Rendas acessíveis, 400 casas, 1000 pessoas: eis a nova vida do Monte Pedral

Governo devolveu à Câmara do Porto quartel cedido há mais de 100 anos. Dentro de três anos, o espaço deverá ter 400 habitações para 1000 moradores, uma residência universitária e zona comercial. Falta definir modelos do concurso e de financiamento

Foto
Paulo Pimenta

Rui Moreira chama-lhe “um segundo Acordo do Porto” e garante ser o maior projecto de habitação com arrendamento acessível feito em Portugal. Entre as ruas da Constituição, Serpa Pinto e Egas Moniz, no Quartel de Monte Pedral, vai nascer um conjunto de 370 a 400 habitações com rendas acessíveis, capazes de receber cerca de 1000 pessoas, uma residência universitária e uma zona comercial. São 25 mil metros quadrados de terreno – “o dobro da área da Avenida dos Aliados” – num valor de mercado de “pelo menos 50 milhões de euros”. Para as obras, estima o presidente da autarquia, serão necessários pelo menos mais 50 milhões.

A notícia foi dada esta quinta-feira com pompa e circunstância numa sala recheada de jornalistas e sorrisos de Rui Moreira e dos seus vereadores, que compareceram em peso. A batalha da autarquia para recuperar o quartel arrastava-se “pelo menos desde 1997” e a 19 de Novembro de 2018 Moreira decidiu retomar a disputa. Numa carta enviada ao Ministro da Defesa, João Gomes Cravinho, pedia a reversão do contrato. Dias depois, na reunião camarária, apresentava uma moção, aprovada por unanimidade, a reforçar o pedido de devolução dos terrenos. Pouco depois, em Dezembro, a Secretária de Estado da Defesa Nacional, Ana Santos Pinto, comunicava que o assunto haveria de chegar a Conselho de Ministros.

Foto
Quartel fica entre as Ruas da Constituição, Serpa Pinto e Egas Moniz Paulo Pimenta

Assim aconteceu esta quinta-feira. Visto não haver previsão de “qualquer utilização futura” por parte do Exército para o quartel, explica a assessoria do Ministério da Defesa, foi “aprovada em Conselho de Ministros a decisão de desafectar do domínio público militar o Quartel do Monte Pedral”, devolvendo-o ao município portuense.

O terreno tinha sido “cedido a título definitivo” ao Estado para ser um “quartel de cavalaria”, recordou Rui Moreira. Essa cedência foi concretizada em dois contratos, um de 1904 e outra de 1920, antes e logo depois da I Guerra Mundial. O contrato “previa a reversão em caso de ser dado ao terreno outra função”. Ora, como recordou o autarca quando apresentou a ideia numa reunião de câmara, há muito que “não há lá cavalo nenhum, só um tanque abandonado.”

Ao deparar-se com “novas carências de habitação” na cidade, Moreira viu no quartel - com uma “dimensão e localização particularmente interessantes” -, uma oportunidade. “Este era provavelmente o terreno mais importante que poderíamos reaver”, afirmou na conferência de imprensa.

Programa pode chegar a 1400 casas e chega a Campanhã

Por definir está ainda o modelo de concurso público e financiamento do projecto “e a integração destes projectos com outros semelhantes na cidade”, parte de um “programa de habitação de renda acessível” que, no total, deverá conseguir entre 1300 a 1400 novas casas na cidade. A geografia escolhida para esses futuros investimentos, destinados a jovens casais e classe média, deverá ser Campanhã. Mas tanto nesses casos como no do quartel há ainda um problema a desbloquear: a revisão do Plano Director Municipal, que passa pela votação da Assembleia Municipal, terá de ser feita e aceitar alterações. Em alguns casos significativas.

Foto
Área do terreno onde está o quartel corresponde a duas Avenidas dos Aliados Paulo Pimenta

Em breve, numa reunião do Conselho Municipal de Economia do Porto, a “Casa dos 24”, os vários modelos possíveis estarão em cima da mesa para um debate que está ainda em aberto. E é previsível que a câmara seja a senhoria destes fogos? “Não me parece o modelo mais adequado”, anuiu, reforçando, no entanto, que tudo está em aberto. Sempre que possível a autarquia optará por "não alienar" território. O “modelo virtuoso” eleito para o Rainha Dona Leonor, com parte entregue a privados e outra de habitação social, é, por exemplo, uma possibilidade.

Para o quartel, "enorme" edifício no “coração do Porto”, além das habitações de rendas acessíveis – cujos valores o presidente da câmara considera prematuro precisar -, haverá 3300 metros quadrados reservados para uma residência universitária com “seguramente mais de 100 quartos”. Ficará para os universitários a honra de ocupar o edifício central, parte da “carta do património da cidade” e virado para a Rua de Serpa Pinto. Essa fachada, será pedido aos arquitectos e projectistas, deverá ser mantida.

Este acordo com a equipa de António Costa vem reforçar a “excelente relação” do município com o Governo, disse Rui Moreira, congratulando-se com a “capacidade de encontrar formas de cooperação” nos últimos meses. Além do acordo “sem contrapartidas” do quartel, a Câmara, em colaboração com Costa, conseguiu finais felizes para o Liceu Alexandre Herculano e a Empresa Municipal da Cultura. Um bis de felicidade, aliás, se este desfecho for visto como um “segundo Acordo do Porto”, como o autarca referiu. Em 2015, ainda com Passos Coelho no poder, pôs-se um ponto final em vários diferendos entre o Porto e o Estado, como os referentes aos terrenos do Aeroporto Sá Carneiro, o património da STCP e processos na Avenida da Boavista ou nos carris de eléctrico na Foz.

Sugerir correcção
Comentar