos anos anteriores, existe o risco de incumprimento das regras europeias para as finanças públicas. Mas Portugal também se destaca pela positiva.

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Pierre Moscovici, comissário europeu para os Assuntos Económicos e Financeiros LUSA/MARIO CRUZ

Num ano atípico, em que o Governo português apresentou a Bruxelas apenas planos orçamentais provisórios por causa do calendário eleitoral, o país voltou a não escapar aos alertas da Comissão Europeia. Por causa da evolução prevista para o saldo estrutural, Portugal continuou a ser colocado no grupo de países cujo orçamento para 2020 está em “risco de incumprimento” das regras orçamentais europeias. Ainda assim, destaca-se pela positiva por causa do ritmo de redução da dívida.

Este tipo de alerta de Bruxelas tem sido repetido ao longo de vários anos, estando geralmente associado à apresentação por Portugal de metas para o saldo estrutural (o saldo orçamental que exclui o impacto das medidas extraordinárias e o efeito da conjuntura) que não cumprem a regra de aproximação deste indicador em pelo menos 0,5 pontos percentuais do objectivo de médio prazo definido para o país. Quando a meta definida pelo país no orçamento não cumpre por larga margem esta aproximação ao objectivo, a Comissão afirma que os planos orçamentais estão em “risco de incumprimento”.

É isto que volta a acontecer este ano. De acordo com a opinião da Comissão Europeia sobre os planos orçamentais portugueses, o saldo estrutural português irá registar uma melhoria de 0,2 pontos percentuais este ano (o Governo prevê uma melhoria de 0,3 pontos no cenário de políticas inalteradas) para um défice de 0,4%. E para 2020, Bruxelas antecipa que o saldo estrutural se mantenha inalterado (o Governo prevê uma deterioração de 0,1 pontos). Isto significa, segunda a Comissão, que existe o “risco de desvio significativo” face às metas exigidas pelas regras.

De igual modo, a Comissão assinala que também existe um desvio face às regras na evolução do indicador de despesa pública, que regista um crescimento acima daquele que é considerado adequado para as finanças públicas portuguesas.

A acompanhar Portugal no grupo considerado em “risco de incumprimento” estão também a Espanha, França, Itália, Bélgica, Eslovénia, Eslováquia e Finlândia. No total são oito países, um pouco mais de 40% do total dos Estados-membros da zona euro. A estes países o que a Comissão pede é que a versão final do Orçamento que venha a ser aprovada e passada à prática contenha mais medidas de consolidação orçamental que reduzam o risco de incumprimento das regras.

De notar que, no caso português, os riscos detectados por Bruxelas em anos anteriores acabaram em algumas ocasiões por não se concretizar, tendo o país registado melhorias do saldo estrutural em linha com o que é exigido pelas regras. 

É também notório que, este ano, Portugal distingue-se pela positiva de outros países visados pelo mesmo alerta. A Comissão Europeia assinala que, ao contrário do que acontece por exemplo com a França ou a Espanha, os planos orçamentais portugueses cumprem a regra que exige uma trajectória de redução anual do rácio da dívida pública no PIB correspondente a um vinte-avos da diferença relativamente à meta de 60%.

Para além disso, assinala também a Comissão, o saldo estrutural português, para além de estar quase em equilíbrio, até acaba por ficar, nos planos orçamentais provisórios portugueses, mais perto do objectivo de médio prazo, uma vez que o próprio objectivo foi reduzido, de um excedente de 0,25% do PIB para um saldo nulo.

Por fim, a Comissão também leva em conta que em Portugal, tal como em Espanha e na Áustria, os planos orçamentais foram apresentados com base num cenário de políticas inalteradas e que a proposta orçamental completa, com novas medidas, apenas será dada a conhecer no final do ano. Bruxelas apela a que estes países entreguem a versão definitiva o mais rápido possível, desejando que os riscos de incumprimento que detectou desapareçam.

E, especificamente, no que diz respeito a Portugal, a Comissão “convida as autoridade a tomarem os passos necessários dentro do processo orçamental nacional para garantir que o orçamento de 2020 irá cumprir o Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC) e usar quaisquer ganhos para a acelerar a redução do rácio da dívida pública no PIB”.

Na conferência de imprensa de apresentação das avaliações aos planos orçamentais dos 19 países da zona euro, o vice-presidente da Comissão Europeia Valdis Dombrovskis afirmou que em relação aos nove países em risco de incumprimento “devem ser tomadas as medidas necessárias no contexto dos respectivos procedimentos orçamentais nacionais” para cumprir o PEC, mas salientou que em nenhum desses casos se está a dizer que “isso tem de ser feito imediatamente”. “Não estamos a pedir um novo plano como fizemos no ano passado com a Itália”, disse. No caso de Portugal, Dombrovskis afirmou que a Comissão “espera que as autoridades portuguesas apresentem o seu novo orçamento com as medidas que cumpram o PEC, o que exigiria um ajustamento estrutural de 0,4% para chegar ao objectivo de médio prazo”. Um ajustamento de 0,4% do PIB corresponde aproximadamente a 800 milhões de euros.

A acompanhar Dombrovkis pela última vez numa conferência de imprensa deste tipo estava o comissário para os Assuntos Económicos e Financeiros Pierre Moscovici, que não fará parte do elenco da nova Comissão. Em resposta a uma pergunta de despedida sobre se nos últimos cinco anos tinha sido o polícia bom e Dombrovskis o polícia mau nas avaliações a Portugal, Moscovici disse que “apesar de serem muito diferentes, por temperamento e em termos de família política”, os dois trabalharam sempre para chegar a consenso. “Ambos adoramos Portugal e apreciamos os esforços que foram feitos pelo país. Quando há uma história de sucesso não há polícia bom e mau, mas duas pessoas que estão satisfeitas com o resultado”, afirmou.

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