A nossa relação com os dispositivos vista à lupa

Um livro que tenta ligar as mudanças que cada um quer fazer nas suas vidas com os seus dispositivos e as novas tecnologias.

Foto
Margaret E. Morris numa Ted Talk DR

“Como pode um telemóvel ser um psiquiatra?” Foi esta a pergunta que motivou a investigação que a psicóloga clínica norte-americana Margaret E. Morris fez em 2006, quando trabalhou na empresa de tecnologia Intel, onde investigou como se pode promover a intimidade e a saúde através das novas tecnologias. Com a ajuda de colegas da universidade de Columbia criaram o Mood Phone, uma aplicação que foi desenhada para servir como “agente terapêutico pessoal”, com a qual o doente pode interagir no seu dia-a-dia, quando está longe do consultório do psiquiatra.

Um ano antes, Margaret Morris tinha contactado a professora Sherry Turkle — autora de A Vida no Ecrã (Relógio d'Água), de O Segundo Eu (Presença) ou mais recentemente de Alone Together: Why We Expect More From Technology And Less From Each Other (onde defende que quanto mais conectados estamos, mais distantes ficamos) — porque soube que ela estava a analisar o robô terapêutico Paro. Este robô, que parece uma foca bebé, foi criado por Takanori Shibata e faz sons, mexe-se e reage quando é tocado, além de mostrar empatia, com o objectivo de fazer companhia aos mais velhos.

Foto

Mas o robô não percebia nada do que lhe diziam e Turkle questionava se “fingir empatia” serviria para ajudar alguém. Quando viu uma idosa a quem tinha morrido o filho partilhar essa história com Paro, que lhe respondeu com um “triste” rolar de cabeça acompanhado de som e ela sentiu-se compreendida, Sherry ficou angustiada. Seria isto o “novo normal”? E quando Margaret e Sherry começaram a falar sobre estas coisas, as duas chegaram à conclusão de que, provavelmente, não estariam em campos opostos e partiram para perguntas como: “Haverá exemplos na minha investigação que mostram que os robôs ajudaram a iniciar um diálogo?” De alguma forma facilitaram as relações humanas?

As conversas entre as duas inspiraram o livro Left to Our Own Devices: Outsmarting Smart Technology to Reclaim Our Relationships, Health, and Focus, que Margaret Morris publicou no final do ano passado na The MIT Press com prefácio de Sherry Turkle. “Passei grande parte das últimas duas décadas a falar com pessoas sobre o que elas querem mudar nas suas vidas e como isso se liga aos seus dispositivos. Procurei pontos brilhantes, onde as pessoas conseguiram encontrar formas de usar a tecnologia de uma maneira construtiva, muitas vezes naquilo que a que chamei ‘off-label uses’, utilização das tecnologias e de dispositivos para fins diferentes daquelas para que o criador os tinha pensado”, explica Margaret E. Morris no seu livro. Nele conta várias histórias, mostra como uma mulher se convenceu a comer alimentos mais saudáveis quando percebeu que as suas fotografias de saladas nas redes sociais conseguiam mais “likes”; ou como com a ajuda da realidade aumentada uma mulher mudou a forma como se via a si própria e ao cancro; ou a história de uma mulher trans que foi celebrando o seu processo de transição com selfies.

Sugerir correcção
Comentar