Governo de Hong Kong diz que protestos “põem em causa a soberania” do território

Chefe do executivo local, Carrie Lam, diz que as manifestações contra o seu governo “comprometem a fórmula de ‘um país dois sistemas’”, indicando assim que Pequim pode estar prestes a intervir de forma directa.

Os manifestantes cercaram esquadras da polícia
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Os manifestantes cercaram esquadras da polícia LUSA/CHAN LONG HEI
Protesto num centro comercial de Hong Kong
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Protesto num centro comercial de Hong Kong Reuters/KIM KYUNG-HOON
Houve momentos de tensão entre manifestantes e utentes dos transportes públicos
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Houve momentos de tensão entre manifestantes e utentes dos transportes públicos LUSA/MIGUEL CANDELA
A chefe do Executivo, Carrie Lam, falou pela primeira vez em público desde 22 de Julho
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A chefe do Executivo, Carrie Lam, falou pela primeira vez em público desde 22 de Julho LUSA/JEROME FAVRE

O território de Hong Kong voltou a mergulhar no caos esta segunda-feira, com uma greve geral a seguir-se a mais uma onda de protestos violentos no fim-de-semana. O cancelamento de mais de 200 voos levou a uma paralisação sem precedentes na megacidade.

A chefe do executivo de Hong Kong, Carrie Lam (apoiada por Pequim), falou aos jornalistas pela primeira vez em duas semanas, para advertir que os protestos são um desafio à soberania chinesa e deixam o território à beira de uma “situação extremamente perigosa”.

Lam manteve o tom de desafio ao rejeitar os pedidos dos manifestantes para que renuncie ao cargo e disse que o governo vai manter a lei e a ordem “com determinação”.

A chefe do executivo alertou para o facto de que os protestos estão a levar o centro financeiro asiático “para um caminho sem retorno” e que prejudicam a economia da cidade. “As acções [dos manifestantes] excederam em muito as suas reivindicações políticas originais”, disse Lam, ladeada por altos responsáveis do seu governo.

“Estes actos ilegais que desafiam a soberania do nosso país, e que comprometem a fórmula de ‘um país dois sistemas’, destruirão a estabilidade e a prosperidade de Hong Kong”, disse Carrie Lam, referindo-se ao sistema administrativo do território desde 1997, quando a antiga colónia britânica foi transferida para a China.

“Perda de tempo”

Alguns manifestantes acusaram Lam de vir novamente alimentar a crise ignorando o sentimento público, e prometeram continuar com o movimento. “É uma perda de tempo ouvi-la”, disse à agência Reuters o estudante universitário Jay Leung, de 20 anos. “Acho que o governo não está a fazer nada para curar as feridas da sociedade “, acrescentou. “Eles não apresentam uma solução para resolver o problema político que eles próprios criaram.”

Os protestos no território começaram por causa de uma proposta de lei sobre extradição. Se a lei for aprovada, os habitantes da cidade podem ser transferidos e julgados em vários países, incluindo na China continental – onde o sistema judicial não é independente do poder político, ao contrário do que acontece em Hong Kong.

Mas aqueles protestos iniciais transformaram-se numa exigência mais profunda e passam agora pela demissão de Carrie Lam e por outras garantias: o fim definitivo da proposta de lei, e não apenas a sua suspensão; a libertação imediata de todos os detidos nas manifestações; e a adopção do sufrágio universal e directo para a escolha do próximo chefe do executivo, entre outras.

Esta segunda-feira, os passageiros esforçaram-se para chegar ao trabalho na hora de ponta, com muitos serviços de metropolitano e autocarros suspensos. Alguns activistas bloquearam a partida dos comboios. Longas filas de trânsito podiam ser vistas em toda a cidade de Hong Kong em direcção ao coração do centro de negócios e centenas de pessoas ficaram retidas no aeroporto.

“(O governo) está a transformar a polícia no bode expiatório e a criar uma situação que se torna insuportável para todos os que vivem aqui. Essa é uma das razões pelas quais aderimos à greve”, disse Mark Schmidt, de 49 anos. “Perder um pouco de dinheiro agora não é um grande problema, comparando com a liberdade que Hong Kong costumava representar”, acrescentou.

Centenas de detenções

A polícia deteve 44 pessoas depois de violentos confrontos durante a noite, disparando gás lacrimogéneo para dispersar os manifestantes que se deslocaram rapidamente pela cidade em acções do estilo flash mob (manifestações rápidas com a aparência de serem espontâneas). Desde o início dos protestos, no dia 9 de Junho, a polícia deteve 420 pessoas.

Os manifestantes cercaram as esquadras da polícia em toda a cidade durante o fim-de-semana, pintando paredes e partindo janelas. Alguns atearam fogo a um carro do lixo e tábuas de madeira, que empurraram na direcção de um cordão policial.

Num comunicado, a polícia disse que a violência está a aumentar rapidamente e que a situação está fora de controlo.

Os protestos levaram ao encerramento de lojas e agências do governo e ao bloqueio de estradas, representando o maior desafio político em Hong Kong desde a transição para a China, em 1997. Milhões de pessoas foram para as ruas manifestando raiva e frustração contra o governo da cidade, no maior desafio popular ao líder chinês, Xi Jinping, desde a sua chegada ao poder, em 2012.

Os números do turismo de Hong Kong já estão em queda e as taxas de ocupação dos hotéis estão a baixar, acrescentando pressão a uma economia já em dificuldades. “Eu sei o que está em causa e apoio a resistência. Mas essa não é a melhor forma de conquistar aliados e influenciar pessoas”, disse Edward Tunis, um canadiano reformado de 66 anos.

A actividade de negócios do sector privado caiu para o seu nível mais baixo numa década, prejudicada pelos protestos e pela guerra comercial sino-americana.

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