Criou uma cama, mas o que ele queria era um berço-caixão

Um ano depois de ter lançado a gama de mobiliário modular Delaktig, a IKEA trouxe a Lisboa o designer Tom Dixon para apresentar a segunda fase da sua colaboração com a gigante sueca. Uma redefinição de narrativas e tipologias, mas sem as intenções disruptivas que marcaram a sua génese: um movimento de pirataria à própria marca. Ao P2, Dixon assume uma máxima conceptual neste novo desafio: produzir “algo que fosse elitista e democrático ao mesmo tempo”.

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Quando a IKEA anunciou em 2016 uma colaboração com Tom Dixon, um dos designers industriais contemporâneos mais celebrados, expressões como “plataforma aberta” ou “co-criação” prometiam um ambicioso desenvolvimento da filosofia de design democrático da megaempresa de mobiliário sueca. De acordo com a IKEA, aquela ambição assenta na conjugação de forma, função, qualidade e sustentabilidade a um preço baixo. Na sua génese, a gama de assentos Delaktig, concebidos por Dixon, surge como a conjugação perfeita desta identidade corporativa, baseando-se em plataformas simples e depuradas que podem ser facilmente personalizadas com acessórios que as adaptam ao estilo de vida e necessidades específicas de cada um.

Dentro de um “hotel” improvisado no espaço LX Factory, em Lisboa, o designer britânico explicou ao P2 os detalhes desta segunda vaga criativa para a IKEA, centrada numa cama de casal que pretende ser tão customizável, como resistente e sofisticada.

O conceito de mobiliário open source de Tom Dixon teve a colaboração de estudantes de mestrado em Design da Royal College of Art (Londres), da Musashino Art University (Tóquio) e da Parsons School of Design (Nova Iorque). Estes alunos apresentaram em 2017, na Semana do Design de Milão, uma série de acessórios e adaptações para o conjunto Delaktig; hacks, como lhes chama Tom Dixon. A ideia de hacking é o motivo pelo qual esta colecção existe, uma história que remonta ao dia em que Dixon encontrou na Internet um tutorial que ensinava a construir um dos seus candeeiros a partir de uma taça barata da IKEA. Depois do desagrado com a situação, Dixon, empreendedor de sucesso que produz e distribui o seu trabalho através de uma marca com o seu nome, viu a oportunidade de abordar a IKEA com o seu próprio projecto de hacking.

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Tom Dixon

A primeira proposta, que Dixon continua a defender, foi rejeitada pela marca. Tratava-se de um berço que acompanharia a vida do utilizador até se transformar em caixão. Esta metáfora de um design pensado do nascimento à morte encontrou o seu espaço em Delaktig de forma menos explícita. De acordo com o designer, pensar do berço ao caixão é pensar nos materiais no seu estado natural e na sua vida para além da morte. No caso de Delaktig, o alumínio extrudido que configura a estrutura da plataforma não é uma escolha casual; e apesar de a sua utilização se dever sobretudo a características materiais intrínsecas como a resistência, também abre portas a uma argumentação retórica e especulativa. Além de ser reciclado e reciclável, o alumínio preserva o seu valor como poucos outros metais, garantindo que, mesmo num fim de vida distante, possa render um bom preço enquanto sucata. Ainda que se possa torcer o nariz à ideia de pensar no ferro-velho no momento de comprar um móvel da IKEA, este é o tipo de detalhe mais ou menos inofensivo que contribui para a coerência discursiva do projecto.

Outras intenções iniciais de ambas as partes imaginaram Delaktig como um produto low-cost — por exemplo, a ideia de um sofá de cartão que pudesse ser vendido por menos de 20 euros. O trabalho em alumínio e a crescente vontade de criar mais acessórios fizeram o preço aumentar. Ainda assim, tanto Tom Dixon como James Futcher, líder criativo da IKEA, que também esteve em Lisboa, defendem que tal não torna o produto mais caro em termos absolutos. Além de a durabilidade significar que o custo inicial (correspondente a um dos produtos de gama alta da IKEA) é amortizado com o tempo, Dixon garante que poucos móveis de luxo apresentam materiais com tanta qualidade como Delaktig, cuja estrutura é exposta sem disfarces nem reservas. Na conversa do P2 com Dixon, esta defesa do preço revela-se em linha com o que o designer entende ser uma vontade de produzir “algo que fosse elitista e democrático ao mesmo tempo”, mas pode também explicar a dificuldade, tanto do designer como do líder criativo, em apontar especificamente um público-alvo.

Delaktig é assim o fruto de uma colaboração mediática entre a IKEA e um designer conceituado, em que ambas as partes partilham interesses mútuos. Para Dixon, a IKEA garante uma rede de distribuição e marketing à escala global, além de uma forte componente de conhecimento técnico que facilita a aprovação nos exigentes testes de segurança obrigatórios em diferentes países. Para a IKEA, Tom Dixon é um nome que legitima e projecta a marca, além de ser um designer que partilha o desejo de trabalhar a partir da fábrica, que tem uma forte ligação aos materiais e que busca a sua potencialização no contexto da produção em massa. O primeiro resultado desta colaboração chegou às lojas IKEA na Europa em Fevereiro de 2018: três plataformas de diferentes tamanhos (correspondentes a um, dois e três lugares), além de uma série de acessórios como candeeiros, mesas de apoio e diferentes coberturas em tecido. No site da sua marca homónima, Tom Dixon comercializa os seus próprios hacks, uma ampliação da oferta original que evidencia o carácter híbrido deste móvel que quer ser cama, sofá, poltrona, divã, chaise longue ou outro qualquer produto da imaginação de quem o compra, usa e personaliza.

Projectar a longevidade

Tom Dixon nasceu em 1959 em Sfax, na Tunísia, tendo-se mudado para Inglaterra em 1963. Em Londres, frequenta a Chelsea School of Art, da qual desiste para se dedicar à música com a banda Funkapolitan, onde era baixista. O cruzamento definitivo com o design surge com a descoberta da máquina de soldar, uma paixão autodidacta que abriu caminho à construção de mobiliário a partir de peças de ferro-velho. Este espírito de reaproveitamento dos materiais e dos seus atributos orienta de forma indelével o seu percurso profissional. O sucesso comercial surgiu nos anos 1980 e no final da década começa a trabalhar com a empresa italiana de mobiliário Cappellini. É aí que lança a cadeira S (1987), mais tarde adquirida pelas colecções permanentes do Victoria and Albert Museum (Londres) e do MoMA (Nova Iorque). Entre 1998 e 2008, trabalhou para a cadeia de lojas Habitat — adquirida em 1992 por Ingvar Kamprad, fundador do grupo IKEA — primeiro como chefe do departamento de design e mais tarde como líder criativo da marca.

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Em Lisboa, Tom Dixon apresentou a cama de casal desenvolvida em colaboração com o IKEA, aqui personalizada com candeeiros, mesa de apoio e cabeceira, alguns dos acessórios que podem ser acrescentados e removidos pelo utilizador

Ao longo dos anos, Tom Dixon ficou conhecido pela sua prolífica criação de objectos sofisticados e detalhadamente trabalhados, sobretudo no campo da iluminação. A série de candeeiros suspensos Beat — a mesma que o site IKEA hackers ensina a “recriar” — demonstra esse cuidadoso tratamento dos materiais e das suas expressões naturais. Feitos de latão sólido, a sua face interior dourada contrasta com as múltiplas cores e acabamentos do exterior. As formas discretas destes candeeiros, inspiradas em vasos artesanais do Norte da Índia, são apropriadas e recontextualizadas pelo designer em ambientes de luxo. Não se distanciando desta sua produção mais elitista, nem do seu gosto por objectos únicos e preciosos, Dixon reivindica uma faceta democrática em acontecimentos como Polysterene Chair Grab, quando em 2006 dispôs na londrina Trafalgar Square 500 poltronas em EPS, ou poliestireno expandido, levadas gratuitamente para casa pelo público. Estes acontecimentos patrocinados fizeram o seu trabalho chegar a casas onde não entraria de outra forma, simultaneamente publicitando a marca promotora (neste caso, a EPS Packaging Group, um fabricante de poliestireno expandido) e tornando-se em projectos com uma identidade muito própria.

Quando questionado sobre o percurso que trilha na actualidade, Dixon põe a hipótese de nunca ter resolvido a sua filosofia e afirma estar mais interessado em aceitar e provocar desafios inesperados. Nesse sentido, entende que o design se tornou uma profissão monótona e antiquada, um negócio lento que não consegue acompanhar o ritmo de evolução de áreas como a música, a edição ou a tecnologia. A impaciência com o seu próprio campo de acção e a necessidade pessoal de olhar o design por uma lente diferente estão na origem das motivações que o levam a colaborar com a IKEA, onde reconhece ter encontrado condições para iniciar um diálogo que não poderia ter iniciado sozinho. Por sua vez, esse diálogo debruça-se sobre uma ideia constante no seu trabalho: a longevidade dos objectos. “As minhas peças de mobiliário preferidas são aquelas que tiveram várias vidas, que apresentam padrões e marcas de uso” — afirma Dixon. “Também acho que, se algo consegue sobreviver várias gerações, é bastante mais ecológico do que muita da conversa que as pessoas têm em termos de reciclagem e consumo. Há muito greenwashing a acontecer e eu não faço de conta que sou mais ecológico que os outros designers, mas acho que, quando fazemos coisas que têm em si uma permanência, o impacto [negativo] será menor do que ao fazer fast furniture ou ao seguir as tendências.”

Pela parte da empresa sueca, o líder criativo James Futcher defende uma visão semelhante do que é responsabilidade ecológica, reforçando a importância de criar objectos que conquistem o afecto do utilizador e que assim prolonguem o seu tempo de vida útil, tornando-se menos descartáveis. Para ambas as partes, o desafio está em criar objectos únicos através dos meios de produção em massa que, por natureza, conduzem à uniformização. Futcher dá o exemplo de uma colecção de peças de cerâmica marcadas pelos operários que eram incentivados a ter menos cuidado no seu manuseamento após a retirada dos moldes. A sintonia entre Dixon e a IKEA neste interesse pela, digamos, corrupção dos processos de uniformização é transferida da gama Delaktig para o próprio utilizador. O nome em si é o termo sueco para “em conjunto”, e simboliza para a IKEA “a importância da personalização dos espaços e objectos”. É precisamente neste espaço conceptual de co-criação e personalização que Tom Dixon invoca a ideia de hacking.

IKEA hackers: crime e redenção

Jules Yap é o pseudónimo de uma cidadã malaia que desde 2006 gere o site Ikeahackers.net, uma plataforma onde divulga tutoriais que ajudam qualquer pessoa a personalizar produtos da IKEA, propondo soluções criativas e económicas para a casa. O projecto atingiu um sucesso tão grande que, em 2014, representantes da IKEA requisitaram a transferência para si do domínio, ameaçando iniciar uma acção legal por violação de direitos de propriedade intelectual. Após as primeiras negociações, Jules Yap foi autorizada a manter o domínio original, com a condição de retirar todos os anúncios de terceiros que lhe permitiam trabalhar a tempo inteiro na plataforma. A seu ver, tal solução só interessava mesmo à IKEA, que continuaria a beneficiar da publicidade feita pela plataforma e da sua atitude positiva e amigável, promotora de um envolvimento único do público com a marca. Ainda assim, e no meio da confusão legal, Jules Yap dizia ao tablóide Malay Mail em 2014 que via a IKEA (presente em 52 países, incluindo a Malásia desde 1996 e Portugal desde 2004) como algo bom: “Oferece mobília barata com um design que não é mau de todo.” Nessas mesmas declarações, afirmava que na IKEA está implícita a possibilidade de misturar, combinar e personalizar e que o hacking se limita a explorá-la.

As tácticas de intimidação de que foi alvo só reforçaram a popularidade do IKEA hackers. A verdade é que a empresa acabou por abrir mão do controlo apertado sobre os direitos legais da marca — o site está hoje acessível sem restrições. Além disso, a própria filosofia do hacking foi integrada no negócio da empresa, uma intenção demonstrada não apenas pela gama Delaktig, mas também pela colecção Lyskraft, uma colaboração com o duo holandês de designers Scholten & Baijings. Em conjunto, estas duas colecções pareciam tornar 2018 no ano do DIY (do it yourself) para a IKEA. Como escreveu Jules Yap no seu site: “Completou-se o círculo. Normalmente somos nós os hackers, agora a IKEA juntou-se à diversão.”

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The Green Room. Um dos cinco quartos apresentados em Lisboa para demonstrar a flexibilidade da colecção desenvolvida com Tom Dixon. Na imagem, cama e sofá Delaktig dialogam com outros artigos do IKEA, num ambiente evocativo das intenções ecológicas da empresa

A reconciliação definitiva da IKEA com a sua comunidade de hackers, pelo menos no plano discursivo, efectiva-se com a proposta de Tom Dixon. Mais uma vez, a sintonia entre ambas as partes é evidente: o que se afigurava como uma violação de propriedade intelectual rapidamente se transforma num novo produto com potencial lucrativo. A personalização responde a uma ânsia contemporânea pela diferença, cujas raízes podem ser encontradas na massificação de ideias e mercadorias — um desejo privado e individualista que só é redimido pela promessa de um impacto ecológico positivo. O utilizador ganha afecto ao móvel que personalizou, prolongando o seu tempo de vida útil, salvando o planeta de todos os produtos efémeros e impessoais que, de outra forma, teria comprado e deitado fora. É isso que torna Delaktig num produto tão interessante quanto questionável, um canivete suíço ideológico que responde a todas as principais inquietações de uma sociedade consciente da sua agressão constante ao ambiente, mas que parece incapaz de agir fora do espectro do consumo. A IKEA, cujo sucesso global se construiu em parte através da comercialização de móveis bem projectados, contemplando no seu design um preço baixo e uma curta durabilidade, está tão presente na origem do problema como procura estar na solução.

Delaktig 2.0

Quase um ano depois do lançamento de Delaktig, IKEA e Tom Dixon juntaram-se de novo para apresentar a versão 2.0 da colecção. No armazém L do LX Factory, em Lisboa, esteve montado o Hotel Delaktig, onde por um dia se reuniram dezenas de jornalistas, bloggers e influencers de vários países, recebidos por representantes da marca, além do próprio Tom Dixon. Tornou-se óbvio que a IKEA pretende investir de novo no potencial da colecção; a pergunta natural é: porquê? A resposta simples é: uma cama de casal e nova tipologia que se junta agora às três plataformas existentes desde 2018. A introdução desta estrutura maior marca uma distinção clara entre as tipologias de sentar e as de deitar, fazendo desaparecer quase por completo a dúvida original do produto (é um sofá ou uma cama?), ainda que Futcher defenda a flexibilidade das plataformas originais, onde “podemos fazer o que quisermos”.

Foi esta nova cama de casal que ocupou o lugar central de um labirinto de sofás, poltronas e divãs dispostos no piso térreo deste “hotel”. Ao seu lado, cinco compartimentos diferentes completavam o enorme showroom, demonstrando a flexibilidade de Delaktig ao criar ambientes “minimais”, “ecológicos” ou “familiares”. Muita desta flexibilidade devia-se mais à conjugação de peças desta gama com outros produtos IKEA do que à utilização dos acessórios disponíveis na colecção — mesas de apoio, candeeiros, encostos, almofadas e diferentes tecidos. É certo que isto constitui um grau de personalização substancial ao nível do objecto e não deixa de ser admirável a capacidade de modificar um móvel com tão poucas peças. Mas longe está a ideia radical de “hacking”, palavra notavelmente ausente dos vários textos que pontuavam o espaço e que foi apenas mencionada num breve comentário de Tom Dixon durante o debate com Futcher, moderado pela antropóloga Katharina Graffman. De facto, todo o discurso à volta da promoção de Delaktig debruça-se muito mais sobre a responsabilidade ecológica do produto e da marca, além do factor lifestyle, que encontrou o seu lugar em pequenas placas de texto a recomendar-nos uma alimentação saudável ou uma hora de descanso mental antes do sono.

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Delaktig nunca foi um projecto contracultural e mesmo a sua proposta de personalização é uma apropriação soft de algo que sempre se fez mas que no site de Jules Yap encontrou um nome e uma comunidade. Por outro lado, a linguagem usada, desde o open source ao hack, não é inocente, pois foi sempre um piscar de olho esperançoso a algo que nunca aconteceu realmente: um movimento espontâneo de criação colectiva à volta de um produto. Podemos especular sobre as razões para tal, e certamente haverá algo a dizer sobre o preço. Enquanto o IKEA hackers recorre sobretudo a peças baratas como as ubíquas mesas Lack ou estantes Billy, Delaktig exige um investimento inicial que, embora justificado pela sua durabilidade, não está ao alcance de grande parte dos consumidores da IKEA que se possam dedicar a construir candeeiros a partir de taças de cozinha. Também é verdade que Dixon foi sempre mais activo do que a IKEA na promoção da ideia de hacking: as menções no seu site provam-no. O designer afirma que isso se deve ao facto de ele não ser legalmente responsável por qualquer acidente que surja de um hacking mais desastrado — já a IKEA não pode dizer o mesmo. É uma justificação sincera, como aquela que James Futcher dá ao P2 quando se revela mais céptico em relação ao entusiasmo disruptivo original: “A cultura do IKEA hacking funciona sempre melhor quando as pessoas descobrem como o fazer e nós queremos que as pessoas descubram por si próprias.”

A discussão sobre Delaktig não se deve limitar à sua capacidade de responder a necessidades domésticas e práticas específicas. A densidade discursiva que envolve esta colecção pode ser aceite com um espírito aberto, e é louvável a forma como a IKEA parece abordar a questão ambiental. Mas as hesitações conceptuais e a incapacidade de compreender os fenómenos mais interessantes no seu alcance global devem recordar-nos um factor essencial: esta continua a ser uma empresa à procura de rentabilizar o seu “génio”, absorvendo e reapropriando manifestações culturais que identifica na sociedade. Delaktig é apenas uma tentativa de o fazer de forma responsável, ainda que pouco segura dessa possibilidade. A ideia inicial de hacking autorizado e oficial talvez fosse mais sólida enquanto inspiração do que característica do produto, mas a reflexão sobre a longevidade e a proposta ecológica de Dixon são mais relevantes do que a esmagadora maioria do discurso corporativo sobre a tragédia climatérica.

Para lá da retórica especulativa há algo que deixa espaço para o benefício da dúvida: a longevidade material aparenta ser também projectual, havendo uma redefinição estratégica da colecção em vez do seu abandono. O lançamento desta segunda fase poderia ter feito um retrato das interacções “não oficiais” dos utilizadores com Delaktig: um resumo honesto da experiência. Mas esse não parece ser o interesse de quem começou por provocar a curiosidade. Ainda assim, esta colaboração tem algo de útil a acrescentar ao debate sobre sustentabilidade no contexto da produção em massa e do consumo desenfreado. Em vez de recorrer aos lugares-comuns do lifestyle, a estratégia de marketing — da qual Dixon se demarca — poderia ter assumido de forma menos condescendente as intenções mais nobres da IKEA. Com efeito, o maior retalhista de mobiliário a nível mundial tem feito um esforço para se assumir como amigo do ambiente, publicitando no seu site dezenas de medidas neste sentido. Porém, a questão incómoda continua a residir na sua própria natureza, na escala da sua dimensão, que é gigante. Por outras palavras, será a IKEA, com a sua inexorável conquista de novos mercados e imparável produção de mercadorias, demasiado grande para ser sustentável? Estamos perante um inquietante dilema do capitalismo tardio: é possível consumir moralmente? A resposta tem de ser procurada num diálogo muito mais abrangente e radical, que repense o impacto de megaempresas como esta nas nossas casas, mas também do nosso planeta. Delaktig não se aventura por esse debate maior, mas lança algumas pistas para aquele que é o desafio mais importante do design contemporâneo.

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