Um acordo entre Japão e UE que é também um sinal para Trump

A União Europeia agilizou parceria comercial com o Japão para servir de alternativa a novas crises com os EUA a nível comercial.

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Reuters/Francois Lenoir

As negociações já duravam desde 2013, mas o facto de o mundo, com a chegada de Donald Trump à presidência, ter-se tornado um local muito menos confortável para economias que apostam nas suas exportações, como a europeia e a japonesa, parece ter servido de estímulo a que as duas partes chegassem a um acordo.

A UE e o Japão deram durante este mês de Dezembro, com a aprovação pelo Parlamento Europeu, o passo final na concretização de um acordo que faz com que 97% dos produtos da UE importados pelo Japão não tenham taxas alfandegárias e 99% dos produtos japoneses importados pela UE beneficiem também de comércio livre.

O entendimento, explicou o economista japonês Fukunari Kimura ao PÚBLICO durante a sua recente visita a Lisboa, é “mais importante pela harmonização de regras que é feita do que pela redução de taxas alfandegárias, que já eram bastante baixas”. Ainda assim, foi feito na base de uma concessão importante por cada um dos lados. O Japão aceitou reduzir de forma decisiva as taxas aplicadas à entrada dos produtos alimentares europeus, como o queijo e o vinho (o mais importante no caso de Portugal). Em contrapartida, a Europa liberalizou mais o acesso do Japão ao seu mercado automóvel, prevendo-se no entanto um período de implementação progressivo de sete anos.

A aceleração das negociações e a chegada rápida a um acordo nos últimos meses tem contudo uma explicação que vai para além das relações comerciais entre os dois blocos. UE e Japão, a braços com a ameaça de proteccionismo vinda dos EUA, pareceram querer, com o anúncio de um entendimento nesta fase, ter mais um trunfo na mão quando chegar a hora de negociar com Trump: um acordo que envolve cerca de um terço do PIB mundial.

Cecilia Malmstrom não escondeu esta intenção. A comissária europeia para o comércio descreveu o acordo como “um sinal ao mundo de que duas das suas maiores economias ainda acreditam no comércio livre, opondo-se tanto ao unilateralismo como ao proteccionismo”, uma mensagem com o claro destinatário na Casa Branca.

Fukunari Kimura confirma a importância que o factor Trump teve também para o Japão. “Sim, Donald Trump acelerou o processo. No Japão, as coisas estão a ser feitas passo a passo na relação com os EUA, já que conseguimos ganhar dois anos antes do início das negociações, que irão começar em Janeiro, mas entretanto, os nossos outros interlocutores ficaram mais abertos a um entendimento”, afirma o professor da Universidade de Keio, lembrando que aceleração registada na UE é “típica”, já que “as decisões na Europa tendem a ser tomadas quando se está perante uma crise”.

Durante os últimos dois anos, o Japão finalizou dois acordos, um com dez outros parceiros asiáticos, outro com a UE. Esses acordos são, diz Kimura, “um impulso benevolente para convencer os EUA a também chegar a um entendimento”. “Alguns sectores nos Estados Unidos vão ficar em desvantagem face aos europeus no acesso ao mercado japonês. Isso pode ajudar a caminhar em direcção a um comércio livre”, defende.

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