A ilha da Berlenga tem um novo habitante: um roque-de-castro

É a primeira vez desde que há registos que nasce uma cria desta ave marinha ameaçada na ilha da Berlenga. Em Portugal existirão entre cinco e seis mil casais desta espécie.

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Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA)

Refugia-se em ilhéus e ilhas pequenas para estar a salvo de ratos, ratazanas e outros predadores, e agora a ilha da Berlenga é também um porto seguro para os roque-de-castro (Hydrobates castro), uma das mais pequenas aves marinhas portuguesas.

Entre o final de Dezembro e o início de Janeiro, nasceu uma cria destas pequenas aves escuras, que se distinguem por ter uma faixa branca no dorso, sendo o primeiro exemplar da espécie ameaçada nesta ilha ao largo de Peniche

Além dos Açores e da Madeira, já se sabia da existência de ninhos da ave nos Farilhões — um grupo de pequenos ilhéus no arquipélago das Berlengas —, mas não havia qualquer registo do nascimento de um roque-de-castro na ilha da Berlenga​.

Como os ilhéus do Farilhão são inóspitos e de difícil acesso, não é fácil conhecer em detalhe a população de roque-de-castro que ali faz ninho, explica Joana Andrade, coordenadora do Life Berlengas. 

Este projecto, que é coordenado pela Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA), arrancou há quase cinco anos para restaurar o ecossistema destas ilhas, trabalhando no problema das espécies invasoras. 

Esta ave não tinha, até agora, condições para nidificar na ilha da Berlenga devido às constantes pragas de ratos e ratazanas. "À semelhança do que tem acontecido noutras ilhas por todo o mundo, quando retiramos os ratos que são predadores desta espécie, estamos a criar condições para que [estas aves] possam alargar o seu habitat de nidificação", explica Joana Andrade. 

Para atrair roques-de-castro, a equipa do Life Berlengas explica que usou gravações de chamamentos desta espécie e construiu ninhos artificiais — estruturas que imitam as cavidades onde normalmente nidificariam. Em terra, esta ave procura fendas nas rochas em ilhas desertas para se manter a salvo dos predadores. O último rato foi avistado há mais de dois anos, por isso a equipa está segura de que terão sido removidos na totalidade.

O nascimento desta cria não apanhou os investigadores de surpresa, uma vez que estavam a monitorizar um casal de aves que tinha feito ninho na Berlenga. Em Novembro, já tinham dado conta que uma fêmea pusera um ovo. A 15 de Janeiro confirmaram que tinha nascido. 

Agora que a espécie começou a reproduzir-se na Berlenga, será mais fácil para os investigadores compreender melhor a sua ecologia e a sua distribuição no mar, diz a bióloga.

Na ilha, a equipa continua a restaurar a vegetação nativa e a acompanhar as aves marinhas. Ao mesmo tempo, a SPEA está a colaborar com pescadores da região para evitar que aves como o roque-de-castro morram presas em aparelhos de pesca, e com operadores turísticos para garantir que os milhares de pessoas que visitam a Berlenga todos os anos tenham os cuidados necessários de modo a prevenir o regresso de predadores como ratos.

Viagem às Caraíbas

O roque-de-castro distribui-se pelos oceanos Atlântico e Pacífico. Como estas aves se mantêm afastadas da costa, não é fácil precisar quantos exemplares da espécie existirão em Portugal. Joana Andrade diz que andará à volta dos cinco, seis mil casais. Nas Berlengas, a população aproximada é entre 400 e 800 casais nidificantes. Como estas aves nidificam no Inverno no Farilhão Grande, cujo acesso é difícil, ainda mais por causa da agitação do mar, não é fácil ter números mais concretos. Estes resultam das estimativas que a equipa faz com a colocação de redes de anilhagem e com o número de capturas que consegue. 

A equipa do Life Berlengas conseguiu ainda recuperar dois dispositivos que tinham colocado nestas aves e perceberam os seus percursos migratórios durante um ano. Estão em terra durante o Inverno, quando se reproduzem, e em Fevereiro, Março vão embora. A informação recolhida pelos investigadores indica que foram passar o Verão às Caraíbas. 

O projecto Life Berlengas, que estava previsto terminar em Setembro e foi prolongado até Junho de 2019. Coordenado pela SPEA, o projecto tem como parceiros o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), a Câmara Municipal de Peniche, a Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa e a Escola Superior de Tecnologia e do Mar do Instituto Politécnico de Leiria.

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