França e Estados Unidos chegam a acordo sobre imposto das tecnológicas

Negociadores dos dois países chegaram a acordo em Biarritz para diluir efeitos do novo imposto francês, que vai afectar a Apple, o Google ou o Facebook.

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Perante o impasse na Europa, Macron decidiu avançar sozinho com a novo imposto “GAFA” Reuters/CHRISTIAN HARTMANN

Negociadores da França e dos Estados Unidos chegaram a um compromisso para diluir os efeitos do imposto, contestado pela Casa Branca, que Paris quer aplicar às gigantes tecnológicas como o Google, a Apple ou o Facebook. O entendimento foi confirmado pelo Presidente francês, Emmanuel Macron, no final da cimeira do G7 em Biarritz, onde apareceu ao lado de Donald Trump nesta segunda-feira.

Com uma União Europeia dividida em relação à criação de um imposto sobre as grandes plataformas tecnológicas para tributar receitas das actividades digitais que hoje escapam à tributação na Europa (como a venda de dados e conteúdos gerados pelos utilizadores), a França decidiu avançar de forma unilateral com um imposto especial. A medida visa directamente as grandes empresas norte-americanas, e não é por acaso que o imposto que se começou a discutir na Europa é conhecido por “GAFA”, de Google, Apple, Facebook, Amazon.

Assim que Paris o anunciou, Trump ameaçou retaliar de forma a afectar economicamente um dos mais afamados produtos franceses, prometendo agravar o imposto sobre as importações de vinhos. Com o GAFA, a França impõe às empresas tecnológicas globais com receitas anuais acima dos 750 milhões de euros uma taxa de 3% sobre os rendimentos gerados com os utilizadores franceses.

Para tentar evitar um novo confronto num momento já de si marcado pela escalada na guerra comercial entre os Estados Unidos e a China, o acordo preliminar que Paris procurou negociar com a Casa Branca prevê, segundo a Reuters, que a França reembolse as empresas tecnológicas pela diferença entre a taxa francesa e um valor de referência de tributação do digital que vier a ser determinado no âmbito da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE). O que foi conseguido, disse Macron, foi um acordo que é “bom para as duas partes”.

De acordo com a Reuters, o acordo foi conseguido entre a equipa negocial francesa, chefiada pelo ministro das Finanças, Bruno Le Maire, e a equipa do secretário do Tesouro norte-americano, Steven Mnuchin, e o conselheiro económico da Casa Branca Larry Kudlow. Durante o fim-de-semana houve negociações entre as duas partes que incluíram um jantar na noite de domingo num restaurante em Biarritz.

Não é ainda claro se o entendimento chega para que a Administração norte-americana recue e desista de um agravamento das taxas alfandegárias sobre a entrada de vinho francês, assunto sensível que durante o G7 levou o próprio presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, a fazer um aviso sério a Trump: “Se os Estados Unidos impuserem tarifas à França, a UE responderá na mesma moeda, a França poderá contar com a solidariedade da UE.”

O ministro francês já tinha admitido que a França retirará este imposto nacional a partir do momento em que houver um “compromisso ao nível da OCDE” para abarcar as receitas do digital. Mas esse é ainda um cenário em aberto. Ficou estabelecido procurar um acordo para 2020.

Um avanço unilateral

Na Europa, onde as medidas de impacto fiscal têm de ser aprovadas por unanimidade entre os Estados-membros, os governos não conseguiram chegar a um entendimento para aplicar o GAFA. A Comissão Europeia fez uma proposta para criar um imposto provisório de forma a garantir receitas imediatas aos países europeus, mas a opção enfrentou resistências em países como a Irlanda, a Suécia e a Alemanha.

A iniciativa que ficou pelo caminho propunha um imposto comum justamente para evitar uma “manta de retalhos” em que alguns países avançavam como uma medida destas e outros não, criando respostas diferentes a nível europeu, mas foi isso que acabou por acontecer. Com a Europa dividida nesta frente, a França tomou uma posição unilateral e fê-lo num contexto em que já estava em marcha a guerra comercial entre os Estados Unidos e a China.

A ideia lançada pela Comissão de criar um imposto especial passava por aplicar a taxa de 3% às “receitas resultantes das actividades em que os utilizadores desempenham um papel importante na criação de valor, que são as mais difíceis de captar com a regulamentação fiscal em vigor”, como as vendas de publicidade online, as vendas de bens e serviços em plataformas de redes sociais ou as vendas de dados que são geradas a partir das informações dos utilizadores.

O imposto especial seria uma espécie de antecâmara para se discutir uma reforma de longo prazo em torno das regras fiscais do digital, com um objectivo: conseguir que cada país tribute os lucros gerados no seu território pelas grandes plataformas como o Google ou o Facebook mesmo que as empresas não estejam aí presentes fisicamente mas tenham uma presença significativa (seja porque obtêm nesse país mais de sete milhões de euros de receitas, seja porque têm mais de 100 mil utilizadores ao longo de um ano ou porque conseguem nesse território mais de 3000 contratos comerciais de serviços digitais).

O Google e a Apple têm sido visados pela Comissão Europeia nos últimos anos em várias investigações, seja para averiguar práticas concorrenciais, seja para verificar como o planeamento fiscal tem deixado outras empresas presentes no mercado comum em desvantagem.

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