Governo vai pagar 65 milhões para ter helicópteros e aviões nos incêndios

Relatório final do júri do concurso confirma adjudicação de 30 helicópteros a uma empresa. Concorrentes contestaram, mas júri diz que não estava previsto limite por empresa. Concurso pode vir a ser impugnado

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A empresa Helibravo tinha vencido o concurso do ano passado para dez helicótperos ligeiros para todo o ano Daniel Rocha

Dos nove lotes de helicópteros e aviões a concurso, a empresa portuguesa Helibravo conseguiu ganhar sete, o que implica fornecer ao Estado 30 helicópteros de combate a incêndios — e não os tem. Os concorrentes questionaram a capacidade de a empresa fornecer o serviço e de esmagar a margem de lucro do sector para conseguir vencer o concurso, mas o júri disse que nada podia fazer, uma vez que o concurso inicial não estabelece um limite à concentração por empresa. O resultado é que o Estado irá pagar um total de 65,7 milhões de euros - dos 80,22 inicialmente previstos -, 52,9 milhões só à Helibravo. O concurso pode vir a ser impugnado.

O relatório final do concurso de aluguer de aeronaves para combate a incêndios, divulgado pelo Jornal de Notícias e a que o PÚBLICO também teve acesso, foi recebido pelas empresas esta semana e confirma a decisão inicial de contratar a empresa portuguesa para fornecer os helicópteros ligeiros e médios de combate aos incêndios por um valor cerca de 20% abaixo do preço de mercado. Tal como o PÚBLICO tinha referido em Março, a Helibravo apresentou propostas várias centenas de milhar de euros abaixo das concorrentes. Em alguns casos, como nos lotes para os helicópteros médios, os valores que entregou eram na ordem dos 2,3 milhões de euros mais baixos. 

Assim, de acordo com o quadro final, o Estado adjudica 30 helicópteros à Helibravo (18 ligeiros, incluindo um para a Madeira e 12 médios) por 52,9 milhões de euros, quando o preço previsto era de 66,2 milhões de euros para estas aeronaves; três helicópteros pesados à Heliportugal para substituir os Kamov por 4,5 milhões de euros (preço do concurso era de 4,7 milhões); e dois aviões anfíbios médios à CCB por 8,3 milhões de euros, quando o preço previsto era de 9,2 milhões. 

Definir “preço anormalmente baixo"

Os concorrentes, HTA e Babcock, que no ano passado forneceram alguns dos helicópteros por ajuste directo (bem como as restantes empresas que foram chamadas de urgência para que o país tivesse meios aéreos a tempo do Verão do ano passado), queixaram-se pelo facto de a Helibravo apresentar “preços anormalmente baixos” e de isso poder significar “risco de incumprimento” do contrato”. Além disso, requereram a “limitação dos lotes a adjudicar” à empresa. 

É aqui que surge uma crítica indirecta do júri ao concurso elaborado, desta vez e pela primeira vez, pela Força Aérea. Em relação à questão do preço, o júri escreve no relatório que “não foram definidas ‘(...) no programa de concurso (...), as situações em que o preço ou o custo de uma proposta é considerado anormalmente baixo'”. E como tal “não tendo a entidade adjudicante definido este critério, não pode o Júri nesta fase do procedimento substituir-se-lhe, definindo-o”. Neste ponto, o júri acaba ainda por não considerar como válidas as queixas dos concorrentes de que o preço apresentado fica abaixo do custo de operação.

Também em relação à concentração de meios numa empresa, o júri diz-se impossibilitado de o fazer porque o concurso não determina esse limite: “ora, não constando, não pode vir agora o júri determinar ou propor à entidade com competência para decidir adjudicar, uma limitação como a que se requer, sem colocar em causa toda a validade do procedimento”.

A Helibravo, que tem de fornecer assim 30 helicópteros, não os tem e os concorrentes questionaram dois pontos: a concentração numa só empresa; e o facto de a empresa não ter tantos helicópteros e ter de os subcontratar, uma situação comum, mas tendo em conta a quantidade, era posta em causa a capacidade de operação dos meios aéreos. De acordo com informações do sector, e como o PÚBLICO tinha avançado, a Helibravo deverá ter um acordo com a empresa espanhola Faasa, que está a ser investigada em Espanha por prática de cartelização e os concorrentes consideravam que a empresa tinha prestado “falsas declarações” por omitir este acordo.

Contudo, o júri considera que as empresas que contestaram não conseguiram “demonstrar que os preços contratuais estão efectivamente desconformes com os preços de mercado, prosseguindo o concorrente uma estratégia comercial violadora das regras da concorrência, bem como que a sua conduta está desconforme com a forma como de um modo global todos os concorrentes configuram e se posicionam no mercado e no presente procedimento”, escrevem.

A Helibravo venceu o ano passado o concurso para fornecer dez helicópteros durante todo o ano, contrato que termina em Dezembro deste ano, e acabou por partilhar o contrato com a Heliportugal, cada uma tem cinco em operação.

Mas os concorrentes queixaram-se também da adjudicação à Heliportugal dos três helicópteros pesados, em substituição dos Kamov do Estado que continuam parados. A empresa HTA considerou que a Heliportugal estava impedida de concorrer a estes concursos, uma vez que o Estado tinha denunciado um contrato com a empresa em 2015, para a manutenção dos Kamov e ainda por esta se encontrar em insolvência. O júri voltou a negar a pretensão dos concorrentes.

Também nos lotes dos aviões houve queixas, mas também nestas o júri negou haver problemas. O PÚBLICO questionou esta semana o Ministério da Defesa sobre os concursos de meios aéreos, mas ainda não foi possível obter respostas. O gabinete de Gomes Cravinho não tem falado do concurso até que este esteja na sua fase final. Apesar de agora já ter o relatório final nas mãos, ainda não é certo se as empresas concorrentes não tentarão impugnar os seus resultados, esta era uma hipótese em cima da mesa, apurou o PÚBLICO.

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