Morales oferece-se para dialogar e a Presidente interina da Bolívia manda-o calar-se

Novo Governo da Bolívia representa uma guinada à direita e uma mudança no centro de poder, para a elite extractivista do país.

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O ex-Presidente Evo Morales, na Cidade do México Edgard Garrido/REUTERS
Jeanine Áñez
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Jeanine Añez, numa cerimónia no palácio presidencial, com militares e símbolos religiosos Carlos Garcia Rawlins/REUTERS

A partir do México, onde está exilado, o ex-Presidente Evo Morales ofereceu-se para regressar à Bolívia para “ajudar a pacificar o país, não para ser candidato” nas novas presidenciais. Manteve, no entanto, ter sido vítima de um golpe de Estado. A conservadora Jeanine Añez, que assumiu a presidência interina do país e se rodeou de figuras da linha dura e referências à igreja católica, respondeu a Morales que não pode participar nas próximas eleições, porque a Constituição não lhe permite candidatar-se a um quarto mandato, relata a Reuters. E mandou-o calar-se.

“A partir do exílio, Evo Morales está a quebrar todos os protocolos, porque não devia estar a fazer declarações públicas. Supõe-se que é um exilado e que não tem o direito de estar a fazer manifestações públicas a incitar a população”, afirmou a Presidente interina, que tomou posse num acto sem quórum (os deputados do partido de Morales, Movimento para o Socialismo, não compareceram).

Jeanine Añez era segunda vice-presidente do Senado e assumiu a presidência interina depois de o Presidente Evo Morales se ter demitido, no domingo - após a exigência do general Williams Kaliman, chefe de Estado Maior das Forças Armadas já substituído, ter exigido que se afastasse do cargo. Añez apresentou já um novo Governo, formado por políticos da direita dura, que tem como homem forte o ministro do Interior, Arturo Murillo, um empresário hoteleiro que há longos anos mantém uma disputa com Morales. Murillo deixou claro ao que vem: “Aviso todos os que estão em sedição de que serão presos. Comecem a correr”, relata o jornal argentino Clarín.

Foram forças ligadas a este empresário, agora ministro, que incendiaram o hotel onde o ex-Presidente se refugiou, quando fugiu da capital, frisa o enviado a La Paz do jornal argentino. A maioria dos restantes ministros são igualmente da elite de Santa Cruz de La Sierra, Cochabamba e Beni, cidades de estados mais ricos, com recursos minerais e hidrocarbonetos, que se destacaram sempre na oposição a Evo Morales, desde que tomou posse pela primeira vez, em 2006, e promoveu a redacção de uma nova Constituição, mais igualitária, mas que deu origem a violentos confrontos.

Morales fugiu do seu país após umas eleições presidenciais nas quais forçou a sua entrada – a Constituição diz que não podia voltar a candidatar-se, e os bolivianos tinham recusado conceder-lhe uma excepção num referendo em 2016 – e sobre as quais pairam fortes suspeitas de manipulação da contagem dos votos a seu favor. O candidato que ficou em segundo lugar, Carlos Mesa (centrista), não concedeu a derrota, e seguiram-se protestos violentos nas ruas – que extravasaram até o campo político de Mesa.

Mas Mesa, embora tenha apoiado Añez, frisou que não faz parte do seu Governo e deseja novas eleições. 

Morales aceitou o convite do México a refugiar-se lá. No entanto, o Presidente eleito da Argentina, Alberto Fernández, também gostaria de dar asilo político a Morales: diz o Clarín que tentou convencer o Presidente cessante, Mauricio Macri, a fazê-lo, sem sucesso. No entanto, Macri não reconheceu a subida ao poder de Jeanine Añez.

Añez autoproclamou-se presidente interina porque se apresentou como a primeira na linha de sucessão, na  qualidade de vice-presidente do Senado e após a renúncia dos restantes titulares. Mas a antiga presidente do Senado, Adriana Salvatierra, do partido de Evo Morales, disse na quarta-feira que não entregou oficialmente a demissão nem esta foi aprovada no Congresso, pelo que não é válida – o que faria dela a primeira na linha de sucessão. “Ainda sou senadora”, disse Salvatierra aos jornalistas.

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