Coordenadora pede mais financiamento para aumentar transplantes renais

Seis anos depois de ter assumido funções, Ana França deixa o cargo de coordenadora nacional da transplantação no dia 31 deste mês por motivos pessoais.

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rui Gaudencio

Mais financiamento, melhor gestão e a existência de um plano estratégico são as medidas que a ainda coordenadora nacional da transplantação defende para que se possa aumentar o número de órgãos doados e de transplantes. Em 2018, Portugal realizou 829 transplantes, menos 66 que no ano anterior. Seis anos depois de ter assumido funções, Ana França deixa o cargo no dia 31 deste mês por motivos pessoais.

“A vida de um médico é muito limitada, sobretudo quando a outra parte da família não é da mesma área. Só consegui ter os lugares que desempenhei ao longo da vida porque tive o suporte incondicional do meu marido. Está na altura de aproveitarmos as coisas lado a lado. Aos 67 anos, acho que está na altura de mudar de vida”, explica.

Ana França assumiu o cargo em 2013, numa altura em que a área da transplantação vivia tempo conturbados com um decréscimo do número de órgãos doados e de transplantes realizados. Dois anos antes, o governo PSD/CDS tinha reduzido o financiamento da área em 50%. E em 2012, a então Autoridade para os Serviços de Sangue e Transplantação perdeu parte das suas competências e autoridade ao ser integrada no Instituto Português do Sangue.

O desafio que tinha era motivar novamente os profissionais e maximizar a resposta que se podia dar aos doentes em lista de espera por um órgão. Apostou na “capacitação” dos profissionais e na “articulação” destas duas faces de uma moeda que se pretende que estejam em pé de igualdade: a doação — sem dadores identificados não existem órgãos — e a transplantação, que é a efectivação de todo do processo. Das coisas que mais se orgulha de ter feito nestes seis anos foi “estabelecer a articulação entre a doação e a transplantação”.

Mas esta é uma área em que os desafios não terminam. A lista de doentes à espera de um órgão conta com cerca de duas mil pessoas, a grande maioria à espera de um rim. Para Ana França, médica especialista em medicina interna e medicina intensiva, é na área renal que se deve dar agora um maior impulso. Uma das formas de potenciar a existência de mais transplantes é com maior financiamento.

“O mais adequado seria a criação de um programa à semelhança do que foi feito, por exemplo, para obesidade. A consignação de um preço compreensivo — que tenha em conta o acto da doação, da transplantação e de todos os tratamentos — que desse azo a ter equipas devidamente dimensionadas e a ter condições adequadas de trabalho”, defende. Este modelo “deve ser aplicado a toda doação e transplantação”.

O Instituto Português do Sangue e Transplantação (IPST), onde está integrada a coordenação nacional da transplantação, estudou uma “proposta que passa pela criação de um grupo para avaliar a forma de financiamento”. A proposta ainda não foi apresentada ao Ministério da Saúde.

Melhor gestão

Para Ana França, o novo financiamento deve ter uma fórmula que compense todos os intervenientes e os hospitais que contribuem quer com dadores como com transplantes pelos custos que têm. O financiamento também “tem de considerar os casos em que todo o trabalho foi feito, mas em que não foi possível usar os órgãos para transplantação”. O Registo Português de Transplantação é “o primeiro passo” para a criação de um plano estratégico ao permitir acompanhar todo o processo, desde a identificação de um dador, aos tratamentos feitos, ao tempo de cirurgia e seguimento do doente transplantado.

Maximizar o número de dadores, a utilização de órgãos doados e diminuir a lista de espera passa também por uma melhor gestão. “Temos de dar capacitação ao coordenador hospitalar de doação para que possa fazer o seu trabalho”, afirma Ana França. Estes coordenadores têm como função a identificação de potenciais dadores através do contacto próximo com as unidades de cuidados intensivos.

“A recomendação é que cada coordenador hospitalar de doação possa dedicar a esta actividade dez horas semanais dentro do seu horário normal de trabalho. Nenhum deles tem dez horas, se não for fora do seu horário. O compromisso é dos profissionais, mas também da instituição. O hospital é que é hospital dador”, afirma a responsável.

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