GNR já recebeu 894 denúncias sobre terrenos a precisar de limpeza

Dados são os registados pela GNR desde o início do ano até ontem e compete agora às câmaras actuar. Mas os autarcas alertam para dificuldades e dizem que poderá ser uma “missão impossível”.

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ADRIANO MIRANDA

Desde o início do ano, a GNR já recebeu, através da Linha SOS Ambiente, 894 denúncias sobre situações de terrenos que necessitam de ser limpos e que podem representar um perigo público. Os dados foram fornecidos ontem ao PÚBLICO por fonte oficial, que precisou, contudo, que os autos de contra-ordenação só começarão a ser passados na segunda-feira, dia 1 de Abril.

O prazo para os proprietários limparem os seus terrenos terminou a 15 de Março, estando agora essa responsabilidade nas mãos das câmaras municipais. A GNR, por seu lado, encontra-se neste momento a fazer “o levantamento e a sinalização dos locais que carecem de gestão de combustível” e a fazer também acções de pedagogia junto das populações para explicar as medidas preventivas que devem tomar. Desde o início do ano, houve também 187 contra-ordenações devido a queimas e queimadas feitas sem licença.

Os vários autarcas ouvidos ontem pelo PÚBLICO alertam para as dificuldades em cumprir a tarefa de garantir a limpeza de todos os terrenos (os municipais e os de privados que não o fazem) que deve estar concluída até 31 de Maio. Quais os problemas? Fundamentalmente, apontam a falta de verbas financeiras (aumentos de preços das empresas que limpam terrenos e a dificuldade de muitos proprietários em ressarcir a câmara dos trabalhos feitos no caso de limpezas coercivas) e a falta de meios humanos.

“É uma missão impossível”, resume o presidente da Câmara de Viseu, Almeida Henriques (PSD). Este autarca adquiriu tractores e outros meios para 17 freguesias (um investimento de 700 mil euros) em vez de ficar dependente de serviços externos ("É mais barato internalizar"). Criou ainda ecopontos florestais para os donos de terras deixarem o combustível florestal.

"Preços aumentam 20%"

O presidente da Câmara de Gaia, Eduardo Vítor Rodrigues (PS), explica que “de aviso público para aviso público os preços dos fornecedores aumentam 20%”. A câmara vai lançar agora uma consulta prévia para um ajuste de 350 mil euros para operações de limpeza. O socialista, que recorreu à linha de crédito disponibilizada pelo Governo, fala mesmo “em défice orçamental” e lembra os casos em que, por dificuldades de partilhas ou penhoras, os proprietários nunca pagam à autarquia o valor da limpeza que deviam ter feito. Noutros casos, a identificação cadastral não está actualizada e nem sequer se conhecem os donos. “Não podemos ter uma perspectiva persecutória”, salienta Almeida Henriques, a pensar sobretudo nas pessoas mais idosas ou com poucos meios.

“Estão a transferir responsabilidades para as autarquias que deviam caber ao Estado central”, alerta, por seu lado, o presidente da Câmara de Braga, Ricardo Rio (PSD).

António Louro, vereador na Câmara de Mação e presidente de uma associação de produtores florestais, a Fórum Florestal, defende a existência de sociedades de gestão dos terrenos e aplaude a posição assumida recentemente pelo presidente da Agência para a Gestão Integrada dos Fogos Rurais, Tiago Oliveira, que, em entrevista ao PÚBLICO/Renascença, defendeu que se não gerir o terreno, o proprietário “tem de o vender”. “Em minifúndios, só resulta uma gestão conjunta e para isso é preciso apoio financeiro para viabilizar o arranque deste processo”, argumenta, lembrando ainda que os apoios de Bruxelas são “muito sectoriais” e não permitem apoiar projectos para mudança de paisagem que integrem diferentes produções florestais e animais em simultâneo.

Da parte dos autarcas, “há uma enorme preocupação”, explica António Louro, acrescentando que se trata de “áreas muito grandes” e “a capacidade dos municípios esgota-se na sua área de intervenção [terrenos municipais], nas faixas das estradas municipais e nas zonas industriais”, sem contar com o papel que agora lhes cabe na limpeza de terrenos dos privados. “Não é fácil cumprir a legislação”, diz. “Se me pergunta se vou conseguir resolver os problemas todos, não vou, nem conseguirei”, resume Eduardo Vítor Rodrigues.

Em dois pontos, contudo, todos os autarcas estão de acordo. Depois dos grandes incêndios de 2017, as pessoas estão mais sensibilizadas para cumprir as obrigações de limpeza de terrenos e acessos e, por causa da meteorologia, os terrenos nesta altura do ano têm vegetação menos densa do que em 2018. Uma das explicações que avançam é a falta de chuva em comparação com o Inverno passado. Mas se chover nas próximas semanas tudo pode mudar de repente.

Ontem, em declarações à TSF, Xavier Viegas, responsável pelo Centro de Estudos de Fogos Florestais da Universidade de Coimbra, alertava para a necessidade de poder ser necessária uma nova limpeza ainda antes do Verão.

"Trabalhar mais com as pessoas"

“Não faz sentido fixar a data 15 de Março ou 15 de Maio. A natureza não conhece essas datas. Temos de estar atentos e disponíveis para a possibilidade de haver fenómenos naturais, climáticos que levem a atrasar ou adiantar esses trabalhos”, defendeu.

Por outro lado, considera que “a maior praga que o nosso país tem é o grande número de ocorrências em dias em que não devia haver fogos”.

“É preciso trabalhar mais com as pessoas e com as comunidades, levar a que tenham uma maior sensibilidade e evitem fazer uso do fogo em dias de risco elevado”, aconselha. 

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