Governador defende massacre da polícia em favela do Rio de Janeiro

Jovens negros, ligados ao narcotráfico, ficaram encurralados num prédio e os seus corpos, levados pela polícia para um hospital, têm sinais de terem sido executados.

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O local onde ficaram encurrulados os jovens no morro do Fallet foi cheio de sangue Pilar Olivares/REUTERS
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A acção da polícia militar saldou-se em 13 mortos no passado sábado MARCELO SAYAO/EPA

Uma acção da Polícia Militar num complexo de favelas no centro do Rio de Janeiro que resultou em 13 mortes tem sérios indícios de fuzilamento, com disparos feitos à queima-roupa e utilização de facas pelos agentes nos corpos das vítimas no morro Fallet, afirma a Defensoria Pública do Rio de Janeiro.

O governador Wilson Witzel, que foi eleito com a promessa de uma acção policial dura roçando a ilegalidade – “A polícia vai mirar na cabecinha e… fogo”, afirmou, prometeu ter atiradores furtivos prontos a disparar contra os autores de actos criminais – viu-se obrigado a vir defender a acção de sexta-feira passada no morro Fallet-Fogueteiro, depois de a Defensoria Pública divulgar a sua investigação. “O que aconteceu foi uma acção legítima da Polícia Militar”, afirmou.

“A nossa polícia existe para defender o cidadão de bem. Não vamos admitir mais qualquer bandido usando armas de fogo de grosso calibre”, afirmou Witzel, citado pelo site UOL. A Polícia Militar afirma que agiu para intervir na guerra entre facções criminosas, “tendo como principal preocupação a preservação de vidas”.

Só que aquilo que os investigadores da Defensoria – um órgão que oferece a defesa dos direitos dos que forem considerados juridicamente pobres, um advogado público – encontraram quando foram ao morro Fallet-Fogueteiro é um retrato de extrema violência policial. Ali concentram-se as atenções, porque num só local morreram nove pessoas.

Os moradores contam que 20 pessoas suspeitas de envolvimento com o tráfico de droga fugiram da polícia para o interior de um prédio no Fallet e queriam entregar-se. A polícia diz que houve confronto e nove pessoas morreram encurraladas. Mas o UOL cita fontes dizendo que pelo menos oito cadáveres têm sinais de execução – tiros pelas costas dados à queima-roupa. Tinham entre 15 e 22 anos, e a maioria era negra.

Além disso, a mãe de um dos mortos diz que o seu filho foi morto à facada. “Enfiaram faca no meu filho, quebraram o pescoço do meu filho”, disse Tatiana Carvalho ao Ministério Público. Ela não confirmou nem desmentiu que o seu filho de 21 anos estivesse envolvido no narcotráfico, sublinha o UOL. “Os policiais falaram que mataram 13 e vão voltar na comunidade e matar 20. Será que ninguém vai fazer nada?”, interrogou.

“O depoimento dos moradores é muito contundente nesse sentido de mutilações no corpo, facadas, abdómen aberto, traumatismo craniano. Há cenários na descrição dos moradores que são muito dramáticos”, confirmou ao El País Brasil Pedro Strozenberg, ouvidor-geral da Defensoria Pública do Rio de Janeiro.

Há imagens divulgadas pelas agências noticiosas do local onde morreram estas pessoas com uma enorme quantidade de sangue. A polícia não reconhece que tenha havido tortura ou que os detidos tenham sido executados. Os corpos foram levados para um hospital por uma ambulância chamada pela polícia.

“Uma das formas que a polícia tem de encobrir algo é levando os corpos para o hospital ou colocando armas na cena do crime”, recorda ao El País a advogada Maria Laura Canineu, da Human Rights Watch Brasil. Também põe em causa a versão da polícia de que houve um confronto – uma vez que só houve mortos e feridos do lado dos traficantes.

“Foi uma operação com grande valor simbólico”, disse ao Guardian, o professor de Sociologia na Universidade Estadual do Rio de Janeiro, Ignacio Cano. “Tudo indica que os assassínios feitos por polícias vão aumentar, porque há um encorajamento aberto do Governo, tanto estadual como federal.”

Correcção da descrição das funções da Defensoria Pública

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