Desconstruindo demagogias… pela coerência de atitudes

A composição do Conselho Superior do Ministério Público deve, aliás, tem, de ser discutida tal como qualquer outra questão com relevo social.

Temos assistido às declarações do Sindicato do Ministério Público (SMMP) relativamente à possibilidade de ver discutida na Assembleia da República (AR) a composição do Conselho Superior do Ministério Público (CSMP).

Acredito que o cidadão menos avisado que os ouça fique perturbado e embale na canção de perfil populista de o poder político querer controlar o MP, “escolhendo quem deve ou não deve ser investigado”, tudo a reboque de uma pretensa vingança por determinados políticos e pelo poder económico a estes associado, terem sido investigados pelo MP.

Esta visão apocalítica é falaciosa e deturpadora do diálogo que deve ser esclarecido e lúcido. Além de ser desprimorosa para os magistrados do MP.

Com efeito, esta visão do SMMP passa um atestado de inimputabilidade a todos os procuradores que, obedientemente como cordeiros num manso rebanho, acatariam as ordens que lhes seriam dadas, sem sequer as questionar, em cega obediência, como se fossem todos acéfalos. E como se não existissem mecanismos de denúncia.

O MP não é este corpo amorfo e sem inteligência ou vontade. É uma magistratura organizada, bem preparada e com sólidos princípios de seriedade enraizados. Nunca se deixaria “eliminar” por qualquer hipotética tentativa de “controlo político”.

Mas querer fazer crer que discutir a composição dos membros que integram o CSMP é equivalente a uma tomada de assalto por parte do poder político é inaceitável. Até porque o tal poder político seria a AR e eventualmente o Presidente da República, com toda a pluralidade democrática inerente.

Hoje a composição do CSMP não obedece ao princípio democrático da representatividade dos cidadãos. E é o único conselho superior das magistraturas em que tal acontece. A desproporcionalidade existente leva a que não seja possível qualquer tipo de escrutínio (e não controlo!) sobre a atividade do MP, que permanece opaca e indecifrável aos olhos dos cidadãos e do próprio MP, como veremos adiante.

A nossa Constituição não refere o número de membros magistrados e não magistrados que devem compor o CSMP. Dispõe apenas sobre a origem dos mesmos. Aditar membros da sociedade civil eleitos pela AR e eventualmente designados pelo Presidente da República não belisca a autonomia que todos os magistrados do MP detêm e têm a obrigação de fazer valer. É por ser tão necessário um MP eficaz que deve ser robustecido com uma maior legitimidade democrática. E basta ver as personalidades nacionais de reconhecido mérito que têm sido eleitas pela AR e indicadas pelo Ministro da Justiça para facilmente se intuir que não são “cunháveis” ou “paus mandados” do poder político.

São é em número muito inferior aos membros magistrados, o que os pode tornar inoperantes, designadamente na eliminação dos tiques corporativos. Daí que seja incompreensível a atitude do sindicato, ameaçando com uma greve apenas pela possibilidade de o Parlamento debater, livremente, o que constitucionalmente lhe compete. Isto sim, é que é uma inadmissível ingerência na separação de poderes.

Não é uma greve para reivindicar nada em concreto, mas sim para impedir que a AR, leia-se os portugueses, possa discutir a composição do CSMP. E o sindicato até diz que vai estar presente nos trabalhos da AR para fiscalizar! Esta atitude é reveladora de um totalitarismo que não se pode consentir, sendo, aliás, contraditória com o que o próprio sindicato, internamente, diz sobre os poderes do CSMP. Veja-se a este propósito a comunicação que dirigiu no recente dia 10 de dezembro aos seus associados.

O que consta nessa comunicação está em completa contradição com as declarações que o sindicato tem vindo a proferir sobre esta mesma questão.

Claro que deve, aliás, tem, de ser discutida a composição do CSMP, tal como qualquer outra questão com relevo social.

Queremos uma sociedade democrática sem feudos intocáveis para que a Justiça seja cada vez mais uma concretização real e não um mero conceito ideal.

Fica a homenagem a todos os magistrados do MP que, nos lugares que ocupam, lutam por uma sociedade livre do veneno da corrupção e da restante criminalidade.

Apela-se à coerência dos princípios.

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