Dez projectos para fazer de Campanhã um “local de paragem”

Para além do antigo Matadouro, futuro da freguesia mais pobre da cidade passa por mais e melhor habitação, coesão social e mitigação das barreiras físicas que a dividem. Área de Reabilitação Urbana terá de ser ampliada para Rui Moreira concretizar o seu masterplan

Foto
Antigo Matadouro Industrial é um "equipamento âncora" para a zona Inês Fernandes

Poderia ser a conhecida estação de comboios a dar a Campanhã o seu estatuto de lugar de partidas e chegadas, onde muitos passam e poucos ficam. Mas a história é mais complexa do que isso. O limbo onde a freguesia oriental se perdeu, algures entre a matriz rural e zona industrial nunca recuperada e o pólo urbano não concretizado, fez daquele território um lugar eternamente adiado. Um espaço incapaz de se assumir como “local de paragem”, assume a própria autarquia num documento de 69 páginas onde apresenta o seu há muito falado masterplan de Campanhã.

Na próxima reunião camarária, a 9 de Abril, será levado à votação o Projecto da Operação de Reabilitação Urbana (ORU) da Corujeira, que implicará um alargamento da Área de Reabilitação Urbana (ARU) daquela zona, aprovado há cerca de um ano. Para o plano de Rui Moreira ir avante, é preciso alargar esse território em 36 hectares, para lá incluir núcleos habitacionais à volta da estrada nacional 12, nomeadamente nas zonas do Pêgo Negro e do Parque Oriental.

O masterplan, apresentado à população esta noite de quinta-feira por Rui Moreira, tem como base uma dezena de projectos estruturantes. Alguns deles já conhecidos. Mas a definição de estratégica mais fina exigiu uma análise dos problemas, pontos fortes, oportunidades e ameaças daquele território – a chamada SWOT em linguagem empresarial. E a lista de todos eles é extensa. “Esta visão reflecte um conceito global de desenvolvimento e reabilitação da ARU, de forma a permitir promover a melhoria das condições urbanísticas e ambientais desta área da cidade, gerando um território com uma identidade reforçada, mais coeso e apto a atrair as oportunidades que dinamizem o seu tecido económico, social e cultural.”

O “equipamento âncora” é - apesar da reprovação, já contestada, do Tribunal de Contas - o Antigo Matadouro Industrial. Com “numerosas valências e actividades para a promoção da coesão social, da cultura e da economia”, estará ali o epicentro da mudança. Paralelamente ao projecto, já conhecido, será promovida a “reabilitação e a melhoria da qualidade do espaço público envolvente à rua de São Roque da Lameira, através da criação de novas áreas de utilização pública, da requalificação dos espaços públicos e arruamentos existentes e do reforço dos sistemas de acessibilidade e de mobilidade”.

A poucos passos, a Praça da Corujeira, para onde há muito se reivindica uma intervenção, é vista pelo executivo de Rui Moreira como um ponto estratégico de ligação à “malha” envolvente. “Um dos principais espaços lúdicos e turísticos da cidade”, escrevem, será naquela geografia. Haverá um “reordenamento do sector urbano”, com a criação de um sistema viário diferente, estando pensado para o jardim um parque infantil e geriátrico, quiosques e esplanadas. E, claro, uma ligação à nova Praça do Matadouro (de onde sairá um eixo ciclável até Monte da Bela).

Foto
Nos terrenos do antigo bairro de São Vicente de Paulo vai nascer um projecto de habitação para a classe média Manuel Roberto

O Monte da Bela, onde outrora existia o bairro de São Vicente de Paulo, demolido há uma década é outro ponto fulcral deste plano. O projecto de habitação para a classe média, já apresentado em Janeiro, prevê a criação de 230 casas de renda acessível, que deverão estar concluídas em 2022. E ainda uma “valorização dos percursos urbanos de características rurais ao longo da encosta”, estando projectada uma “ligação entre a rua de Bonjóia e a Praça da Corujeira”.

A Rua de São Roque da Lameira e o seu eixo complementar a sul serão também revistos. Bem como a reabilitação dos bairros onde ainda não foi feita intervenção e de ilhas com condições de habitação precárias. Nas antigas instalações da escola do Cerco, recorde-se, haverá um novo centro de saúde, estando também prevista a criação de residências assistidas para idosos. Nos casos onde a recuperação do edificado não se justifique do ponto de vista económico, será promovida uma transferência de habitação, seja através de programas do IHRU ou da ocupação do edificado municipal devoluto.

A criação de um “corredor ecológico” na Corujeira, que quer levar um futuro mais verde a Campanhã, passará sobretudo pelos bairros da freguesia e será um teste para “novos modelos de desenvolvimento urbano por meio de inovações no espaço público”.

A questão da mobilidade é também visada no plano de Moreira. Não poderia ser de outra forma “num território marcado por uma orografia bastante irregular e acidentada e por importantes barreiras físicas, marcadas pelas infra-estruturas ferroviárias”. O próprio vale de Campanhã, a VCI, a estrada da Circunvalação. A história de Campanhã é a de um território historicamente ferido. Para promover uma “maior acessibilidade local e a mobilidade sustentável”, haverá um eixo entre as zonas de Costa Cabral e São Roque da Lameira, as áreas de Contumil e Currais e ainda no núcleo rural de Vila Cova. Para os antigos terrenos do parque de recolha dos STCP e da antiga fábrica “A Invencível” está previsto um novo pólo multifuncional, com habitação, comércio e serviços.

Para além da reabilitação física do edificado e do espaço público, serão “desenvolvidos e promovidos um conjunto de eventos culturais e de animação do espaço público e do comércio local”, sobretudo nas zonas da Corujeira, Contumil e Cerco. E ainda “medidas de prevenção do desenvolvimento de comportamentos desviantes e da marginalidade”, criando “áreas da prevenção primária e secundária, educação, segurança, cultura, desporto e lazer”, sobretudo nos bairros sociais.

Por último, um “laboratório vivo para a descarbonização”. O objectivo, como o nome faz adivinhar, é aumentar a eficiência e reduzir o consumo de energia, testando soluções tecnológicas e promovendo experiências com os cidadãos em espaço urbano. As intervenções serão nas áreas dos “transportes e mobilidade, de eficiência energética em edifícios, de serviços ambientais inovadores e de promoção da economia circular”. E voltando ao conceito de laboratório: se o teste ambiental correr bem na zona oriental, Campanhã poderá servir de exemplo à restante cidade. 

Sugerir correcção
Comentar