“Não me ponhas no armário”. Porto rende-se ao Orgulho LGBT+ em marcha com milhares

Sob o lema “o Porto não se rende e o Orgulho não se vende”, a marcha deste ano fazia a ponte com as outras lutas activistas da cidade, como pelo direito à habitação.

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Estela Silva/Lusa
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Mais de sete mil pessoas marcharam neste sábado na 14ª Marcha do Orgulho LGBT+ do Porto (MOP). A mancha do arco-íris partiu da Praça da República, correu Santa Catarina, atravessou os Aliados e terminou na Cordoaria, onde o “arraial mais orgulhoso do Porto” acolheu os manifestantes em festa.

Sob o lema “o Porto não se rende e o Orgulho não se vende”, a marcha deste ano fazia a ponte com as outras lutas activistas da cidade, como a do direito à habitação. Um dos rostos pintados de purpurina na multidão era o de Ana (que preferiu não revelar o sobrenome), que vem à MOP desde que chegou de Portalegre há quase dez anos. Foi despejada há cerca de meio ano, arranjou casa fora do centro da cidade. “O Porto não se deveria ter vendido”, lamenta. Em uma década, nota que o número de pessoas na marcha cresceu bastante. Espera que também continue a ter uma postura crítica. “Porque senão estagna tudo, e isso se não perdermos o que já conquistamos.”

“Não sejas otário, não me ponhas no armário”, gritava um grupo de adolescentes pintados de várias cores à chegada da marcha à Cordoaria. “Aula não isola LGBT+ na escola”, “Stonewall foi trans”, “Sem habitação não há libertação”, lê-se nos cartazes por cima das cabeças onde aqui e ali despontam bandeiras ou até cabeças de unicórnio.

Para Raquel Batista, de 21 anos, é segunda vez na MOP. Veio com os amigos, a namorada e o seu cartaz: “Contra o Vaticano, prazer clitoriano”. O que faz marchar quem cresceu a ver direitos conquistados? As lutas do passado e o que faltam conquistar pelas gerações futuras, mas também as pessoas que lutam pelos direitos de pessoas LGBTI “do outro lado do mundo”. “Estamos num local seguro, e devíamos todos vir à rua e falar mais alto.” Sobre as reivindicações da marcha deste ano, confessa que gostaria que a fosse um movimento mais independente de “qualquer tipo de partido político”, apesar das alianças naturais num país pequeno como Portugal.

“A cidade está catita mas não para a nossa guita”, anunciava a faixa carregada por um dos grupos enquanto os mais jovens continuavam as cantorias de reivindicação: “Eu beijo homem, beijo mulher, tenho o direito de beijar quem eu quiser”.

João Carlos Louçã, membro do colectivo Panteras Rosa e fundador das marchas tanto de Lisboa, em 2000, como do Porto, em 2006, provavelmente terá sorrido ao vê-los correr subitamente para perto do palco, aos primeiros versos de uma música popular das brasileiras Anitta e Pabllo Vittar. Encontramo-lo um pouco mais tarde, quando seguiam já os discursos das associações que organizaram e das que se juntaram à marcha.

Em palco, dois nomes foram ouvidos repetidas vezes ao longo das intervenções dos colectivos: Gisberta, a mulher trans cujo violento assassinato causou uma onda de indignação que deu origem à marcha do Orgulho LGBT no Porto, e António Alves Vieira, actor e outro dos fundadores da MOP, que morreu no ano passado. As Panteras Rosa, grupo de acção directa no qual militava, estiveram presentes em peso.

João Carlos não vinha à Marcha do Porto há três anos, mas nota a mesma tendência que observa em Lisboa: estão mais massificadas e com bastante mais pessoas muito jovens. Confessa ainda não compreender bem se estes grupos mais novos vêm mais pela festa ou pela política. “A festa é importante, mas o que faz as pessoas virem à marcha pela primeira vez é a afirmação, a visibilidade.” Apesar da validação encontrada cada vez mais nos espaços online onde se criam comunidades e redes de apoio, nota que sair à rua ainda tem um peso diferente.

“A ocupação de uma praça com as bandeiras, com o que se tem vestido, com a forma como se pintaram com os namorados e as namorada... É no espaço social que a homofobia continua a ser uma questão”.

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