Brincar, correr e saltar em cima de dois milhões de toneladas de lixo

Era um aterro sanitário. Agora é um Trilho Ecológico e um Parque Aventura. É um alerta e um pequeno grande milagre em Baguim do Monte, Gondomar. São quatro quilómetros cheio de equipamentos e actividades.

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Nelson Garrido
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Lipor, Parque Aventura
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Há muitos lugares no país onde é possível brincar num parque infantil. E há, também, várias localizações com parques radicais onde é possível deslizar num mini-slide, fazer um percurso de arborismo, deslizar em escorregas com mais ou menos curvas e desníveis. E o que também não falta pelo país são locais para fazer percursos de manutenção, onde há equipamentos para treinos funcionais e de força, ou, numa vertente menos desportiva e mais lúdica, para campeonatos de minigolfe ou de jogos tradicionais.

O que não existe em mais lado nenhum, acreditamos, é a possibilidade de fazer tudo isto no mesmo local onde durante mais de 30 anos funcionou um aterro sanitário, onde foram depositados cerca de dois milhões de toneladas de resíduos. O que a Lipor, a empresa intermunicipal que faz a recolha e gestão dos resíduos sólidos e urbanos da Área Metropolitana do Porto, fez em Baguim do Monte, Gondomar, foi um pequeno grande milagre: abriu ao público um Trilho Ecológico e um Parque Aventura que são a receita certa para a diversão sem descurar nada do seu principal foco, a sensibilização ambiental.

O Trilho Ecológico é destinado a utentes de todas as idades e é gratuito: basta entregar como multa, à entrada, resíduos para reciclar. No ano passado foi visitado por 35 mil pessoas, que entregaram sete toneladas. Este número só pode aumentar. Mas como tem uma pequeníssima parte do trilho dentro da área industrial da Lipor, onde há veículos pesados a circular, os menores de 16 anos devem estar sempre acompanhados por um adulto. É uma parte mesmo pequenina, mas é a mais conveniente para aceder ao trilho, e é também necessária para quem quiser completar o percurso completo, que é de quatro quilómetros.

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Mas não é propriamente obrigatória, já que o trilho é acessível também pelo apeadeiro de Águas Santas-Palmilheira, na linha do Douro, entre as Estações de Ermesinde e de Rio Tinto. Passear junto às margens do Rio Tinto, que já foi um percurso fluvial tão poluído que se defendia o seu entubamento, é outro dos atractivos deste parque. O Rio Tinto foi recuperado e está a ser monitorizado – e o artista plástico Bordallo II assina o “primeiro peixe que [já] chegou ao Rio Tinto”, feito, como é apanágio do artista, a partir de resíduos e material abandonado, e que está colocado numa das paredes do moinho recuperado que agora serve de centro de interpretação ambiental.

A sensibilização ambiental, o respeito pela biodiversidade e pela preservação de recursos é a principal mensagem que pode, e deve, ser extraída da visita a este espaço. E, nesse aspecto, até um miúdo de quatro anos a pode captar. O Tiago já tem quase cinco anos e está habituado a separar o lixo em casa. Foi já quase no final do trilho, ao aperceber-se da entrada e saída de camiões, e depois de espreitar para o interior das portas abertas da nave industrial onde se faz a selecção de resíduos, que ele se mostrou verdadeiramente impressionado: “Xiii, mãe. Há tanto lixo no mundo!” Pois há, pois há? E ele ainda não viu nada. Este foi recolhido e há-de ser reutilizado, com todo o esforço que isso implica. Melhor mesmo é não o fazer, e nunca, nunca, nunca, deitar lixo para o chão. Essa parte já está assimilada.

Agora vale a pena, então, trepar o monte de 154 metros, que resultou da deposição de resíduos entre 1970 e o ano de 2000. O aterro foi selado nessa altura, e demorou uma década a ser alvo de uma recuperação ambiental que agora oferece todas as garantias de segurança, com uma sistema de monitorização contínua, assente em vários sistemas de captação e drenagem: de lixiviados, de gases (os 106 poços de biogás estão agora na fase final de actividade), de chuvas. Com todos estes sistemas, veio também a recuperação paisagística, com a reflorestação do espaço, a instalação de vários equipamentos, e a promessa de que a subida a cada um dos quatro patamares nos trará novos temas, e novas surpresas.

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Fazendo o acesso ao trilho pela portaria principal da Lipor, é possível passar, primeiro, pela pequena quinta pedagógica, onde mora o burro mirandês Ernesto, um gato e umas quantas e simpáticas galinhas. Depois de passar as hortas comunitárias (onde 40 funcionários da Lipor estão a dar uso ao terreno para fazer as suas hortas), chegamos, então, à entrada principal do trilho, onde entre hotéis para insectos, caixas sensoriais, espaços de piquenique e uma barraca de gelados encontramos a recepção onde podemos deixar os resíduos e requisitar, também de forma gratuita, todos os equipamentos que, achamos nós, poderão ser úteis nos patamares superiores. Por exemplo, cordas para saltar, jogo da malha, tacos e bolas para o minigolf, livros. Depois, então, é começar a subir.

Logo no primeiro patamar vamos encontrar uma área de parque infantil, adequada para os visitantes mais novos – como o Tiago. Já é mais difícil catalogar a idade recomendada para o circuito de minigolfe, logo ao lado. Acreditamos que desde que consiga pegar num taco, e acertar na bola, o jogo serve a todos. Crianças cansadas, subimos então ao segundo patamar, e encontramos jogos tradicionais (jogo do galo, da lata, da malha, andas) e equipamentos para treinos funcionais e de força – o desafio é provar aos mais novos que aquelas máquinas não são as mais adequadas à idade, porque, como é óbvio, eles também vão querer experimentar o Step, o TRX, a mesa para abdominais. Seguimos para o patamar seguinte e podemos ver a plantação das aromáticas e, por fim, no quarto patamar, está o parque radical, com circuito de arborismo, mini-slide e escorregas. Por ser o mais alto de todos, tem instalado um oportuno miradouro, que permite apreciar uma paisagem de longo alcance a 360 graus.

Começa, então, a descida, para contemplar a área de pastoreio e entrar, depois, no trilho junto à margem esquerda do Rio Tinto. Ao longo de 800 metros, o desenvolvimento deste trilho fez-se através da perseguição de muitos objectivos, desde hidráulicos e ecológicos, até aos paisagísticos e culturais. Mas no final, o mais importante é perceber que é possível reabilitar um rio a quem antes todos viravam costas. E que é pelo respeito pela natureza e através do desenvolvimento sustentável que é possível respeitar e proteger a biodiversidade. O esquilo vermelho já vive no parque. Não tarda, encontramos lontras de rio. Já estivemos muito mais longe.

Algumas recomendações de carácter prático: é proibido fumar, foguear e levar bebidas alcoólicas para o interior do trilho. Levar um telemóvel (uma parte do percurso tem cobertura gratuita de rede wifi), com leitor de QRCode é recomendável porque permite ler os painéis informativos que explicam os vários pontos de interesse do parque.

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