Tomás Correia foi recebido pelo Governo dias antes de ser condenado

O presidente da Associação Mutualista Montepio Geral tem de pagar uma multa de 1,25 milhões por irregularidades à frente do banco. E fica impedido de voltar ao sector financeiro.

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Miguel Manso

O presidente da maior mutualista do país (AMMG), dona do Banco Montepio, foi condenado pelo Banco de Portugal (BdP) ao pagamento de uma multa de 1,25 milhões de euros por práticas que o supervisor da banca considerou de tal modo graves que põem em causa a sua idoneidade. A decisão foi-lhe comunicada na quinta-feira, dia 21 de Fevereiro, alguns dias depois de Tomás Correia ter sido recebido pelo primeiro-ministro, António Costa, e pelo ministro da Segurança Social, Vieira da Silva, que tutela a AMMG. Apesar da condenação, a presidência da mutualista não está em causa, segundo o regulador dos seguros, José Almaça.

Tomás Correia foi multado em 1,25 milhões de euros pelo Banco de Portugal (BdP) por irregularidades graves realizadas quando exercia o cargo do presidente da Caixa Económica (entre 2008 e 2015), agora designado Banco Montepio. O PÚBLICO apurou ainda que a instituição financeira, chefiada entre 2008 e 2015 por Tomás Correia, foi também multada em 3,5 milhões de euros.

No início do mês, o líder da Associação Mutualista – reeleito no final do ano passado para novo mandato – pediu uma reunião com António Costa, que o recebeu acompanhado de Vieira da Silva. A mutualista está na esfera de autoridade do Ministério da Segurança Social e passou, depois da recente alteração legislativa, a ser regulada pelo supervisor dos seguros, a Autoridade de Seguros e Fundos de Pensões (ASF), cujo presidente rejeitou esta sexta-feira, à Lusa, poderes para avaliar a idoneidade de Tomás Correia.

Para José Almaça, “o assunto da idoneidade não tem que ver com a ASF no período transitório”, de 12 anos. O responsável pelo regulador dos seguros explicou que só após o período de convergência da mutualista com o sector segurador é que caberá à ASF essa competência. “Não temos de nos pronunciar sobre essa matéria, o trabalho da ASF neste momento é verificar se convergem para o regime segurador. Só depois de convergirem passarão para a nossa supervisão”, afirmou Almaça.

Ainda assim, segundo apurou o PÚBLICO, a simples condenação impede que Tomás Correia exerça qualquer função no sector financeiro. Isto, de acordo com o que está previsto no Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, em especial no artigo 30º, que impede a atribuição da idoneidade pelo Banco de Portugal – e respectiva luz verde ao exercício da profissão na banca – quando o visado foi alvo de uma “acusação ou a condenação, em Portugal ou no estrangeiro, por infracções das normas que regem a actividade das instituições de crédito, das sociedades financeiras e das sociedades gestoras de fundos de pensões, bem como das normas que regem o mercado de valores mobiliários e a actividade seguradora ou resseguradora, incluindo a mediação de seguros ou resseguros”,

Tomás Correia vai recorrer da contra-ordenação do Banco de Portugal, disse à Lusa fonte ligada ao gestor, considerando que as contra-ordenações “não inibem a actividade profissional”. O gestor tem 15 dias para recorrer para o Tribunal de Santarém. Em Janeiro, quando tomou posse para um novo mandato como presidente da mutualista, Tomás Correia disse aos jornalistas que não acreditava numa condenação do Banco de Portugal, no âmbito do processo agora concluído, e sobre a avaliação da sua idoneidade afirmou que essa cabe à assembleia-geral da mutualista e não ao regulador dos seguros, apesar das alterações feitas no ano passado ao Código das Associações Mutualistas.

“Não estou preocupado, não estamos preocupados com isso. Não há nenhum [feedback do regulador dos seguros sobre essa matéria] e temos a certeza de que não teremos”, disse aos jornalistas.

Quais são os crimes?

No âmbito da supervisão do BdP, foram ainda condenados mais sete administradores executivos das equipas de Tomás Correia, mas com coimas menores. Neste grupo estão, por exemplo, José Almeida Serra, Álvaro Dâmaso (antigo presidente da Bolsa de Lisboa), Eduardo Farinha, Rui Amaral, Paulo Magalhães, Jorge Barros Luís e Pedro Ribeiro.

Entre os crimes de que o BdP acusa as equipas de Tomás Correia estão, entre outras práticas, a quebra das regras de controlo interno e o não respeito pelas normativas definidas nos regulamentos, que justificaram a concessão de crédito de financiamentos de elevado montante a alguns clientes, nomeadamente a Paulo Guilherme e a José Guilherme, próximos de Tomás Correia. Paulo e José Guilherme eram clientes da instituição em Portugal e em Angola. Recorde-se que José Guilherme deu um presente" a Salgado de mais de 14 milhões de euros.

A decisão do BdP foi dada a conhecer aos visados esta quinta-feira e é o culminar de uma acção que começou no Verão de 2014 com a auditoria forense à Caixa Económica Montepio Geral. Para além das multas, o BdP decretou a inibição de actividade no sector financeiro dos ex-membros da equipa de Tomás Correia.

Carlos Tavares sai antes das contas

No banco detido pela mutualista, o antigo presidente da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), Carlos Tavares passou a presidência executiva da instituição no passado dia 12 de Fevereiro, assumindo a função de chairman, poucas semanas antes de o Banco Montepio apresentar resultados de 2018 que vão ficar abaixo dos lucros de 30 milhões de euros registados em 2017, segundo apurou o PÚBLICO. A Caixa Económica, agora liderada por Dulce Mota, vai divulgar as suas contas com uma degradação do resultado líquido, que no final do primeiro semestre havia atingido um valor positivo de 16 milhões.

Nas contas do último exercício destaca-se o contributo do Finibanco Angola, que terá contribuído com um resultado em torno dos 30 milhões de dólares, um desempenho que segurou as contas do banco e mais que compensou a performance negativa em Portugal. Refira-se que a supervisão tem vindo a pressionar no sentido de o Montepio se desfazer da participação que tem no Finibanco Angola, no âmbito das recomendações do Banco Central Europeu de limitar a exposição dos bancos europeus ao sector financeiro angolano. Com P.F.E.

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