A noite em que Legendary Tigerman vai a Calcutá

Para a sexta ronda do evento Casório, Paulo Furtado convidou Teresa Castro, também conhecida como Calcutá, para um concerto a quatro mãos na Fábrica Musa, em Lisboa. O enlace ocorre esta sexta-feira, às 23h, com entrada gratuita.

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Tarde soalheira em Lisboa. Paulo Furtado, ou The Legendary Tigerman, o homem que depois de fundar os Tédio Boys e os WrayGunn se lançou como one-man band e acabou por ter uma banda propriamente dita, e Teresa Castro, ou Calcutá, a ex-Mighty Sands que toca bateria em Savage Ohms e mantém uma carreira a solo, ensaiam juntos pela quarta vez para o concerto que vão dar dois dias depois, ou seja esta sexta-feira, na Fábrica Musa, em Lisboa, às 23h. A entrada é gratuita.

Na sala onde ensaiam há um néon a dizer “Oh, Tiger”, vários discos de vinil, uma auto-harpa no chão, inúmeros instrumentos e outras máquinas por todo o lado. Teresa Castro tem uma guitarra nas mãos, vários pedais aos pés e um microfone, enquanto Paulo Furtado segura uma guitarra e dispõe, além do microfone e de um pedal, de controladores ligados a uma caixa de sintetizadores modulares. Tocam Love ride, composição dele, Love path again, dela, e um tema de ambos, criado de propósito para o concerto, que parte do poema A Plausible Finish, de Charles Bukowski, meio recitado e meio cantado por ele, com uns “oh” e “ah” dela na parte instrumental. 

O pretexto que os junta é o Casório, parceria entre duas marcas de bebidas (o whisky Jameson e a cerveja artesanal Musa) que, sob curadoria de Quim Albergaria, baterista e vocalista de PAUS, emparelha músicos portugueses. A ideia dos enlaces, diz o próprio ao PÚBLICO, é fazer as pessoas pensarem “claro que sim, é óbvio que estes artistas deveriam estar juntos em palco, por que é nunca tínhamos pensado nisto?” Depois do primeiro, que juntou o curador a Moullinex, este já é o sexto casório: Chullage, sob o nome Prétu, aliou-se a Norberto Lobo, Carlão a Tó Trips, Xinobi a Marta Ren e DJ Glue a Selma Uamusse. Haverá ainda mais dois casamentos, cujo alinhamento ainda está por anunciar; e, para rematar, um evento final. “Estamos a preparar a melhor maneira de fechar este ciclo”, conta Albergaria.

O máximo e o mínimo

Neste caso, foi Paulo Furtado quem chamou Teresa Castro, com quem já tinha dado uma série de concertos em Abril, no âmbito do festival Soam as Guitarras, que ocorre entre Oeiras, Évora e Póvoa de Varzim. “Já queria trabalhar com a Teresa há algum tempo e estava à procura de um pretexto que fosse a ignição da coisa”, conta o músico. “Conseguimos construir algo que não fosse exactamente nem uma coisa nem outra. Apesar de tocarmos canções um do outro, o que pomos musicalmente nos nossos temas e nas coisas novas que construímos é mais do que a soma das partes, acho eu”, continua. No concerto, cada um contribui com quatro canções, complementadas pela presença do outro, a que se juntam ainda uma versão (seja ela Some velvet morning, de Lee Hazlewood ou Femme fatale, dos Velvet Underground com Nico) e o já mencionado original composto para a ocasião. 

O universo dos dois, muito alimentado pela América e por “referências cinematográficas e de literatura”, como resume Teresa, é parecido, mas não é o mesmo. “Tem de haver uma movimentação quer da Teresa, quer minha, para que a minha guitarra, que normalmente é muito mais ruidosa, se torne um bocadinho mais harmónica. Encontrámos aquela forma de entrar no universo um do outro e acrescentar coisas, não só preencher”, diz Paulo. “O que eu faço é sempre mais calmo e ambiental, trouxe uma coisa nova para a música do Paulo, uma tranquilidade, tipo...”, continua Teresa, sem conseguir rematar. “Tipo ‘Acalma-te!'”, completa ele. “Há uma doçura, uma coisa mais feminina”, riposta de novo Teresa. Durante o ensaio, enquanto ela canta, há um sorriso na guitarra que ele adiciona a Love path again. “Essa parte por acaso está muito fixe, estou contente”, admite ela depois.

Este é o quarto ensaio dos dois. O primeiro, afirma Teresa, em que tudo já “soa bem”, em que ambos percebem “exactamente” onde se estão “a encontrar”. O maior problema foram os sintetizadores modulares, área em que Paulo Furtado está a investir cada vez mais. “Comecei por usar nas bandas sonoras e agora estou a escrever o próximo disco e a usá-los”, explica. Num dos ensaios, “perdeu-se muito tempo” com eles, algo que acontece muito: “Isto não guarda predefinições, tem de se andar à procura do som outra vez”, atira Teresa. “Não tinha a certeza se ia encaixar, não tínhamos falado muito nisso, tinha ficado no ar. Fui tentando encontrar o conjunto que fizesse sentido para o que estávamos a criar juntos. Algumas das primeiras ideias não faziam sentido”, desenvolve Paulo. “Experimentámos fazer uma batida para uma música, mas depois achámos que estava a agarrá-la demasiado ao chão”, exemplifica Teresa. 

Cada um escolheu canções a pensar no outro. “Pensei quais eram as minhas músicas que não eram assim tão lentas e calmas, não queremos adormecer o pessoal”, diz ela. “Eu escolhi as minhas mais lentas e calmas”, responde Paulo. “Eu escolho o meu máximo e tu escolhes o teu mínimo”, conclui a guitarrista. “Também foi o universo em que eu achei que o ia encontrar mais facilmente”, continua. O resultado, entre o máximo e o mínimo de cada um, ganha vida esta noite.

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