Franklim, um traficante habituado a dar a volta à Justiça

Franklim Pereira Lobo, conhecido como “um dos maiores traficantes europeus de cocaína”, foi detido há dias pelas autoridades espanholas em Málaga. Quase por acaso. Era procurado há três anos pela Justiça portuguesa que emitira um mandado de detenção europeu.

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Franklim Pereira Lobo no Tribunal da Boa-Hora, em 2007 Mariline Alves/Correio da Manhã

Embaraçou a Polícia Judiciária ao saltar de um primeiro andar de um hotel, enquanto estava à guarda de dois inspectores daquela instituição, a escassos metros da sede da unidade de combate ao narcotráfico, em Lisboa. A fuga não impediu que fosse condenado a 25 anos de prisão no ano seguinte, estávamos em 2000, e recapturado em Abril de 2004 em Málaga, Espanha. Foi nesta mesma região, onde chegou a residir, que foi recapturado quase 15 anos depois pelas autoridades espanholas. O processo tem um número diferente, mas os crimes mantêm-se inalterados: associação criminosa e tráfico de droga.

Falámos de Franklim Pereira Lobo, de 63 anos, natural de Vermelha, no Cadaval, conhecido como “um dos maiores traficantes europeus de cocaína”. Ao que o PÚBLICO apurou a detenção, ocorrida no âmbito de um mandado europeu emitido há perto de três anos no âmbito da chamada Operação Aquiles, foi uma mera casualidade. Após uma altercação, o suspeito foi identificado pela polícia espanhola, que terá então verificado que o sexagenário tinha pendente um mandado de captura.

Mas a detenção pode significar pouco para um criminoso habituado a dar volta à Justiça. Exemplo disso foi a libertação, em Outubro de 2004, concedida por ordem de um juiz do Supremo no âmbito de um habeas corpus, por um colega da primeira instância não ter cumprido todos os formalismos legais da detenção. Franklim aproveita para “fugir” para o Brasil, onde foi apanhado em Março de 2005.

Após inúmeros recursos, em Abril do ano seguinte, o Supremo brasileiro concorda com o pedido de extradição e envia o suspeito para Portugal. Mas nessa altura, já a defesa do alegado traficante tinha conseguido anular a condenação à pena máxima por uma deficiência na sua notificação. É preso, mas por pouco tempo. Em Junho de 2007, vê o colectivo de juízes que repetiu o julgamento absolvê-lo. O tribunal recusou validar as escutas telefónicas que anteriormente justificaram a aplicação da pena máxima e considerou frágeis os depoimentos das testemunhas.

Nessa altura estava presa em Espanha a sua filha, suspeita de branqueamento de capitais. O dinheiro do narcotráfico, alegavam as autoridades espanholas, terá permitido à família Lobo criar um império imobiliário em Espanha. Em Mijas, próximo de Málaga, a sua filha, um contabilista português e um advogado espanhol, geriam um aldeamento turístico de luxo com 132 apartamentos e então avaliado em mais de 42 milhões de euros, como escrevia o PÚBLICO em 2007. 

Menos de dois anos após a sua absolvição, em Março de 2009, Franklim volta à cadeia, desta vez na companhia de um dos filhos. É novamente suspeito, desta feita, de traficar haxixe, liderando um grupo que enfrentaria igualmente a acusação de associação criminosa. Sobre o desfecho deste caso, o PÚBLICO não encontrou rasto.

A Operação Aquiles

E o nome de Franklim só volta à ribalta em Abril de 2016, quando a Polícia Judiciária e o Departamento Central de Investigação e Acção Penal lançam a chamada Operação Aquiles, que levou à detenção de dois elementos da própria Judiciária, um reformado e outro então no activo, ambos ligados ao combate ao tráfico de droga, acusados de corrupção e tráfico de droga. A acusação é assinada um ano mais tarde e do rol de 29 acusados figuram Franklim e o filho Francisco, hoje com 43 anos, que está a ser julgado no âmbito deste caso.

Os arguidos, diz o Ministério Público na acusação, “fazem parte integrante da organização de narcotráfico liderada pelo arguido Franklim Lobo, cada um com a sua função específica, assim tendo contribuído, em conjunto e de forma reiterada e permanente, pelo menos desde inícios do ano de 2014, para o sucesso das importações de produtos estupefacientes organizadas pela organização a que pertenciam, designadamente com origem na América do Sul, para distribuição e comercialização territorialmente alargada por Portugal, Espanha e outros países europeus”.

A acusação imputa à rede criminosa liderada por Franklim pelo menos quatro operações de importação de droga a mais relevante das quais o envio, por via marítima, de 82 quilos de cocaína com origem no Brasil. A droga vinha acondicionada em três sacos de viagem dissimulados no interior de um contentor que viajou num navio carregado em São Paulo e que tinha como destino final a Grécia. A cocaína foi apreendida em Dezembro de 2015, no Porto de Sines, em Portugal, onde o navio tinha uma escala. A descoberta só foi possível porque a PJ vigiava de perto alguns alegados colaboradores de Franklim e revistara uma das arguidas do caso no regresso de uma viagem ao Brasil. A inspecção permitiu detectar um documento com as referências do contentor e do navio onde a droga seguia.

Um outro episódio, envolvendo uma quantidade de cocaína que podia chegar aos 20 quilos, é referido na acusação. Os inspectores encontraram vários indícios, incluindo fotografias, vídeos e conversas telefónicas, que dão conta da chegada da droga dissimulada na estrutura de uma aeronave que aterrou no Aeroporto de Lisboa. Os investigadores acompanharam em directo o desespero de Franklim que não conseguia que os seus colaboradores no interior do aeroporto encontrassem a droga, que terá acabado por não ser desembarcada. À chegada a Portugal, Franklim espera-lhe a cadeia e um julgamento autónomo, já que o seu caso foi separado do dos outros arguidos. Será desta que a Justiça lhe dará a volta?

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