Maduro congela contas de Guaidó para responder às sanções dos EUA

Washington aumenta a pressão sobre o regime chavista impondo limitações às exportações de petróleo para os EUA. Caracas contra-ataca com investigação ao autodeclarado Presidente interino.

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Exportações da petrolífera estatal para os EUA passam a estar muito limitadas Manaure Quintero/REUTERS
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Juan Guaidó fica interditado de sair do país Carlos Garcia Rawlins/REUTERS
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Nicolás Maduro com um exemplar da Constituição venezuelana MIRAFLORES PRESS/EPA

Os Estados Unidos desferiram um dos mais duros golpes na economia venezuelana ao impor sanções sobre a petrolífera estatal. O Presidente Nicolás Maduro disse que as medidas são "ilegais" e prometeu responder.

As sanções incluem o congelamento dos fundos que a Petróleos da Venezuela (PDVSA) detém nos EUA e impõe fortes limitações na comercialização de petróleo venezuelano – os EUA são o principal importador de petróleo do país sul-americano, representando cerca de 40% das exportações. Mas a China e a Rússia são também compradores, e a decisão norte-americana fez subir os preços, o que levou estes aliados de Maduro a protestar.

Apesar de permitir que a Citgo, a filial norte-americana da PDVSA, continue a operar nos EUA, o Departamento do Tesouro impôs a obrigação de que os seus lucros sejam depositados numa conta congelada nos EUA.

Essa conta, assim como qualquer outra conta e bens do Governo venezuelano nos EUA, pode ser acedida por Juan Guaidó, o presidente da Assembleia Nacional que na semana passada assumiu a presidência interina do país com apoio de Washington, de vários países latino-americanos e europeus.

"Vamos continuar a utilizar todas as ferramentas diplomáticas e económicas à nossa disposição para apoiar Juan Guaidó", declarou o secretário do Tesouro, Steven Mnuchin.

Em resposta, o Presidente Nicolás Maduro pediu ao Supremo Tribunal venezuelano para abrir uma investigação a Guaidó e congelar as suas contas bancárias, bem como a impor-lhe uma proibição de sair do país, noticia a Reuters.

Minutos depois do anúncio da abertura da investigação, feito na televisão pelo Procurador-Geral Tarek Saab, Guaidó, discípulo o líder da oposição Leopoldo López, em prisão domiciliária desde finais de 2017, disse não menosprezar o risco de ser preso, mas que isso "não é nada de novo". "Estamos aqui, vamos continuar a agir para confrontar a crise humanitária", disse em conferência de imprensa.

Pelo menos 40 pessoas terão sido mortas em resultado de violência política na semana passada, incluindo 26 assassinadas a tiro por forças pró-Governo, disseram as Nações Unidas esta terça-feira.

O Departamento de Estado revelou ter transferido para a oposição alguns bens e propriedades nos EUA pertencentes ao Governo venezuelano e ao banco central. "Esta certificação irá ajudar o governo legítimo da Venezuela a salvaguardar esses activos para benefício do povo venezuelano", disse o porta-voz do Departamento de Estado, Robert Palladino.

O conselheiro para a Segurança Nacional, John Bolton, renovou os apelos às Forças Armadas venezuelanas para que aceitem "uma transferência de poder pacífica, democrática e constitucional".

É a primeira vez que os EUA visam o sector petrolífero com sanções – até agora, as medidas resumiam-se a afectar os bens de certas personalidades do regime. O objectivo é aumentar a pressão sobre a economia venezuelana, já muito fragilizada nos últimos anos pela queda dos preços do petróleo nos mercados internacionais, pela desvalorização da moeda e por uma hiperinflação sem precedentes.

A crise económica causou uma forte escassez de bens de primeira necessidade, incluindo alimentos e medicamentos, desvalorizou os salários e levou a uma fuga maciça de pessoas para outros países, incluindo Portugal.

"Se não for encontrado um destino para este crude rapidamente, a margem de manobra irá diminuir e as importações serão afectadas", avisa o director da consultora Ecoanalitica, Asdrubal Oliveros, citado pela Reuters. Para além do impacto económico, a limitação às exportações petrolíferas também vão constituir mais um teste à fidelidade dos militares, que controlam a produção, a Maduro.

Maduro fala em "crime"

O Presidente venezuelano disse que as sanções norte-americanas, "ilegais, unilaterais, imorais, criminais", servem apenas para "apelar a um golpe de Estado declarado". "Já dei instruções precisas ao presidente da PDVSA para iniciar acções legais", afirmou Maduro, sem no entanto especificar quais.

A petrolífera tem exigido pré-pagamentos aos seus clientes para libertar o petróleo com destino aos EUA, de acordo com três fontes citadas pela Reuters.

A Rússia, um dos aliados de Maduro, também criticou as sanções norte-americanas, considerando-as uma "interferência" nos assuntos internos da Venezuela. O porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, assegurou que Moscovo tudo fará para proteger os seus interesses económicos no país.

Apesar do forte apoio diplomático, Guaidó não tem do seu lado instituições cruciais para assumir o controlo efectivo do Estado, entre os quais as Forças Armadas ou os tribunais. O líder oposicionista tem ensaiado várias aproximações aos militares, acenando com a possibilidade de uma amnistia para quem desertar, mas as chefias continuam a reiterar a sua fidelidade ao regime de Maduro. No fim-de-semana o representante militar nos Estados Unidos, o coronel José Luis Silva, manifestou apoio a Guaidó, tornando-se no mais destacado membro da hierarquia das Forças Armadas a fazê-lo desde que o presidente da Assembleia assumiu a presidência do país.

Num sinal de que o conflito institucional apenas se irá aprofundar nos próximos tempos, Guaidó fez na segunda-feira várias nomeações para os cargos de direcção na PDVSA, bem como de um novo encarregado de negócios junto dos EUA. O autoproclamado Presidente interino voltou igualmente a fazer apelos à população para uma paralisação de duas horas hoje e nova manifestação sábado.

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