Irão avisa que está a dias de superar limite de acumulação de urânio enriquecido

Teerão acelera processo de desvinculação do acordo nuclear, em resposta ao abandono dos EUA, e pressiona países europeus. Washington condena “chantagem nuclear” e pede “pressão internacional”.

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Presidente Hassan Rouhani anunciou, em Maio, a suspensão da aplicação de algumas exigências do acordo nuclear EPA/ABEDIN TAHERKENAREH

A agência atómica do Irão anunciou esta segunda-feira que o país está a dez dias de superar o limite de urânio enriquecido acumulado imposto pelo acordo nuclear de 2015. O incumprimento vai de encontro à decisão iraniana, tomada em Maio, de suspender algumas das exigências do acordo, na sequência do abandono e da reposição de sanções por parte dos Estados Unidos. Teerão promete acelerar o enriquecimento de urânio e diz que há tempo de salvar o compromisso “se os países europeus agirem” nesse sentido. Em Washington, pede-se “incremento da pressão internacional” para derrotar a “chantagem nuclear” iraniana.

O acordo nuclear assinado em 2015 pelo grupo 5+1 (EUA, Reino Unido, França, China e Rússia, mais Alemanha) e a União Europeia, segundo o qual o Irão se compromete a limitar a sua produção nuclear em troca do levantamento das sanções económicas internacionais, estabelece que as reservas de urânio enriquecido iranianas não podem ultrapassar os 300 quilos.

Behrouz Kamalvandi, porta-voz da Organização de Energia Atómica do Irão, revelou que esse limite será superado a 27 de Junho e que a quantidade de urânio enriquecido vai aumentar “drasticamente”, a partir de 7 de Julho, “de acordo com as necessidades do país”. Tanto

“Uma possibilidade é definirmos como necessário abastecer a central eléctrica de Bushehr, que exige urânio enriquecido a 5%, outra é o reactor de investigação de Teerão, e aí seria 20%”.

Em resposta à decisão da Administração Trump de rasgar unilateralmente o acordo nuclear – por entender que o Irão nunca abdicou seriamente de desenvolver armas de destruição maciça –, Teerão avançou para a suspensão de algumas das suas disposições, no início de Maio, instando os restantes signatários do acordo a apresentarem uma solução no espaço de 60 dias.

A reposição das sanções norte-americanas à economia iraniana ameaça o seu sector bancário e petrolífero – as exportações de petróleo reduziram-se para 400 mil barris por dia – e a permanência de muitas empresas europeias no país. Nesse sentido, o Irão tem pressionado a UE para se chegar à frente na protecção dos interesses de todas as partes. O porta-voz sublinhou mesmo que “ainda há tempo” de salvar o acordo nuclear “se os países europeus agirem”.

Emmanuel Macron já reagiu à pressão iraniana. Lamentando-o, o Presidente francês pediu “paciência e responsabilidade” ao país liderado por Hassan Rohani e remeteu a avaliação do cumprimento ou incumprimento do acordo para a Agência de Energia Atómica Internacional (IAEA). 

“Lamento o anúncio iraniano de hoje. Mas tal como a IAEA têm sublinhado, o Irão está a respeitar os seus compromissos. Nós encorajamo-los firmemente a serem pacientes e responsáveis”, disse o Presidente francês a partir da Ucrânia. “Faremos tudo o que pudermos para, em conjunto com os nossos parceiros, dissuadirmos o Irão e encontrarmos um caminho possível para o diálogo”.

“Mais simbólico que substancial”

Citado pela Al-Jazira, o investigador do think tank Brookings Doha Center, Ali Fathollah Nejad, considera que o anúncio desta segunda-feira é “mais simbólico que substancial”, e tem como objectivo ampliar a pressão sobre a Europa. “Pretende obter vantagens negociais e pôr ainda mais pressão sobre a Europa. É mais simbólico que substancial, uma vez que o Irão não vai cometer nenhuma violação. Vai aproximar-se o mais possível do limite, mas não o vai ultrapassar, porque não quer perder o apoio europeu”, afiança Nejad. “Por enquanto não é essa a estratégia iraniana”.

Os EUA é que não estão disponíveis para mudar a sua postura. Em resposta ao anúncio da agência atómica, Administração norte-americana afirmou que Donald Trump não está surpreendido com a movimentação iraniana, criticou novamente o acordo e pediu à comunidade internacional para não ceder à “chantagem nuclear” de Teerão.

“Os planos de enriquecimento [de urânio] do Irão só são possíveis devido a um acordo nuclear horrível, que deixou as suas capacidades intactas. E o Presidente Trump deixou bem claro que nunca permitirá que o Irão desenvolva armas nucleares”, reagiu um porta-voz do Conselho de Segurança Nacional, citado pela Reuters. “A chantagem nuclear do regime deve ser tratada com o incremento da pressão internacional”.

As relações entre Washington e Teerão atingiram nas últimas semanas níveis mínimos. Estados Unidos – mas também Reino Unido e Arábia Saudita – voltaram a acusar o Irão envolvimento nas mais recentes explosões em dois petroleiros no Golfo de Omã, o segundo incidente do género no espaço de um mês. Os iranianos negam todas as acusações e pedem à UE que tome posição, para ajudar a desanuviar a tensão na região.

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