O “muro da vergonha” que a Guiné Equatorial estará a construir na fronteira com os Camarões

Governo de Malabo nega estar a criar o muro que indignou autoridades camaronesas, mas admite movimentações para proteger a cidade de Ebebiyín e acabar com o tráfico transfronteiriço. E lembra que os Camarões ocupam território equato-guineense desde 1974.

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Estrada de Ebebiyín DR

A Guiné Equatorial anda a construir um muro na fronteira com os Camarões e terá movido as delimitações geográficas um pouco mais para Norte, causando a indignação do país vizinho. Malabo garante, no entanto, que não tem qualquer intenção de construir um muro ao longo dos 189 km da linha divisória entre os dois países, apenas pretende cercar a cidade de Ebebiyín , de modo a evitar o contrabando na tripla fronteira.

Vista desde um mapa de satélite, a cidade equato-guineense de Ebebiyín estende-se para os dois lados da fronteira com o Gabão e fica a alguns quilómetros da linha divisória com os Camarões. Mas o mapa foi traçado pelos europeus em Berlim no século XIX e a cidade, situada numa zona de selva transfronteiriça, expandiu-se segundo a vida da região, para lá dessa linha de régua e esquadro, sendo já hoje a terceira maior da Guiné Equatorial.

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Na sexta-feira, o ministro dos Negócios Estrangeiros equato-guineense, Siméon Oyono Esono, foi recebido em Yaoundé pelo primeiro-ministro camaronês, Joseph Dion Ngute, para transmitir o desmentido formal do presidente Teodoro Obiang ao seu homólogo Paul Biya, assegurando que não está a construir nenhum “muro da vergonha”, como escreveu a imprensa.

“Acho que as pessoas que falam em muro o fazem por falta de informação. Se há um problema entre os nossos dois países, vamos resolvê-lo através de meios pacíficos, diplomáticos”, disse o ministro à saída da audiência com Dion Ngute.

O laotravoz.info, site noticioso equato-guineense que normalmente serve de eco às posições do Governo de Obiang, traz, no mesmo tom, um longo desmentido em espanhol e francês à notícia, avançada pela Deutsche Welle: “Falar de um muro ao longo da fronteira entre a Guiné Equatorial e os Camarões é uma falta de informação e, em alguns casos, de objectividade. A Guiné Equatorial somente decidiu sobre o seu território e muito longe da fronteira entre os dois países fechar os caminhos e todas as vias de trânsito ilegal.”

Tráfico de droga, imigração clandestina, delinquência transfronteiriça e evasão fiscal são crimes que Malabo quer combater com o estabelecimento de uma “vedação de protecção na cidade de Ebebiyín” e não com um muro ao longo da fronteira comum com os Camarões, de Ebebiyín até ao rio Campo ou Ntem, junto à costa. A jornalista da DW Elisabeth Ansen garantia, no entanto, no seu artigo que a construção era visível desde o lado camaronês.

Malabo desmente igualmente que tenha feito uma incursão em território camaronês para instalar novos marcos de demarcação territorial junto à povoação de Akonangui. E que mereceram, no final de Julho, uma visita à região do chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas camaronês, general René-Claude Meka, para observar in loco “as veleidades expansionistas do vizinho equato-guineense”.

Um oficial do exército dos Camarões, que pediu para não ser identificado, explicava à AFP que tinham “constatado que militares equato-guineenses atravessaram o rio e colocaram marcos do lado camaronês”, na zona de Kyé-Ossi. A Guiné-Equatorial, embora sublinhando que a questão se arrasta há 45 anos sem resolução, assegura que pretende resolver os problemas fronteiriços por via diplomática.

Como lembra o artigo de laotravoz.info, “havia que perguntar aos que defendem essa tese”, da invasão equato-guineense, “se conhecem o conflito que houve nesta zona fronteiriça em 1974, quando as forças camaronesas ocuparam, com incursão militar, a zona de Kyé-Ossi, invadindo as fronteiras tradicionais regulamentarmente estabelecidas”?

Salom Abeso, líder do Cidadãos para a Inovação, principal partido da oposição equato-guineense, ilegalizado em Fevereiro deste ano, escreveu na caixa de comentários ao artigo do laotravoz.info que Teodoro Obiang “veio provar mais uma vez à comunidade internacional que não respeita nem os tratados, nem as leis, nem os decretos”.

Para o político, que vive exilado em Londres há 18 anos e foi em Junho condenado à revelia a 60 anos de prisão por tentativa de golpe de Estado, “o presidente Obiang acha que é o imperador da China”, querendo edificar um “muro da vergonha que é a assinatura de um regime sem capacidade em matéria de ideias e de desenvolvimento económico-social”.

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