Brunei pede “tolerância” com a decisão de punir sexo homossexual com apedrejamento até à morte

Numa carta endereçada ao Parlamento Europeu, o Brunei pede “tolerância, respeito e compreensão” pelo desejo de preservar os seus valores tradicionais.

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O sultão do Brunei, Hassanal Bolkiah REUTERS

O Brunei enviou uma carta aos membros do Parlamento Europeu (PE) na qual defende a sua decisão de começar a punir casos de adultério e de sexo entre gays com apedrejamento até à morte. Estas novas medidas fazem parte de um código penal que se baseia numa interpretação ultraconservadora da sharia, a lei islâmica.

O país asiático é uma das nações de maioria muçulmana mais conservadores do continente (em 450 mil habitantes, dois terços são muçulmanos), mas só a partir de 2014 é que o Brunei começou a prever penas como o apedrejamento, a flagelação ou a amputação para casos de roubo. O novo código penal foi apresentado no início de Abril, apesar da onda de protestos internacionais. 

Agora, numa carta endereçada ao Parlamento Europeu, a Missão Permanente do Brunei Darussalam junto da Organização das Nações Unidas pede “tolerância, respeito e compreensão” pelo desejo do país de preservar os seus valores tradicionais. Afirma que as críticas de vários países devem-se a um equívoco que o país quer esclarecer, acrescentando que este tipo de punições serão raras: para os cidadãos serem condenados, o crime terá de ter como testemunhas “pelo menos dois homens com altos valores morais e piedosos”.

“As sentenças penais para o apedrejamento até a morte e amputação, impostas por crimes de roubo, adultério e sodomia têm um limiar de evidência extremamente alto, exigindo não menos do que dois ou quatro homens com altos valores morais e piedosos para a exclusão de todas as forma de evidências circunstanciais”, pode ler-se na carta enviada ao PE.

No entanto, segundo o documento, é extremamente difícil encontrar tais homens hoje em dia, uma vez que só chega a este estatuto quem realiza “todos os deveres religiosos, se abstém de cometer pecados capitais e não está a cometer perpetuamente outros pecados menores”. Todo o homem que falhe uma única oração durante a sua vida também será desqualificado. Tudo isto pode levar a que este tipo de condenações sejam raras ou que baseiem unicamente na confissão do autor do crime.

Como chicotear

No que toca à flagelação, a equipa da Missão Permanente do Brunei junto da ONU explica que, se tal punição for considerada pelos tribunais como o castigo apropriado, as chicoteadas só serão executadas por pessoas do mesmo sexo do que o suposto condenado. “O ofensor deve estar vestido, chicotear com força moderada e sem levantar a mão sobre a cabeça. O castigo não deve resultar na laceração da pele nem pode ser responsável por partir ossos e não deve ser infligido no rosto, cabeça, estômago, peito ou zonas íntimas.”

Segundo o documento, a constituição do país prevê que o islamismo seja a religião oficial do Brunei, mas também reconhece o direito explícito aos não muçulmanos de praticar as suas religiões em “paz e harmonia”. 

Em defesa da sharia

Com entrada em vigor do novo código penal, o país passa a ter um sistema legal duplo baseado não só na lei comum mas também na sharia. "Com a implementação da sharia, ambos os sistemas continuarão a funcionar paralelamente para manter a paz e a ordem e preservar a nossa religião, vida, família e indivíduos, independentemente de género, nacionalidade, raça e fé”, afirma a equipa.

O texto continua: a sharia “concentra-se mais na prevenção do que na punição, uma vez que o seu objectivo é educar, deter, reabilitar e nutrir. Não criminaliza nem tem qualquer intenção de vitimizar alguém com base na sua orientação sexual ou crença, incluindo relações entre o mesmo sexo. A criminalização do adultério e da sodomia é para salvaguardar a santidade da linhagem familiar e do casamento de muçulmanos individuais, especialmente as mulheres.”

Várias instituições de defesa dos direitos humanos de vários países têm-se manifestado contra a implementação do novo código penal. Várias celebridades anunciaram também que vão boicotar alguns hotéis da cadeia Dorchester Collection, que é controlada pelo Brunei Investment Agency, cujo dono é o sultão do Brunei, Hassanal Bolkiah. São ao todo nove hotéis, entre eles o icónico Beverly Hills Hotel — adorado por várias estrelas de Hollywood.​

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