Dois navios no Mediterrâneo esperam pela Europa. Portugal disponível para acolher dez migrantes

Há 49 migrantes a bordo. Portugal disponível para acolher dez, "por razões humanitárias" e de "cooperação europeia", mas pede solução "integrada".

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Um dos migrantes no Sea-Watch 3 Reuters/DARRIN ZAMMIT LUPI

Dois navios de resgate de migrantes estão à deriva no Mar Mediterrâneo – um há 14, outro há sete dias –, à espera de luz verde para aportar num país europeu da bacia mediterrânica. A bordo estão, no total, 49 migrantes mais as tripulações de duas ONG alemãs. O Governo português comunicou à Comissão Europeia disponibilidade para acolher até dez pessoas, após o desembarque.

Este é o 14º. dia à deriva no mar Mediterrâneo para os 32 migrantes a bordo do navio Sea Watch 3, da organização não-governamental com o mesmo nome. Vinte e um homens, quatro mulheres, três crianças e quatro menores não acompanhados foram resgatados ao lago da Líbia a 22 de Dezembro. Há uma semana, a navegar sem destino, estão outras 17 pessoas resgatadas pelo navio Professor Albrecht Penck, da Sea-Eye.

Desde que, em Junho, a Itália, que até então recebia quase todos os migrantes resgatados por navios humanitários, lhes fechou os seus portos, cada caso tem que ser avaliado individualmente. A Comissão Europeia “tem estado em contacto com vários Estados-membros para encontrar uma solução para o desembarque rápido das pessoas” a bordo das duas embarcações, disse na quinta-feira a porta-voz Mina Andreeva. Não é conhecido, para já, o resultado destas negociações.

Portugal disponível para acolher até dez migrantes

Portugal, Holanda e Alemanha – esta com a condição de que outros países europeus assumam o mesmo compromisso – já se mostraram disponíveis para acolher algumas destas pessoas, após o desembarque. O Ministério da Administração, questionado pelo PÚBLICO esta sexta-feira, fez saber que, “tal como tem acontecido em todas as situações anteriores, Portugal respondeu ao apelo da Comissão Europeia e já comunicou a disponibilidade para acolher até dez migrantes do navio Sea Watch 3”.

O gabinete de Eduardo Cabrita destaca que o “país tem respondido a todas as situações de emergência que resultam dos resgates de migrantes no Mediterrâneo”, tendo manifestado disponibilidade para acolher parte destes grupos de migrantes. Fá-lo “por razões humanitárias”, “face à situação de emergência em que se encontram estas pessoas”, e como resultado de um “compromisso de solidariedade e de cooperação europeia assumido por Portugal em matéria de migrações”. Na sequência de resgates de navios humanitários, chegaram ao país no ano passado 86 pessoas.

“Portugal continua, no entanto, a defender uma solução europeia integrada para responder ao desafio dos fluxos de migrantes que procuram chegar à Europa através do Mediterrâneo”, sublinha o ministério.

“Não percebemos o que está a acontecer”

As condições a bordo, em pleno Inverno, deterioram-se. No Sea Watch 3, os voluntários estão exaustos e as reservas de comida e água estão a terminar, dá conta o relatório dos médicos voluntários, datado de terça-feira, partilhado no Facebook da ONG. Devido à longa estadia a bordo às más condições meteorológicas, que se têm vindo a agravar, muitos migrantes têm tido “graves enjoos”. “Para pessoas desnutridas e débeis, a consequente desidratação pode pôr em risco a sua vida, especialmente quando conjugada com hipotermia”, lê-se. Em especial risco estão as crianças, com um, seis e sete anos, alertam.

A isto soma-se a dificuldade em lidar em alto mar, com ventos e ondulação fortes, com situações de stress pós-traumático, com o medo, a frustração.

“Nós estamos neste navio mas não percebemos o que está a acontecer”, disse Bob Kiangala, um dos migrantes no Sea Watch 3, à agência Reuters. “Não somos peixes, não somos tubarões, somos humanos como toda a gente. Fizemos esta travessia, arriscámos as nossas vidas para chegar à Europa e agora que chegámos a Europa recusa-nos, e não compreendemos porquê.”

As ONG alemãs têm partilhado nas redes sociais relatos da vida a bordo. A Sea-Eye partilhou na noite desta sexta-feira como encontrou Alphayorb, de 17 anos, natural da Serra Leoa, há uma semana num “barco de pesca sobrelotado”. “Ele diz que o risco de morrer na Líbia era tão grande como o de morrer no Mediterrâneo. Mas ele é demasiado jovem para desistir.”

As organizações apelam às doações para continuar o trabalho de resgatar e encontrar um “porto seguro” para os migrantes que todos os dias, em embarcações precárias e sobrelotadas, tentam fazer a travessia do Mediterrâneo.

“Doze dias pendurados pela Europa”, dizia a dia 3 de Janeiro Thomas von Bord, motorista do Sea-Watch 3, num texto em que recorda a passagem de ano em alto mar, com ondas altas e ventos fortes. Quem segue a bordo enjoa, ninguém consegue dormir. “Este é um novo recorde na luta feroz contra os salvadores marítimos privados que, apesar da criminalização e represálias arbitrárias, ainda se recusam a afogar pessoas na fronteira mais letal da Europa”, escreveu no Facebook.

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