Surpresa. A greve que deixou o Governo e os portugueses de “cabelos em pé”

Jovem Sindicato de Motorista de Matérias Perigosas lança a confusão no país e no Governo. Portugueses correram para as bombas de combustível. Forças Armadas e todas as forças de protecção civil colocadas de prevenção. Executivo lançou mesmo “situação de alerta” e declarou “reconhecimento de crise energética”.

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Alguém esperava que a greve do Sindicato de Motorista de Matérias Perigosas, que arrancou às 00h da segunda-feira, causasse a confusão que causou em Portugal? Alguém previu que “secassem” dezenas de postos de combustível em todo o país? Que o abastecimento de aviões estivesse em causa nos principais aeroportos? Que os portugueses corressem em força às bombas de gasolina criando filas de dezenas (centenas?) de metros? Que se tivesse de organizar “comboios” de dezenas de camiões-cisterna protegidos pelas forças especiais da PSP e da GNR para resolver os problemas de abastecimento mais grave? A resposta a todas estas perguntas é “não”. O filme do dia desta surpreendente greve mostra que nem o Governo nem os próprios sindicalistas esperavam/previram que confusão atingisse o nível que atingiu.

E aqui nasce outra pergunta de uma palavra só: Porquê? A resposta é mais difícil, mas no que ao Governo respeita fica claramente a ideia que desvalorizou a greve e acabou apanhado de surpresa. O Governo que, no final de Dezembro do ano passado, montou uma mega operação para uma manifestação dos chamados coletes amarelos que se revelaria um flop, foi agora “apanhado na curva”, para usar a expressão de um sindicalista num directo de uma televisão. E “apanhado na curva” por um jovem sindicato com cerca de quatro meses e desligado das grandes centrais sindicais.

E quando o Governo apareceu nas televisões, por volta das 14h, já os sites dos órgãos de comunicação social e os directos das televisões mostravam o país embrulhado numa enorme confusão – caos, uma palavra muito repetida ontem, talvez seja um pouco exagerada.

A esta hora apresentou-se no Ministério da Administração Interna o ministro do Ambiente e da Transição Energética, Matos Fernandes, que tutela os transportes, e o da Economia, Siza Vieira, que começou por dizer “o Governo teve a noção de que os serviços mínimos não estavam ser cumpridos” e que por isso tinha sido convocada a requisição civil (decisão anunciada às 7h30, após deliberação de Conselho de Ministros extraordinário).

Logo de seguida, Siza Vieira sublinhou que “a requisição civil entrou em vigor” de imediato, o que significa que os trabalhadores eram obrigados a cumprir os serviços desde logo: “Neste momento todos os trabalhadores que estejam de escala estão obrigados aos serviços mínimos nos termos da lei.”

No meio da surpresa que foi crescendo para muita atrapalhação, o Governo ter-se-á mesmo “esquecido” de activar as chamadas reservas de segurança de petróleo bruto e de produtos de petróleo armazenadas com o fim de serem introduzidas no mercado quando expressamente determinado pelo membro do Governo responsável pela área da energia, para fazer face a situações de perturbação grave do abastecimento. Trata-se de uma directiva comunitária, transposta para a legislação nacional e que estabelece a necessidade da existência de reservas de combustível.

Forças armadas de prevenção

Pelas 15h, o Governo colocava as Forças Armadas de prevenção para intervirem na greve. Este plano, soube o PÚBLICO, passa especificamente pelo recurso a militares para conduzirem os camiões-cisterna que estão parados mas com combustível necessário para vários serviços públicos, desde transportes a viaturas de emergência médica. Para que os militares sejam chamados a agir terá que haver, contudo, uma decisão do Conselho de Ministros. Contactado pelo PÚBLICO, S. Bento não quis fazer nenhum comentário.

O recurso a militares, para substituírem os motoristas que convocaram a greve, não é comum mas está expressamente previsto no decreto-lei de 1974 que define os princípios a que deve obedecer a requisição civil e que admite “a utilização de pessoal militar para substituir, parcial ou totalmente, o pessoal civil”.

Alerta e crise energética

Mais tarde, os ministros da Administração Interna e do Ambiente e da Transição Energética declararam mesmo “situação de alerta” implementando medidas excepcionais para garantir os abastecimentos.

Esta situação de alerta começou ontem e durará até às 23h59 do dia 21 deste mês. Foi assim determinada a “elevação do grau de prontidão e resposta operacional por parte das forças e serviços de segurança e de todos os agentes de protecção civil, com reforço de meios para operações de patrulhamento e escolta que permitam garantir a concretização das operações de abastecimento de combustíveis, bem como a respectiva segurança de pessoas e bens”.

A nota refere que o Governo também determina a “declaração de reconhecimento de crise energética, que acautele de imediato níveis mínimos nos postos de abastecimento, de forma a garantir o abastecimento de serviços essenciais, designadamente para forças e serviços de segurança, assim como emergência médica, protecção e socorro”.

Os grevistas contestaram todas estas medidas, mas a verdade é que também eles davam sinais de que o “caldo armado”, para citar um outro sindicalista, também os estava a surpreender. Esse espanto era claro com as manifestações de contentamento que iam crescendo entre os grevistas quanto mais a confusão crescia no país.

“Estão desesperados”

Pelas 18h, já um gabinete de crise formado por membros dos ministérios da Administração Interna, Ambiente, Economia e Infraestruturas e Habitação estava reunido há cerca de três horas, António Medeiros, dirigente do Sindicato de Motorista de Matérias Perigosas cantava vitória. “Já pusemos o ministro [da Economia] de cabelos em pé. Já atingimos os objectivos. Excelente, excelente, isto vai parar o país. A adesão é de 100% e a greve só vai parar quando nos derem o que exigimos. Eles [Governo] estão desesperados. Isto vai parar o país”, afirmou em directo às televisões.

O sindicalista acusava ainda o Governo de “falta de diálogo” e de estar a convocar motoristas espanhóis e outros não preparados para a condução de matérias perigosas para substituir os grevistas. “Quando os médicos e os enfermeiros fazem greve também prejudicam as pessoas. As greves são assim. Eu também não vou visitar a família na Páscoa”, acrescentava.

Por certo uma referência às declarações do Presidente da República do meio da tarde que veio lembrar que “muitas famílias têm uma tradição, que é a de irem à terra passar com mais familiares, esta semana ou, pelo menos, o fim desta semana da Páscoa”, a qual será afectada se a falta de combustíveis não for resolvida a tempo. Marcelo revelou ainda que estava em contacto com o primeiro-ministro, acompanhando com “preocupação” a crise no abastecimento de combustíveis.

Mas afinal o que exigem os grevistas? Os motoristas reivindicam “o reconhecimento da categoria profissional porque são considerados apenas trabalhadores de pesados apesar de existirem diferenças [e de serem] obrigados a ter formação especial”, havendo ainda “riscos suplementares” ao transporte de combustíveis e outros materiais perigosos, disse o vice-presidente do sindicato Pedro Pardal Henriques.

A situação mais tensa foi vivida no parque de combustíveis da Companhia Logística de Combustíveis (CLC), em Aveiras, onde se concentravam muitos grevistas. Este foi o ponto de partida de um “comboio” de oito camiões-cisterna que ao fim da tarde partiu para Lisboa, para normalizar o abastecimento de combustível ao Aeroporto Humberto Delgado. Os grevistas protestaram, mas as forças de segurança garantiram que o “comboio” saísse em segurança.

Às 20h, na Assembleia da República, o ministro Siza Vieira fazia um apelo “à serenidade” e garantia que o Governo está a preparar todos os meios para assegurar que “as condições de reabastecimento se retomem”.

Às 21h, o ministro das Infraestruturas e da Habitação iniciou uma reunião, com o Sindicato Nacional de Motoristas de Matérias Perigosas e a Associação Nacional de Transportadores Públicos Rodoviários de Mercadorias, mas onde não foi discutido nem alcançado qualquer acordo: a greve é para continuar, tendo apenas sido definidos os serviços mínimos.

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