Reserva de São Jacinto completou 40 anos mas tem poucos motivos para festejar

Área protegida situada no litoral de Aveiro já viveu melhores dias. A ameaça das espécies invasoras é cada vez maior e o número de visitantes tem vindo a cair a pique.

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NELSON GARRIDO / PUBLICO

O biólogo Nuno Gomes Oliveira recorda com exactidão o momento da criação da Reserva Natural das Dunas de São Jacinto e, talvez ainda mais importante do que isso, todas as movimentações e trabalhos prévios que estiveram na génese dessa constituição. O decreto-lei que oficializou a criação da área protegida aveirense foi publicado a 6 de Março de 1979, mas, contrariamente ao que seria de esperar, a passagem do 40.º aniversário não dá azo a grandes festejos. Muito pelo contrário: a reserva acusa vários sinais de abandono, a ameaça das plantas invasoras (acácias) é cada vez maior e o número de visitantes sofreu uma queda abrupta.

O futuro? É a pergunta que todos levantam, ambientalistas e responsáveis políticos locais, e que tarda em ser respondida. A câmara municipal de Aveiro já manifestou interesse em assumir a gestão da reserva, mas as negociações com o ICNF (Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas) ainda não conduziram a uma decisão. Uma coisa é certa: esta área protegida de 960 hectares – parte dos quais, cerca de 200, em espaço marítimo – carece de uma decisão. Urgente.

“A conservação da natureza teve dias bons em Portugal; neste momento é um patinho feio”, repara Nuno Gomes Oliveira ao PÚBLICO. Entre esses dias bons estão os vividos antes e depois da criação da Reserva Natural das Dunas de São Jacinto, processo no qual o biólogo portuense teve um papel activo. “Tivemos uma primeira fase, em 1971, na qual chegou a ser criado um grupo de trabalho para criar a reserva”, lembra. Só depois da revolução, mais concretamente em 1979, é que foi possível oficializar a constituição da área protegida.

“E o curioso é que um dos motivos que deu origem à criação da reserva acabou por desaparecer no ano em que ela foi constituída”, recorda, aludindo a uma “colónia de garças” que importava proteger. “Nesse ano, houve exercícios militares na mata, que espantaram a colónia de garças”, acrescenta o biólogo. São Jacinto é também território de instalações militares, acolhendo uma unidade, há 101 anos, que já passou pelos três ramos das forças armadas.

Desde a criação da reserva, Nuno Gomes Oliveira jamais deixou de estar atento à área protegida aveirense. E nunca como antes esteve tão preocupado. “Está infestada com acácias, que vão destruindo a flora autóctone, e não há por ali um responsável, alguém que assuma a direcção e gestão da reserva”, nota o também fundador do Parque Biológico de Gaia. Neste momento, a área protegida aveirense está sob a alçada do Departamento de Conservação da Natureza e Florestas do Centro (do ICNF), sediado em Viseu, que não obstante as várias tentativas do PÚBLICO não esteve disponível para prestar quaisquer esclarecimentos sobre a situação actual da reserva.

Câmara seria melhor gestora que o ICNF

Preocupado com o presente e o futuro da área protegida plantada entre o mar e a ria está também Ribau Esteves, presidente da câmara de Aveiro. “Está nos mínimos, tem cada vez menos funcionários e o número de visitantes diminuiu imenso”, relata o autarca, especificando: “passámos de 14.000 para 3.000 visitantes por ano”.

Ribau Esteves já tinha demonstrado o interesse da câmara de Aveiro em assumir a gestão da reserva – ao abrigo da transferência de competências -, mas o processo negocial ainda decorre. “Temos estado à mesa, mas há essa questão mais delicada da partilha de custos”, revela o edil, que não tem quaisquer dúvidas de que “a câmara seria muito melhor gestora da reserva do que o ICNF”.

O presidente da autarquia dá como exemplo o caso do Museu de Aveiro, cuja gestão passou para as mãos do município e “o processo está a correr bem”, evidencia. Resta, agora, ver qual o desfecho do processo relativo à reserva que, pelo menos, vive a esperança de passar a contar, este ano, com um novo centro de interpretação e um auditório ao ar livre. Uma obra a cargo do programa Polis Litoral Ria de Aveiro e que representa um investimento de cerca de 760 mil euros.

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