Fundo abutre acompanha gestão de Mexia nas críticas à OPA

O preço da OPA é baixo e os remédios que possam ser impostos pelos reguladores retirarão à EDP os activos mais valiosos.

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António Mexia e Lei Mingshan, líder da China Three Gorges, assinaram um protocolo de cooperação aquando da visita do presidente chinês a Portugal, em Dezembro rui gaudencio

O investidor Paul Elliott Singer já pôs as cartas na mesa sobre o futuro que deseja para a EDP. Ontem a Elliott Advisors, que presta assessoria aos fundos que, no conjunto, detêm 2,9% no capital da EDP, comunicou ao mercado, num site criado para o efeito (www.empower-edp.com) qual deve ser o caminho da eléctrica para atingir “um futuro brilhante”.

As baterias da Elliott – que já ganhou a fama de fundo abutre porque investe tradicionalmente em empresas ou entidades em dificuldades para rentabilizar o risco do investimento – são todas apontadas contra a Oferta Pública de Aquisição (OPA) que a China Three Gorges (CTG) anunciou em Maio com o objectivo de assegurar o controlo da empresa liderada por António Mexia. E as críticas acompanham as reservas que a própria equipa de gestão da EDP emitiu sobre a operação, no relatório de 8 de Junho, depois de analisar o projecto de prospecto.

Tal como a gestão, também a Elliott considera que o preço oferecido na OPA (3,26 euros por acção) é baixo e sub-avalia a empresa; tal como a gestão, também a Elliott considera que os riscos regulatórios que impendem sobre a EDP com esta tentativa de tomada de controlo chinesa podem resultar numa alteração profunda da empresa. Seja por limitarem a sua capacidade de crescimento (com a mais que provável obrigação de vender os activos mais rentáveis, nos Estados Unidos), seja por aumentarem a sua exposição a mercados com mais risco e menores retornos, como a América Latina.

Em Junho, a administração da EDP rejeitou o preço e pediu à CTG mais informação sobre os seus planos, para “estar em condições de formar uma opinião mais fundamentada sobre a qualidade do projecto”, considerando que há “incertezas em relação à implementação das intenções” da CTG e do “potencial impacto na EDP”. Mas a Elliott, que entrou em Outubro no capital (pouco depois da saída do Capital Group), já não tem dúvidas: a OPA “conduzirá a um enfraquecimento da EDP”.

É isso que a entidade defende, numa carta que foi enviada ao presidente do Conselho Geral e de Supervisão da EDP, o ex-ministro Luís Amado. Neste órgão em que estão representados os principais accionistas da EDP, a CTG (a maior investidora, com 23,27% do capital da eléctrica, embora o Estado chinês detenha um total de 28,25%) tem cinco representantes.

“A maior fonte de incerteza” que a empresa enfrenta é a OPA, diz a Elliott, que vê na EDP um conjunto de activos de alta qualidade, que estão subavaliados e que têm um “potencial de desenvolvimento substancial”. Se a oferta se concretizasse (e obrigasse, por causa da regulação, à venda dos activos de renováveis nos Estados Unidos, ou de produção eléctrica em Portugal – para que a actividade da REN como operador de rede de transporte não seja afectada), a consequência seria uma “empresa mais volátil, com um conjunto de activos menos atractivo e com poucas oportunidades de crescimento”.

Uma “avaliação realista” de uma OPA que “demonstra poucos sinais de progresso e que enfrenta obstáculos regulatórios consideráveis para a sua aprovação”, somada a uma “análise objectiva de um caminho autónomo mais promissor”, garantirá “um futuro mais brilhante à EDP”, diz a Elliot. “Acreditamos que a EDP deve ultrapassar rapidamente a Oferta e a definição de um novo rumo é urgente”, lê-se na carta.

Ao final da tarde, em comunicado, a EDP veio agradecer “a contribuição da Elliott”, prometeu “analisar cuidadosamente as suas propostas, em linha com a prática seguida com todos os (…) accionistas” e recordou que vai fazer um ponto de situação sobre a execução da estratégia no dia 12 de Março, quando apresentar os resultados de 2018.

CTG continua "a trabalhar" na OPA

Enquanto isso, a empresa chinesa, que se escusou a responder ao PÚBLICO se já notificou formalmente a operação junto das autoridades norte-americanas e da Comissão Europeia, reiterou aquela que já se tornou a sua resposta habitual: a CTG “continua a avançar com os registos regulatórios, continuando a trabalhar com uma vasta equipa de assessores em discussões com reguladores de diferentes jurisdições”. A empresa também adiantou que o calendário para obter as aprovações necessárias “está em linha com outras transacções da mesma magnitude e complexidade”.

Para a Elliott (que mesmo com uma posição accionista inferior poderá conseguir arregimentar outros accionistas para o seu lado), a EDP deve procurar um “caminho alternativo” que passa por reduzir o endividamento (a dívida líquida da EDP atingiu 14.505 milhões de euros no final de Setembro, acima dos 13.902 milhões em Dezembro de 2017), desinvestir em activos de rede e de produção térmica e reinvestir em renováveis, uma “área fundamental”.

Se no projecto chinês, um dos pilares passa por entregar à EDP activos como centrais hídricas e parques eólicos no Brasil, para a Elliott este mercado em que a EDP “fica atrás da concorrência em termos de investimento e ocupa o sétimo lugar na produção privada de energia e o nono lugar na distribuição”, é para riscar do mapa.

“Historicamente, a falta de capital suficiente limitou a capacidade da empresa de financiar totalmente as oportunidades no seu portefólio de renováveis”, refere a carta. Se a EDP reduzir dívida e encargos financeiros e conseguir dinheiro com a venda de activos (além do Brasil, deverá vender posições minoritárias nas redes de distribuição energética na Península Ibérica, bem como centrais térmicas em Portugal e Espanha), alcançará uma “maior flexibilidade financeira” para “aumentar substancialmente a capacidade de produção de energia renovável”.

Enquanto na operação chinesa se coloca o risco de as autoridades norte-americanas obrigarem à venda de activos que já representam quase 40% dos resultados da EDP, na estratégia da Elliott os Estados Unidos têm um papel central. Considerando que a empresa será capaz, com “uma alocação focada dos recursos”, de aumentar a sua capacidade de produção anualmente em cerca de 2 Gigawatt (GW), a entidade liderada por Paul Singer considera que “a referida meta é alcançável, por exemplo, utilizando cerca de 3 GW da capacidade na América do Norte, que se encontra actualmente em fase de pré-desenvolvimento”.

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