Governo afrontará Presidente na Lei de Bases da Saúde

Se Marcelo vetar a nova Lei de Bases da Saúde, porque o PSD fica de fora da sua aprovação, pela primeira vez o PS irá avançar com a reconfirmação parlamentar, sem alterações.

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O primeiro-ministro, António Costa, não deverá ceder ao Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, na Lei de Bases da Saúde Nuno Ferreira Santos

A nova Lei de Bases da Saúde poderá vir a estar na origem do primeiro grande braço-de-ferro entre o Governo e o Presidente da República. O primeiro-ministro e líder do PS, António Costa, está decidido a negociar e aprovar o diploma com os parceiros de aliança parlamentar, o BE e o PCP. E se Marcelo Rebelo de Sousa vier a vetar a lei por ela não ser negociada com o PSD, o PS avançará para a sua reconfirmação parlamentar nos mesmos exactos termos em que ficar aprovada, soube o PÚBLICO. Conclusão: o Presidente da República será então constitucionalmente obrigado a promulgar a lei e sofrerá uma derrota política.

As “negociações da nova Lei de Bases da Saúde estão a decorrer a bom ritmo com o BE e o PCP”, explicou ao PÚBLICO um membro do Governo, que garantiu que o diploma “é para ser aprovada agora, antes do final da legislatura”, com os parceiros de aliança parlamentar que suporta o executivo de António Costa.

O mesmo responsável governativo admitiu que as negociações parlamentares “possam incluir o PSD”, mas a prioridade neste assunto é a negociação à esquerda, até pelas “responsabilidades históricas” do PS na criação do Serviço Nacional de Saúde.

Mas o Governo e o grupo parlamentar do PS não vão ceder à ameaça de veto feita pelo Presidente. As declarações de Marcelo Rebelo de Sousa sobre o assunto são, aliás, vistas no Governo como uma “ameaça” que consubstancia uma “chantagem”. E o mesmo membro do Governo é peremptório: “Não vamos negociar com o PSD porque o Presidente quer. Até o podíamos fazer, mas não depois do que pode ser interpretado como uma chantagem sobre o Governo.”

Convicto de que “o Presidente da República não vetará”, o membro do Governo ouvido pelo PÚBLICO frisa que “o PS, na Assembleia da República, tem sempre alterado as leis vetadas por Marcelo Rebelo de Sousa e tem satisfeito as suas exigências”. Mas, garante, há linhas vermelhas em relação aos limites em que o Governo pode ceder para agradar ao Presidente. Assim, conclui, o mesmo responsável governativo: “Se ele vetar por causa do PSD, a Assembleia reconfirmará o diploma e isso será a derrota política do Presidente.”

O membro do Governo assume que os socialistas têm “consciência” de que a iminência deste braço-de-ferro pode prenunciar um arrefecimento do bom relacionamento institucional que existe desde o início de funções entre o primeiro-ministro e o Presidente. E no PS há quem lembre que foi por causa da reconfirmação parlamentar do Estatuto político-administrativo dos Açores, vetado por Cavaco Silva no Verão de 2008, que se iniciou a tensão entre o então Presidente e o antigo primeiro-ministro socialista José Sócrates.

Recorde-se que, no final de Janeiro, o PÚBLICO noticiou que o Presidente da República vetaria a Lei de Bases da Saúde, se esta fosse aprovada apenas pelos partidos da esquerda parlamentar. As informações então recolhidas pelo PÚBLICO seguiram-se à entrevista dada por Marcelo Rebelo de Sousa à Lusa, na qual afirmava que rejeitaria uma Lei de Bases da Saúde que fosse “fixista” e representasse “o triunfo de uma conjuntura”. Defendendo que a saúde é um sector em que deve existir “uma lei de regime”, o Presidente sustentou que neste domínio não pode haver “grande clivagem entre PS e PSD”, dado que não é uma lei que se esteja sempre a mudar, pois tal “não é compatível com investimentos a médio e longo prazo na saúde”.

Logo a seguir, o líder parlamentar e presidente do PS, Carlos César, no final de uma reunião da bancada, abriu a porta a que o PS reconfirme a Lei de Bases da Saúde, caso o Presidente a vete, apenas porque não foi negociada com o PSD: “Se o Presidente da República vetar a lei de bases que for aprovada, avaliaremos as razões pelas quais o faz. Evidentemente que a qualidade daqueles que votaram a favor não é nunca, nem pode ser, razão para mudarmos de opinião.” Uma reaprovação da Lei de Bases da Saúde afrontará o Presidente, mas já está decidida pelo primeiro-ministro.

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