Nas ruas, no 1.º de Maio, gritou-se por melhores salários e menos precariedade

CGTP e PCP reivindicam aumento do salário mínimo para 850 euros. Bloco também defende a valorização dos salários. Os direitos laborais saíram à rua no desfile do 1.º Maio, em Lisboa.

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Arménio Carlos discursa na Alameda Nuno Ferreira Santos
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CGTP organiza desfile Nuno Ferreira Santos
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1.º de Maio em Lisboa Nuno Ferreira Santos
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Comemorações do Dia do Trabalhador Nuno Ferreira Santos

Dos megafones da CGTP saem, alto e bom som, as palavras de ordem que correspondem aos desejos de muitos: “É justo e necessário um aumento do salário.” Felisberto Mateus, 62 anos, não está preocupado com rimas, mas com o pouco dinheiro que lhe cai na conta todos os meses: “Um gajo ganha pouco. 635 euros não dá para nada”, exclama. Não é único. Nuno Sousa, 23 anos, também a participar no desfile do 1.º de Maio em Lisboa, conta que está desempregado.

No fim, já na Alameda, o secretário-geral da CGTP, Arménio Carlos, respondeu a estes anseios e, ao microfone, prometeu lutar pelo “aumento geral dos salários dos trabalhadores, a valorização das profissões e a fixação do salário mínimo nacional nos 850 euros a curto prazo”.

Arménio Carlos não ficou por aqui e defendeu também “a revogação das normas gravosas da legislação do trabalho” e a “rejeição da proposta laboral do Governo do PS” que considerou “uma provocação à Constituição”: “Por mais desculpas que o Governo do PS invente, não é possível governar à esquerda com a legislação laboral da direita.”

Naquela que foi a última vez que discursou num 1.º de Maio, o secretário-geral da CGTP insistiu num “combate sério à precariedade”, nas “35 horas de horário de trabalho semanal, sem perda de retribuição”, “no reforço do investimento nos serviços públicos” e, entre outras reivindicações, “na valorização dos trabalhadores da Administração Pública”.

Em ano de eleições legislativas, a CGTP comprometeu-se a apresentar, “brevemente”, a todos os partidos com assento parlamentar estas propostas, “para que sejam consideradas” nos programas eleitorais. “É preciso que nas eleições de 6 de Outubro, para a Assembleia da República, os trabalhadores conheçam as opções de cada partido”, disse o secretário-geral, numa intervenção na qual não deixou de se referir à polémica do momento, defendendo a necessidade de uma “Lei da Bases da Saúde que impeça que o Serviço Nacional de Saúde (SNS) seja absorvido pelos interesses do negócio privado”. Deixou ainda outro recado: “A lei da greve não precisa de ser alterada, tem é de ser cumprida.”

No texto da resolução apresentada pela CGTP, pode também ler-se que “apesar dos avanços registados” no “quadro da alteração da correlação de forças” do Parlamento, subsistem “injustiças”. No mesmo documento, acusa-se o Governo do PS de, “por opção, desprezar” aquela correlação de forças, em áreas como as do trabalho. E apela-se ao voto, nas eleições europeias, em quem defenda os interesses dos trabalhadores.

Quem já mostrou apoiar a reivindicação de aumentar o salário mínimo para 850 euros foi o secretário-geral do PCP, Jerónimo de Sousa. Também a coordenadora do Bloco de Esquerda, Catarina Martins, entende que os salários devem ser valorizados. “Este é o 1.º de Maio do final desta legislatura e nós temos, no Parlamento, decisões importantíssimas para quem trabalha a serem tomadas, alterações ao Código do Trabalho”, começou por dizer. “Esperamos que este 1.º de Maio seja um momento de assumir compromissos e, eu diria, todas as forças políticas assumirem esta necessidade no nosso país de respeitar quem vive do trabalho, de valorizar os salários, de combater a precariedade, os horários longos de mais para os salários curtos de mais, é agora no Parlamento, é durante este mês”, lembrou.

Lei de Bases da Saúde

À margem do desfile, os dois líderes abordaram a polémica em torno da Lei de Bases de Saúde, num dia em que o próprio primeiro-ministro publicou uma carta aberta no PÚBLICO. Jerónimo garantiu que o PCP se baterá “pelo fim das Parcerias Público-Privadas (PPP)” e defendeu a necessidade de se “clarificar e separar as águas” entre o SNS e os grupos privados. Já Catarina Martins explicou que “ninguém está a acabar” com os privados na saúde e que a questão principal é saber onde é gasto o dinheiro público. Sobre o Governo e o PS, considerou estarem “com dificuldades em explicar a sua posição aos seus próprios militantes.”

Em Braga, nas comemorações organizadas pela UGT, a secretária-geral adjunta do PS, Ana Catarina Mendes, garantiu que o partido “não recuou nunca” sobre um SNS como “espinha dorsal público universal e tendencialmente gratuito”, reconhecendo o “carácter supletivo” e “temporário” da existência de parcerias público-privadas.

Grande parte, porém, dos anseios de quem esteve no desfile do 1.º de Maio, em Lisboa, dizem respeito aos direitos laborais. E esperam respostas da esquerda. Felisberto Lopes admite que vota PS e diz nada saber sobre possíveis acordos à esquerda no futuro. O que lhe interessa é que, com ou sem entendimentos, se diminuam as assimetrias no país: “Vai haver sempre o rico e o pobre, mas pelo menos que ajudem mais os pobres.”

A “geringonça"

Outros mostravam-se satisfeitos com a chamada “geringonça” e o que desejam, depois de Outubro, é que ela seja reforçada pelos partidos à esquerda. Nada de maiorias absolutas do PS. De cravo ao peito, Lara Ladina, restauradora de 45 anos, prefere uma solução governativa como a actual, porque obriga a esquerda a negociar mais. Ao lado, a mãe, Aldina Carvalho, de 73 anos, junta-se à conversa para defender o mesmo. Entendem que ainda há muito a fazer no combate à violência doméstica, na igualdade salarial entre homens e mulheres, na melhoria geral dos salários.

No passeio da Almirante Reis, Joaquim Rocha, de 74 anos, e Joaquim Santos, de 66, ambos reformados, entram na discussão. “O fascismo está a levantar a cabeça nestes tempos no país e no mundo”, diz Joaquim Rocha que gostava que a “geringonça” melhorasse, que tivesse mais “força do PCP”. “As maiorias absolutas do PS fizeram sempre bem ao capital, não ao país”, diz. A conversa continua: “Acha que o PS se vai juntar novamente?”, pergunta Aldina Carvalho.

Diante deles, agitam-se bandeiras, há música, gritam-se palavras de ordem, tambores, exibem-se cravos ao peito. “Houve pessoas que lutaram muito por isto. Temos de continuar a combater com a nossa voz”, diz Joaquim Santos. Pela avenida fora, continua a ouvir-se: “Maio está na rua, a luta continua.”

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