Ministra da Cultura diz que continua a trabalhar para resolver diferendo no Opart, apesar da greve

À margem da sua visita oficial a Pequim, Graça Fonseca quebrou finalmente o silêncio acerca da paralisação que já levou ao cancelamento de três récitas da ópera La Bohème.

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Rui Gaudencio

Quebrando um silêncio de quase uma semana, a ministra da Cultura, Graça Fonseca, afirmou esta quinta-feira em Pequim que o Governo continua a trabalhar para resolver o diferendo laboral no Organismo de Produção Artística (Opart), apesar da greve que já levou ao cancelamento de três récitas da ópera La Bohème no Teatro Nacional de São Carlos, em Lisboa.

Em declarações à Agência Lusa no decurso da sua visita oficial à China, a ministra lembrou que o presidente do conselho de administração do Opart, Carlos Vargas, assumiu um conjunto de compromissos, com o aval do Governo, que abrange “a contratualização do novo espaço [de ensaios] para a [Orquestra Sinfónica Portuguesa], a entrega das tabelas salariais revistas e a entrega do regulamento interno”. A aprovação deste último deve acontecer ainda este mês.

“O levantamento que o conselho de administração se comprometeu a fazer até ao final de Setembro é o de todo o trabalho suplementar não-remunerado, para precisamente resolver esta questão. E foi dito ao sindicato que não seria possível assumir a harmonização salarial entre os técnicos das duas estruturas [São Carlos e Companhia Nacional de Bailado (CNB)] até à data de 15 de Setembro, que era a data que o sindicato solicitava, por várias razões”, acrescentou a ministra, para quem não é possível resolver em três meses “o que não foi possível fazer em dez anos”.

Graça Fonseca disse ainda que a dupla de vogais do actual conselho de administração, Sandra Castro Simões e Samuel Rego, “manifestamente extravasou as competências que poderia ter assumido”, ao admitir como possível “ter o regulamento interno aprovado até ao final do mês de Abril”.

O actual conselho de administração do Opart, presidido por Carlos Vargas, foi nomeado em 2016 para um mandato de três anos, que já expirou. No início de Maio, o Ministério da Cultura assegurou que o anúncio da nova composição deste órgão estava “para breve". O Expresso chegou então a noticiar ser intenção da ministra reconduzir apenas o presidente e deixar cair os dois vogais que o acompanham, informação que até ao momento não foi oficialmente confirmada mas que condiz com estas declarações e com outras do mesmo teor que Graça Fonseca proferiu na sua última audição regimental na Assembleia da República, a 28 de Maio, altura em que apontou o dedo a Sandra Simões e Samuel Rego pela produção de um regulamento interno de pessoal desadequado.  

A governante justificou esta quinta-feira em Pequim a impossibilidade de assumir a data de Setembro para a harmonização salarial com a necessidade de aprovar previamente o regulamento interno e a nova tabela salarial e de concluir o levantamento do trabalho suplementar não-remunerado. Só depois, repetiu, será possível “discutir como é que se resolve esta situação, que se arrasta desde a origem do Opart, da diferença salarial entre trabalhadores do São Carlos e da CNB”.

No começo da semana, o Sindicato dos Trabalhadores de Espetáculos, do Audiovisual e dos Músicos (CENA-STE) anunciou que, face à “inoperância e incapacidade demonstradas pela tutela da Cultura e das Finanças e pelo presidente da empresa para resolver a situação”, iria pedir uma audiência ao primeiro-ministro, António Costa, “na certeza de que no momento terá de passar por si o encontro de uma solução para a harmonização salarial”.

A ministra da Cultura reafirma porém que “o compromisso do Governo, numa articulação entre a Cultura e as Finanças, para resolver estes problemas que se arrastam há bastante tempo, continua firme": “Vamos continuar a trabalhar, independentemente de [se] manter a greve”, afirmou Graça Fonseca. Na passada quinta-feira, porém, o conselho de administração do Opart anunciou em comunicado a ruptura das negociações que estavam a ser desenvolvidas por um grupo de trabalho criado para o efeito, num comunicado em que lamentava “a ruptura do processo negocial, numa altura em que havia disponibilidade das áreas governativas da Cultura e das Finanças para resolver problemas que se arrastavam há vários anos, com danos para os trabalhadores”.

Os trabalhadores iniciaram na passada sexta-feira uma série de greves que já afectaram três das cinco récitas previstas da ópera La Bohème(as próximas acontecerão esta sexta-feira, dia 14, e no domingo, dia 16). Mantê-las-ão, diz o sindicato, até que lhes cheguem, por escrito, garantias do Ministério das Finanças em relação às suas reivindicações. Em causa, segundo declarou ao PÚBLICO o dirigente sindical André Albuquerque, está o desbloqueamento de uma verba a rondar os 60 mil euros, o montante necessário para finalmente equiparar os vencimentos dos “cerca de 20” técnicos do São Carlos aos dos técnicos da CNB. Montante que, acrescenta, estará aliás inscrito no orçamento do Opart para 2019. A própria ministra disse em Março no Parlamento que “está previsto orçamentalmente o que é necessário" para a resolução do problema da disparidade salarial entre as duas estruturas geridas pelo Opart.

A promessa de harmonização salarial, queixam-se os funcionários, arrasta-se desde 2017. Em Março, chegou a ser avançado que a equiparação podia consumar-se já em Junho, mas a tutela já desmentiu essa possibilidade.

Além das cinco récitas da ópera La Bohème, o pré-aviso de greve contempla também as apresentações no Porto, de 11 a 13 de Julho, do espectáculo Dom Quixote, pela CNB, e o Festival Ao Largo, que este ano se realiza entre 5 e 27 de Julho mas cujo programa não é ainda conhecido.

Em Pequim, onde a CNB apresentou por duas vezes, no âmbito da visita oficial da ministra, Quinze Bailarinos e Tempo Incerto, bailarinos e técnicos da companhia fizeram também um protesto, “recusando a presença em qualquer iniciativa agendada pelas entidades nacionais e rejeitando qualquer tipo de encontro protocolar com essas entidades antes e depois dos espectáculos”.

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