Hong Kong protesta contra lei que permite extradições para a China

Os críticos da lei que a Assembleia Legislativa começa a discutir esta semana dizem que irá pôr em causa a liberdade de qualquer pessoa que desafie Pequim.

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Marcha de protesto organizada por membros da comunidade jurídica de Hong Kong contra a lei da extradição JEROME FAVRE / EPA

Nos últimos dias, a sala do hemiciclo da Assembleia Legislativa de Hong Kong serviu de casa para um grupo de seis deputados da oposição, que lá permaneceram desde quarta-feira. A acção serviu como protesto contra a intenção do Governo local de abrir a possibilidade de extraditar suspeitos para a China. Os protestos devem subir de intensidade este domingo, durante uma marcha planeada pela oposição, que conta atrair meio milhão de pessoas.

A última grande vaga de protestos foi a de 2014, que ficou conhecida como a “revolução dos guarda-chuvas”. Durante vários meses, milhares de pessoas ocuparam algumas das principais artérias da metrópole, exigindo reformas que tornassem a escolha do executivo local mais democrática.

As autoridades de Hong Kong estão a contemplar seriamente a possibilidade de que os protestos voltem a assumir uma grande dimensão e anunciaram a mobilização de um dispositivo de 1600 polícias. Porém, independentemente do que aconteça este domingo, é praticamente certo que as exigências dos manifestantes não sejam atendidas, tal como aconteceu em 2014.

A Lei dos Fugitivos, como é conhecida, vai começar a ser discutida pela segunda vez na Assembleia Legislativa na quarta-feira e deverá ser facilmente aprovada pela maioria que apoia o Governo de Hong Kong, próximo do Partido Comunista Chinês. O diploma irá permitir a extradição de suspeitos para qualquer país com o qual Hong Kong não tenha um acordo formal, incluindo a China.

Os apoiantes da lei dizem que o objectivo é suprir uma lacuna no ordenamento jurídico de Hong Kong e que a ausência da possibilidade de extraditar suspeitos de crimes para a China poderá tornar a cidade num “refúgio para criminosos internacionais”. O assunto foi levantado pela primeira vez depois de no ano passado um cidadão de Hong Kong ter assassinado a namorada durante uma viagem a Taiwan. Uma vez que Hong Kong não tem um acordo de extradição para Taiwan, o homem, de regresso à metrópole, não pôde ser julgado pelo homicídio, mas apenas por crimes menos graves – como a utilização indevida do cartão de crédito da vítima.

O receio de deputados e activistas pró-democracia é o de que, sob a aparência de se estar a aprovar uma medida que aumenta a segurança em Hong Kong, se esteja na verdade a ceder uma parte importante da autonomia judicial que o território goza. No limite, dizem os críticos da lei, a sua aprovação iria permitir a entrega de qualquer cidadão procurado pelas autoridades chinesas.

Críticas de Chris Patten

A lei fornece garantias para impedir que pessoas perseguidas por razões políticas ou religiosas noutro país possam ser extraditadas. Mas alguns especialistas consideram que facilmente se podem contornar esses procedimentos. “Seria bastante fácil cozinhar um pedido de extradição baseado em factos que constituam um crime em ambas as jurisdições. Por exemplo, veja-se como seria fácil enquadrar pedidos em termos de fraude ou conspiração para burlar”, disse ao site China File o académico do Instituto de Direito EUA-Ásia da Universidade de Nova Iorque Alvin Cheung.

O último governador britânico de Hong Kong, Chris Patten, disse que a medida irá desferir um “golpe terrível” contra o “Estado de direito, contra a estabilidade e segurança de Hong Kong”. A lei irá “retirar a parede isoladora entre o Estado de direito de Hong Kong e a ideia de direito que impera na China comunista”, afirmou Patten, num vídeo publicado na semana passada.

Organizações não-governamentais como a Human Rights Watch também avisaram para o perigo que a lei de extradição irá suscitar para os activistas que lidam com a China e que muitas vezes escolhem Hong Kong como sede do seu trabalho. “Ninguém estará a salvo, incluindo activistas, advogados de direitos humanos, jornalistas, e trabalhadores sociais”, afirmou a directora da organização na China, Sophie Richardson.

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