Os crocodilos também tiveram uma fase vegetariana

Uma equipa de investigadores da Universidade de Utah, nos EUA, analisou a dentição de crocodilos da era mesozóica e descobriu que a mudança de dentes pode ter influenciado a sua dieta. Em várias fases, várias espécies da família dos crocodilos chegaram a ser completamente herbívoras.

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Quando se pensa numa qualquer espécie de crocodilo (Crocodylida), seja o mais antigo e extinto ou um dos que ainda habita a Terra, imagina-se um réptil de grandes dimensões, um dos maiores predadores do mundo, nadadores por natureza, com uma mandíbula recheada de dentes perigosos — podem chegar aos 80 — e com uma dieta maioritariamente carnívora. Mas, ao que parece, nem sempre foi assim.

Os crocodilos antigos tiveram não uma mas, pelo menos, três fases vegetarianas. Foi através da análise da dentição de algumas espécies que um grupo de investigadores da Universidade de Utah, nos Estados Unidos da América, descobriu que os crocodilos chegaram a ter uma dentição composta por pequenos e intricados dentes — ao contrário do que acontece hoje — facto que acabou por influenciar a sua dieta. Esta e outras descobertas foram publicadas no fim do mês de Junho na revista científica Current Biology.

Algumas das espécies já extintas que foram contemporâneos dos dinossauros, isto na era mesozóica, “exibiam uma gama impressionante de morfologias esqueléticas que sugerem uma diversidade de papéis ecológicos” não encontrados em exemplares actuais, em particular o desenvolvimento dentário e pouco usual que se foi repetindo ao longo da sua história evolutiva. De acordo com o estudo agora publicado, há 250 milhões de anos, as dezenas de espécies da família dos crocodilos que podiam ser encontradas em todo o mundo, algumas em terra e outras nos mares e rios, comiam apenas plantas, apenas animais, ou ambos.

Apesar das descrições recentes sobre os dentes pouco usuais desta espécie que servem de base para se presumir que os crocodilos experimentaram vários tipos de alimentação, os investigadores tiveram dificuldades em provar esta hipótese com 100% de certeza. As amostras que existem são insuficientes para efectuar uma comparação com a dentição de mamíferos ou répteis vivos, impedindo assim a elaboração de uma reconstrução precisa da sua alimentação.

Para o estudo, os autores analisaram 146 dentes de 16 espécies de crocodilos já extintas através de um método que permite a digitalização de um objecto e a indicação da complexidade do mesmo, o que possibilitou a comparação de dentes que não tinham pontos de referência em comum com dentes de exemplares que existem hoje.

Através da análise da dentição do animal, a equipa descobriu que os crocodilos do mesozóico exploraram um gama muito mais alargada de tipos de alimentação do que se pensava até agora, incluindo a dieta omnívora e herbívora. Os resultados mostram também que os crocodilos desenvolveram de forma independente uma dentição de alta complexidade, isto pelo menos em três ocasiões. Algumas das informações recolhidas sugerem ainda que estas dentições superam a complexidade da dentição de alguns répteis herbívoros da actualidade e rivalizam com as de outros mamíferos omnívoros e herbívoros.

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Um modelo em 3D da dentição Natural History Museum of Utah

Tamanho e força da dentição

As características de um dente podem revelar muito sobre o seu dono. Os carnívoros tendem a ter dentes afiados e lisos, usados ​​para morder e rasgar. Os herbívoros desfazem a comida nas suas bocas antes de engolirem, e para tal precisam de dentes mais complexos, com muitos “solavancos e cumes”. Os omnívoros, tal como os humanos, estão no meio.

Os crocodilos que ainda hoje são encontrados nas Américas, África, Ásia e Austrália têm dentes cónicos para rasgar a carne das presas, que depois é engolida sem ser mastigada. Durante a vida dos crocodilos, os dentes são substituídos continuamente. Como já era sabido, a espécie e alguns dos seus parentes próximos como os jacarés ou os gaviais possuem uma morfologia e comportamentos semelhantes: “são seres semiaquáticos e possuem dentes relativamente simples e em forma cónica, o que contrasta com a dentição das espécies antigas, quer em tamanho, quer na força que possui”, lê-se nas conclusões do estudo. 

O estudo conclui que os crocodilos herbívoros foram mais comuns do que se pensava e estiveram presentes durante todo o mesozóico e na maioria dos continentes. “Muitos destes crocodilos viviam lado a lado com seres omnívoros ou herbívoros, o que ilustra uma particularidade de alimentação que hoje não existe”, lê-se nas conclusões do estudo. A ocorrência de múltiplas dentições complexas sugere ainda que a alimentação herbívora era uma estratégia dietética e não uma ocorrência única.

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