Câmara chega a acordo para que mais dois moradores saiam do prédio Coutinho, os restantes recusam

“Esta visita foi uma última tentativa para pedirmos às pessoas que saiam com dignidade”, avisa autarca. Ministro do Ambiente diz que “os abusados são os poderes públicos”. Moradores criticam “papel miserável” da Vianapolis.

Foto
Nelson Garrido

O presidente da Câmara de Viana do Castelo visitou esta sexta-feira o edifício de 13 andares pela primeira vez e, no final, afirmou existir um “princípio de acordo” para a saída de dois dos nove moradores que restam. Os outros recusaram a visita, criticando a postura dos poderes públicos ao longo da semana.

Na sua primeira visita ao prédio Coutinho desde que, em 2009, assumiu a presidência da Câmara de Viana do Castelo, José Maria Costa demorou cerca de uma hora e meia a reunir com os moradores, durante a tarde desta sexta-feira. No final, anunciou ter obtido um “princípio de acordo” para Armando Cunha e Fátima Cunha abandonarem a habitação onde residem desde 1975.

“Esta visita foi uma última tentativa para pedirmos às pessoas que saiam com dignidade e, neste caso, há um princípio de acordo”, disse, nas imediações do edifício. A filha de ambos os moradores, Manuela Cunha, acompanhou o autarca nas declarações aos jornalistas para dizer que os seus pais “estão bem” e que a saída do prédio “está quase a ser conseguida”.

Depois de ter dito, na segunda-feira, dia para o qual estava previsto o despejo de todos os moradores, que a VianaPolis iria utilizar todos os “meios legais” para retirar os moradores e concretizar a expropriação de todas as fracções do prédio, José Maria Costa lembrou que os moradores estão a “ocupar ilegalmente propriedade do Estado”. Restam-lhes duas opções, disse: mudarem-se para um dos dois novos prédios construídos pela VianaPolis ou aceitarem as indemnizações, avaliadas pelo Tribunal de Contas em 1,2 milhões de euros, no total. “Estamos a esgotar todas as formas de negociação. Tenho a consciência de que fiz tudo para resolver a situação”, reiterou.

O presidente da câmara conseguiu falar com alguns dos moradores barricados nas suas habitações, mas não com todos. Alguns deles recusaram a visita por não poderem contar com os seus advogados. Foi o caso de José Santos, que está a acompanhar o pai, residente no 5.º andar.  “Não ouvimos o presidente da câmara bater à nossa porta, mas, de qualquer maneira, só falaríamos na presença dos nossos advogados”, vincou ao PÚBLICO.

A situação no interior da habitação, confessou, está cada vez mais difícil, com uma dieta à base de fruta e bolachas e impossibilidade de receber água e comida do exterior. José Santos criticou a PSP por seguir ordens da câmara para impedir que os mantimentos cheguem aos moradores através de cordas. A postura de José Maria Costa neste processo foi também visada. “O presidente da câmara veio ao prédio Coutinho mostrar que é capaz de negociar com os moradores, mas tem sido um negociador deplorável”, acusou. “Numa semana em que poderia negociar com os moradores, cortou a água e o gás. Isso não são condições para uma negociação.

José Santos falou ainda das demolições de estruturas interiores que ocorreram junto à habitação. “O meu pai mora no 5.º esquerdo e estiveram a fazer demolições no 5.º centro”. O início das demolições interiores pela VianaPolis, logo depois das 8h, marcou o dia de sexta-feira. Depois de ter cortado os abastecimentos de água, na segunda-feira, de gás, na terça, e de electricidade na quinta, a sociedade detida pelo Estado (60%) e pela câmara (40%) prometera, na quinta-feira, iniciar a “desconstrução do prédio” a qualquer momento.

Barricado dentro da sua casa, para manter a sua propriedade, Agostinho Correia disse ao PÚBLICO não “estar impressionado” com esses trabalhos e questionou qual a licença que a sociedade tem para iniciar os trabalhos. A demolição foi entregue à empresa DST, em Outubro de 2017, por 1,2 milhões de euros, mas está espera o visto do Tribunal de Contas.

“Os abusados são os poderes públicos”

O ministro do Ambiente, João Pedro Matos Fernandes, realçou esta sexta-feira que o principal lesado num processo que já dura há 19 anos é o interesse público. “Aqui os abusados somos mesmo nós, os poderes públicos. Estas pessoas intentaram um conjunto de acções em tribunal e perderam-nas todas”, vincou, numa referência à última providência cautelar intentada pelos moradores contra a expropriação do edifício de 13 andares, em Março de 2018, que acabou indeferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, no passado mês de Abril.

Presente na manhã desta sexta-feira em Barroselas, Viana do Castelo, Matos Fernandes referiu-se ainda ao prédio Coutinho como um “abcesso urbano” e alegou que a cidade precisa de um novo mercado, já que o anterior, demolido em 2003, não tinha condições. Os comerciantes da cidade têm sido, a seu ver, um dos grupos mais prejudicados na questão do Edifício Jardim, o nome oficial do prédio. “Estamos a faltar à palavra com os comerciantes de Viana do Castelo há 19 anos”, disse.

A VianaPolis impediu ainda a “entrada de qualquer pessoa não autorizada no edifício”, apesar de ter garantido a “saída livre e sem qualquer restrição de pessoas e bens”. O advogado dos moradores, Magalhães Sant’Ana, foi impedido de entrar no prédio esta manhã e queixou-se que, ao ser impossibilitado de prestar assistência jurídica aos seus clientes, a Constituição estava a ser violada. “A VianaPolis está-se a prestar a um papel miserável”, disse.

Sugerir correcção
Ler 5 comentários