Areias das dragagens no Sado vão ser lançadas numa zona de pesca em Tróia

Direcção-Geral de Recursos Naturais aprovou local para deposição dos dragados, que fica frente ao Pestana. Pescadores e ambientalistas contestam.

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Bruno lisita

A Direcção-Geral de Recursos Naturais, Segurança e Serviços Marítimos (DGRM) já aprovou o local para a deposição dos dragados do projecto de Melhoria das Acessibilidades Marítimas ao Porto de Setúbal, uma licença que faltava legalmente para que a obra possa começar. As areias serão depositadas na ‘Restinga A’, que fica fora da barra do Sado, junto a Tróia, frente ao empreendimento turístico do grupo Pestana e é uma zona de pesca artesanal, considerada pelos pescadores uma maternidade de peixes.

O local, na deriva litoral da península de Tróia, é apontado pelo Estudo de Impacto Ambiental (EIA), aprovado pela Agência Portuguesa do Ambiente (APA) como única localização que permite que a areia depositada possa servir para realimentar, naturalmente, as praias da Arrábida através dos efeitos das correntes marítimas

A licença de aprovação do Titulo de Utilização Privativa do Espaço Marítimo  (TUPEM 5, como é conhecido em Setúbal, embora a licença tenha o número TUPEM 030/01/2019 DGRM), pedida pela Administração dos Portos de Setúbal e Sesimbra (APSS), foi emitida no dia 8 de Janeiro, mas o despacho só foi publicamente revelado no sítio da DGRM na Internet na passada segunda-feira.

A decisão autoriza a deposição de 2,6 milhões de metros cúbicos de dragados de classe 1 e 2, considerados “materiais arenosos limpos ou com contaminação vestigiária”, não apenas durante a fase de construção mas também depois nas dragagens de manutenção durante a fase de exploração.

A autorização do TUPEM está a ser criticada pelos pescadores de Setúbal, além de contestada também pelas associações ambientalistas e grupos de cidadãos que têm lutado contra as dragagens, nomeadamente Clube da Arrábida, a Associação Ambientalista Zero, o grupo SOS Sado, a Sesibal - Cooperativa de Pescadores de Setúbal e Sesimbra, a associação de empresas de animação turística (APECATE), que representa operadores turísticos que trabalham no rio Sado, e o grupo Pestana.

A fase de consulta pública sobre o TUPEM recebeu a participação de 35 entidades, entre associações e cidadãos, genericamente de contestação com fundamento nos impactos para o ambiente, pesca e turismo.

Além deste TUPEM agora aprovado, a DGRM tem mais dois pedidos da APSS para decidir. Estes últimos terão sido solicitados como eventuais alternativas ao chumbo do primeiro.

Questionada pelo PÚBLICO, a APSS respondeu que o local de depósito dos dragados é o previsto no EIA e assegura estar a tentar encontrar soluções para acautelar as preocupações dos pescadores.

“O TUPEM aprovado e atribuído pela DGRM vai de encontro ao imposto pela APA [Agência Portuguesa do ambiente] na Declaração de Impacte Ambiental, sendo que a APSS, SA tem estado particularmente atenta às preocupações manifestadas pelas associações de pescadores, com as quais está a trabalhar no sentido de encontrar uma solução que, assegurando o cumprimento da Declaração de Impacto Ambiental, salvaguarde os interesses das associações e da comunidade piscatória de Setúbal”, afirma a administração portuária em resposta por escrito.

Ambientalistas acreditam nas providências cautelares

Após esta decisão da DGRM, as providências cautelares emergem como a maior esperança das associações ambientalistas e grupos de cidadãos que tentam travar as dragagens no rio.

Segundo Pedro Vieira, do Clube da Arrábida, as duas providências apresentadas não foram decretadas pelo Tribunal de Almada porque as obras não tinham começado, pelo que podem agora ser aceites.

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“O juiz alegou que não aceitava o decretamento provisório porque a obra ainda não tinha começado. Se a obra agora obteve luz verde, a nossa providência pode finalmente ser decidida e eventualmente decretada”, disse Pedro Vieira ao PÚBLICO.

A outra providência cautelar, que é anterior, é do grupo de cidadãos SOS Sado, que anunciou agora a intenção de intentar uma nova acção, desta vez relativa ao TUPEM.

“Acreditamos que existem argumentos com força para que seja decretada a providência cautelar sobre o TUPEM.  Ainda não podemos garantir em absoluto [que a vamos intentar] mas é uma forte possibilidade”, disse ao PÚBLICO David Nascimento.

O porta-voz do SOS Sado acrescenta que a outra providência apresentada pelo grupo “está pendente, ainda em apreciação pelo tribunal”. David Nascimento explica que o que foi indeferido pelo tribunal não foi a providência, mas apenas “o decretamento provisório, por as obras não terem começado”.

Por outro lado, o SOS Sado sublinha que as dragagens não podem ainda ter início, porque há ainda procedimentos legais pendentes. “Falta o despacho da APA a autorizar o início das obras e se este for emitido hoje, por exemplo, estará em violação da lei porque falta o cumprimento de várias exigências prévias à obra impostas pela DIA”, afirma o porta-voz do grupo de cidadãos.

“Temos esperança na via judicial porque, para todos os efeitos, não houve uma resolução sobre as providências e, se agora não forem ainda aceites, para travar o arranque da obra, temos ainda a acção principal”, conclui o presidente do Clube da Arrábida que não está por isso a ponderar outras formas de luta.

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