Lei de Bases da Saúde: chutar as PPP para a frente

O “povo de esquerda”, essa entidade mais ou menos abstracta, não gostaria que se tivesse perdido a oportunidade de aproveitar uma nova Lei de Bases da Saúde. Mesmo que as PPP não acabem e seja relegitimadas ao virar da esquina.

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Vai ser possível, na 25ª hora, aprovar uma nova lei de bases da Saúde. Sintomaticamente, o anúncio foi feito pelo Partido Comunista – o partido que tem mantido melhores relações com o Governo ao longo da legislatura.

Este foi um processo particularmente penoso, com o PS e o Bloco de Esquerda a incompatibilizarem-se, depois do BE anunciar um acordo com o Governo para a eliminação das PPP que afinal não tinha substância – PS e Governo acabariam por mudar de ideias e justificar que o documento do alegado acordo era apenas “uma proposta de trabalho”. O PCP manteve sempre as pontes e aparece como artífice do acordo, embora a ideia base também já tinha sido proposta pelo Bloco há um mês.

O texto substituirá aquele que hoje está em vigor e foi aprovado pela maioria absoluta de Cavaco Silva. Não aproveitar a geringonça para arranjar um novo modelo teria sido um erro que esteve quase para acontecer. O Governo chegou a apelar ao PSD para aprovar a lei, o que revela como todo o processo foi sujeito a intensos ziguezagues e conflitos dentro da maioria de esquerda.

Mas António Costa também não queria comprar uma guerra com o Presidente da República e disse-o várias vezes. Aliás, Costa não queria que uma nova lei de bases servisse para “conflito institucional entre Parlamento, Presidente da República, a actual maioria, futuras maiorias”. Ontem, Carlos César, o presidente do PS, já dizia que achava que havia todas as condições para que o Presidente da República aprovasse o texto.

E como não? A solução chuta o assunto fracturante das Parcerias Público Privadas lá mais para a frente. Não as elimina, adia. Há agora um prazo de seis meses para substituir o decreto de Durão Barroso por outra coisa qualquer e dificilmente essa outra coisa passará pela proibição das PPP na Saúde, que o PS rejeita. Na próxima legislatura, “alguém” – eventualmente o PSD ou o CDS, se o PS não tiver maioria absoluta – viabilizará a continuação do modelo das Parcerias Público-Privadas.

A solução encontrada é, para a maioria de esquerda, uma vitória sobre as respectivas incompatibilidades históricas. O “povo de esquerda”, essa entidade mais ou menos abstracta, não gostaria que se tivesse perdido a oportunidade. Mesmo que as PPP não acabem e seja relegitimadas ao virar da esquina.

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