Cientistas portugueses recebem cinco milhões de euros do Conselho Europeu de Investigação

Paulo Lourenço, cientista e docente da Universidade do Minho, e Henrique Leitão, físico e historiador da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa foram distinguido com bolsas que variam entre os dois e os três milhões de euros.

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O cientista Paulo Lourenço Universidade do Minho
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Instituto para a Bio-Sustentabilidade em Guimarães Universidade do Minho

Paulo Lourenço, cientista da Universidade do Minho e Henrique Leitão, físico e historiador da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, foram distinguidos esta quinta-feira com duas bolsas milionárias pelo Conselho Europeu de Investigação (ERC). Paulo Lourenço, cientista e professor catedrático do Departamento de Engenharia Civil da Escola de Engenharia da Universidade do Minho, co-director do Instituto para a Sustentabilidade e Inovação em Engenharia de Estruturas (Isise) e do Instituto para a Bio-Sustentabilidade (IB-S), vai receber três milhões de euros para desenvolver nos próximos cinco anos uma nova abordagem para a avaliação da segurança do património cultural quando submetido a sismos. Já o projecto de Henrique Leitão ganhou dois milhões de euros para o estudo, nos próximos cinco anos, de rotas de navegação náuticas portuguesas e espanholas dos séculos XVI e XVII e que levaram à constituição de um conceito global para o planeta Terra. 

“Os roteiros náuticos são documentos muito importantes que já foram estudados por alguns historiadores, mas apenas do ponto de vista da navegação. O que nós pretendemos agora é estudá-los do ponto de vista da história da ciência, uma vez que estes roteiros são também documentos técnicos usados para fazer as viagens oceânicas. Estes são os primeiros documentos europeus (e possivelmente de todo o mundo) que dão informação natural à escala do mundo inteiro”, explica Henrique Leitão.

Com os dois milhões de euros da bolsa, o historiador vai formar uma equipa que investigará todos os arquivos onde existem esses documentos e que não estão ainda referenciados. O trabalho do grupo passará por identificar e depois analisar a forma como alguns conceitos modernos da ciência têm origem nesses documentos antigos. Exemplo disso é o ciclo estável dos ventos, as correntes oceânicas e o magnetismo da terra. “É importante para percebermos o caminho histórico que levou até formarmos ideias globais da terra como as que temos hoje”, refere ao PÚBLICO Henrique Leitão.

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O investigador Henrique Leitão Nuno Ferreira Santos

Sobre o seu projecto, Paulo Lourenço explica que apesar de ser particularmente difícil entender como os sismos afectam as construções antigas, existe uma necessidade de acabar com o problema no país. “Portugal, como sabemos é uma zona com risco sísmico, o último sismo grande foi o de 1969. O terramoto de 1755 toda a gente conhece”, lembra. 

“O que nós pretendemos fazer é contribuir para a avaliação da segurança do património de valor cultural, monumentos, construções históricas, entre outras, quando submetidos à acção dos sismos. O projecto vai incluir uma abordagem inovadora com uma componente experimental, analítica e numérica muito forte e que, ao mesmo tempo, associa a caracterização da acção dos sismos juntamente com a própria resposta do edifício”, explica o cientista ao PÚBLICO.

Segundo um comunicado da Universidade do Minho, o projecto vai recorrer a “um extenso programa de ensaios em mesa sísmica, ferramentas numéricas e analíticas integradas para avaliação da segurança e nova regulamentação para salvaguardar os edifícios históricos, em termos de colapso e limitação do dano”. 

Já Paulo Lourenço acredita que o mais importante será a protecção da vida e dos bens pessoais. “O património cultural é parte da nossa identidade e é algo que nos identifica como parte de uma determinada comunidade ou de um país. Os edifícios são certamente importantes para as pessoas e metade deles não foram pensados para resistir aos sismos”. 

O projecto pode revelar-se importante para preservar não só o património imóvel com também o móvel, desde pinturas, livros, esculturas, tudo o que esteja dentro dos edifícios. Está ainda previsto instalar um equipamento que serve especialmente para determinar a acção de um sismo no IB-S. Até aqui só o Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC), em Lisboa, tinha um equipamento idêntico.

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Um ensaio à escala real numa construção no Instituto para a Bio-Sustentabilidade Universidade do Minho

O selo da ERC

As bolsas científicas ERC, diz o comunicado da Universidade do Minho, são das mais prestigiadas e competitivas da Europa e financiam projectos individuais cuja selecção é fundamentada, em parte no currículo do investigador e também na excelência do plano a executar.

Paulo Lourenço afirma que um reconhecimento na área científica com o selo da ERC tem um “enorme valor” a nível nacional e internacional. “Qualquer projecto do Conselho Europeu de Investigação (ERC) pretende resolver um problema novo e para o qual não existia uma solução. Traz sempre uma abordagem inovadora ou não seria financiado. O que nós vamos fazer é criar um grupo dedicado a esta área que daqui a cinco anos pode apresentar resultados verdadeiramente inovadores”, explica o cientista.

 A bolsa irá contribuir também para a resolução de um problema social, ligado à agenda 2030 das Nações Unidas para cidades seguras, resilientes e sustentáveis, e para preservar a identidade da população através da conservação do património histórico.

Sobre a instituição onde lecciona, Paulo Lourenço destaca ainda a ligação entre a ciência e a engenharia que permite também atrair estudantes internacionais para a Universidade do Minho. “O grupo que coordeno, na área dos monumentos e construções antigas, é o maior nesta área do conhecimento, com atracção continuada de alunos estrangeiros e uma rede internacional ampla. Mas talvez o que mais nos orgulha é a quantidade e qualidade dos nossos alumni, presentes em instituições do ensino de referência, como o MIT (EUA), a Universidade Técnica de Delft (Holanda) ou o Instituto Federal de Tecnologia de Zurique (Suíça)”, refere.

O Instituto para a Sustentabilidade e Inovação em Engenharia de Estruturas (Isise), departamento que Paulo Lourenço coordena, está também envolvido no mestrado europeu em Monumentos e Construções Históricas que já recebeu 400 alunos de 70 países em 12 anos. “A capacidade que temos para atrair alunos das melhores universidades do país e do mundo (como Princeton, Columbia, Berkeley, Califórnia em Los Angeles ou Texas em Austin, nos EUA) para este cantinho da Europa é extraordinária”, realça o cientista.

O Isise está também a trabalhar na consultoria técnica à Presidência da República sobre o Palácio de Belém, em fase de conclusão, no qual fazem a ligação entre a investigação e a engenharia aplicada. “A nossa actividade de transferência de conhecimento e a prestação de serviços especializados inclui sete monumentos classificados como Património Mundial da UNESCO e, além de Portugal, um enorme conjunto de países, como os EUA, Brasil, Butão, Myanmar, Índia, Reino Unido, Marrocos ou Filipinas”, diz Paulo Lourenço.

Os projectos dos 222 cientistas vencedores foram seleccionados entre 2052 projectos submetidos a esta bolsa da ERC. A Universidade do Minho já conseguiu nos diversos concursos oito bolsas do ERC, três de iniciação de carreira (StG), três de consolidação de carreira (CoG) e duas bolsas avançadas para cientistas estabelecidos (AdG).

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