A Casa de Serralves revisita as histórias de Paula Rego

O Grito da Imaginação reúne obras da colecção da fundação portuense, ou ali depositadas, e outras cedidas pela Casa das Histórias, em Cascais. É o convite a nova imersão na obra da autora de Possessão.

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Philippe Vergne junto do políptico Possessão Adriano Miranda
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Políptico Possessão,Políptico Possessão Adriano Miranda,Adriano Miranda
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Políptico Possessão I-VII Adriano Miranda
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The vivian girls on the farm (à esquerda) e Merman Adriano Miranda
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A Cinta Adriano Miranda
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On the balcony Adriano Miranda
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Viajantes Adriano Miranda
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Watcher Adriano Miranda
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Homenagem a Dubuffet Adriano Miranda
Paula Rego
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Paula Rego na inauguração da Casa das Histórias, em Cascais Raquel Esperança

Assim que se entra na primeira sala da nova exposição da Casa de Serralves, Paula Rego. O Grito da Imaginação, a tela Watcher (1994), onde uma mulher com os pés sobre uma bacia, triciclo a seus pés, perscruta o horizonte, como que convida o visitante a olhar para fora, para o jardim e para o parque da fundação. Mas, logo ao lado, o monumental políptico Possessão I-VII (2004) conquista o olhar: entramos, sem recuo, no mundo maravilhoso da obra da mais famosa pintora portuguesa dos nossos dias.

O Grito da Imaginação – título que a curadora Marta Moreira de Almeida escolheu, certamente a olhar para aquele trabalho, para a exposição que esta sexta-feira abre ao público na Casa de Serralves – é mais uma imersão no universo da artista nascida em Lisboa em 1935 e radicada em Londres desde os anos 60. Não traz novidades para quem acompanha o seu percurso, sendo a exposição, de resto, organizada a partir das obras da própria colecção de Serralves ou ali depositadas, e da contribuição da Casa das Histórias Paula Rego, em Cascais, que cedeu dez gravuras da série As Bruxas de Pendle (1996) e o tríptico Quarto de Shakespeare (2006).

Na principal sala do rés-do-chão da casa, Possessão, revelada na grande exposição que o Museu de Arte Contemporânea de Serralves (MACS) dedicou a Paula Rego em 2004, encena, na sua narrativa aparentemente linear – uma mulher com um vestido cor-de-vinho contorcendo-se sobre um divã –, um dos desígnios recorrentes na criação da artista: “Questionar o quotidiano, problematizar o papel da mulher na sociedade contemporânea e revelar universos onde a surpresa e o espanto se ancoram nos mais básicos e fundamentais anseios do ser humano”, escreve Marta Moreira de Almeida no folheto da exposição que a própria apresentou esta quinta-feira aos jornalistas.

Antes da também subdirectora do MACS, o director do museu, o francês Philippe Vergne, fez a sua leitura do lugar de Paula Rego no contexto da arte contemporânea, aproximando-a da estética figurativa de um Francis Bacon e de um Lucien Freud, mas também da do norte-americano Eric Fischl: “Para mim, Paula Rego tem um lugar deveras importante nesse panteão de artistas que apostam na representação”, diz. Mas a artista portuguesa, aponta, manifesta “uma maior liberdade e também muita coragem na abordagem de temas como a sexualidade, a violência, o amor…”. O curador francês realça ainda a influência que Rego teve em toda uma nova geração de artistas que reinvestiu na pintura figurativa com a preocupação de dar expressão, e corpo, a “comunidades que normalmente não se vêem representadas na arte e na pintura”, considerando que essa descendência faz da pintora não “alguém que pertence à história, mas alguém cujo trabalho continua a ter importância e a fazer sentido nos nossos dias". E cita, em declarações ao PÚBLICO, o movimento identitário, em torno das questões de género e de etnia, que tem encontrado eco nos trabalhos de artistas como as norte-americanas Nicole Eisenman e Kara Walker.

Pintar da cabeça para a mão

O Grito da Imaginação, que vai ficar na Casa de Serralves até 8 de Março de 2020, reúne 36 obras de Paula Rego, distribuídas entre a produção dos últimos 25 anos (e também da década de 70), no rés-do-chão, e a dos anos 80, no piso superior.

Contornando a organização cronológica, Marta Moreira de Almeida optou por dar ênfase a diferentes núcleos da criação de “uma artista que dizia que pintava da cabeça para a mão, como se o pastel de óleo lhe escorresse directamente da imaginação”.

É assim que, no piso térreo da casa, além das já citadas Watcher e Possessão, poderão ver-se, logo à entrada, O Vestido Cor de Salmão (2001), mas também A Cinta (1995), e ainda obras adquiridas no pós-25 de Abril pela Secretaria de Estado da Cultura, como Corredor (1975) e A Grande Seca (1976). No rés-do-chão encontram-se igualmente pinturas que representam cenas da vida doméstica datadas dos anos 1990 e águas-fortes vindas de Cascais.

O piso superior é inteiramente dedicado aos anos 1980, altura em que Paula Rego se dedicou à pintura em acrílico e guache, e fez uma aproximação à banda desenhada e à literatura infantil, explorando fábulas de Esopo e de La Fontaine, ou contos de Hans Christian Andersen e de Lewis Carroll.

Ainda neste piso, o visitante pode encontrar a primeira aquisição de uma peça da pintora para a própria colecção de Serralves, em 1989, ano de criação da fundação: The Vivian Girls on the Farm (1984), da série inspirada no livro The Realms of the Unreal, de Henry Darger.

Paralelamente ao decorrer da exposição, além de uma série de visitas guiadas, vai ser exibido, a 15 de Janeiro, o filme realizado pelo filho da artista, Nick Willing, Paula Rego, Histórias & Segredos (2016), e, a 12 de Fevereiro, Catarina Alfaro, coordenadora da programação da Casa das Histórias Paula Rego, conversará com Cécile Debray, directora do museu L'Orangerie, em Paris, onde a artista apresentou uma exposição no ano passado.

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