Ministra: 4500 cirurgias adiadas por “greve cruel" que "se vira contra os mais fracos”

Ministra da Saúde questiona se, "perante alguns casos", "não estamos perante um abuso de direito".

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Mario Lopes Pereira

Uma “greve cruel porque se vira contra os mais fracos” e não contra os destinatários da paralisação. Foi assim que a ministra da Saúde se referiu à greve dos enfermeiros que está a decorrer nos blocos operatórios dos centros hospitais do Porto, Lisboa Norte, São João, Coimbra e Setúbal. Nas contas de Marta Temido, até ao dia 10 foram canceladas 4543 cirurgias programadas.

A responsável pela pasta da saúde está esta quarta-feira no Parlamento para falar sobre a política da saúde e para responder sobre o financiamento do Serviço Nacional de Saúde (SNS) a pedido do PSD. Mas a greve cirúrgica que está a decorrer desde o dia 22 de Novembro tornou-se rapidamente tema central.

Questionada pelos deputados, Marta Temido adiantou que até ao dia 10 foram adiadas 4543 cirurgias. Número que “é resultado de uma greve cruel, porque se vira contra os mais fracos e não contra quem se julga que é destinatário” da paralisação. Reconhecendo que a greve é um direito, “não podemos deixar de perguntar se perante alguns casos não estamos perante um abuso de direito”.

“Não quero criar mais ruído. Estamos muito apostados em construir soluções”, disse de seguida. Marta Temido adiantou que o Governo se tem reunido com os hospitais alvo da greve e com os sindicatos dos enfermeiros que se mantêm em negociações. “Só este ano foram realizadas mais de 30 reuniões com os sindicatos dos enfermeiros e 20 com os sindicatos de diagnóstico e terapêutica. Estes números mostram o nosso interesse em continuar a conversar.”

Marta Temido adiantou que, se nada mudar, será possível recuperar as cirurgias até agora canceladas no primeiro trimestre de 2019. “Começaremos a fazê-lo em breve dentro do SNS e encaminhado os doentes se for o caso, dentro das regras e tempo máximo de resposta garantido, para outros parceiros”, disse, acrescentando que o financiamento para esta actividade está garantido.

O deputado do PSD Ricardo Baptista Leite lembrou que em cima da mesa está a possibilidade de um novo pré-aviso de greve de mais 45 dias a começar em Janeiro. O Movimento Greve Cirúrgica iniciou na terça-feira uma nova recolha de fundos, que até às 11h desta quarta-feira tinha angariado já mais de 13 mil euros — pedem 400 mil.

“O Ministério da Saúde não está parado. A dimensão e a complexidade da situação que enfrentamos requer serenidade, na medida de que estamos a falar de uma forma do direito à greve se não for recebido com muita capacidade de diálogo pode reverter-se numa situação extremada para o que precisamos de garantir a seguir à greve que é o trabalho em equipa”, afirmou.

Os pedidos e as acções do Governo

Marta Temido lembrou que desde o início da legislatura o Governo já alterou o horário semanal de trabalho, que passou das 40 para as 35 horas, repôs o valor das majorações do trabalho suplementar e das horas de qualidade e o reforço das contratações. “Isto eram os elementos do programa do Governo. O programa em relação as profissões de saúde está cumprido. Penso que as boas notícias geram um sentimento de maior expectativa. O que sentimos dos grupos profissionais é o desejo que o Governo consiga a responder mais rapidamente às expectativas que as possibilidades do país.”

Uma das reivindicações não atendidas é a criação da categoria de enfermeiro especialista. Marta Temido salientou que desde o início do ano os enfermeiros especialistas que estão a exercer a especialidade estão a receber um suplemento de 150 euros mensais, “o que comporta uma despesa de 17 milhões de euros”.

E explicou por que o Governo não atendeu ao pedido e na proposta que apresentou aos sindicatos a especialidade aparece como uma função. “Um enfermeiro que é especialista em obstetrícia e que trabalha num bloco de partos e muda para o Instituto Gama Pinto, que é de oftalmologia, não continua a fazer a especialidade de obstetrícia e não deve continuar a receber o suplemento. A longo prazo esse efeito será corrigido por uma melhoria do salarial. Esta posição de manutenção do grau tem essa justificação.”

"O Governo pondera recorrer à requisição civil por causa da greve dos enfermeiros?", quis saber o deputado do PSD Luís Vale. A ministra mostrou-se confiante: "Gostaria de dizer que não vai haver necessidade de medidas extremas porque vamos chegar a soluções. Não nos parece que estejamos perante nada que possa dar azo à aplicação da requisição civil."

A governante reforçou que o ministério tem trabalhado com os conselhos de administração dos hospitais afectados no acompanhamento da evolução dos casos críticos e no sentido da "utilização máxima dos tempos de bloco acordados nos serviços mínimos e com os piquetes à greve".

"Uma coisa é o exercício à greve, outra são os piquetes decidirem quais as salas que vão estar abertas. Não me parece que prejudique o direito à greve que haja melhor gestão para satisfazer as prioridades clínicas", acrescentou.

Negociações com técnicos de diagnóstico longe do fim

Quanto ao processo negocial sobre a carreira dos técnicos superiores de diagnóstico e terapêutica. a ministra admitiu que está "longe de ser concluído". Os técnicos superiores de diagnóstico e terapêutica estão a realizar desde o passado dia 5 uma greve em dias intercalados, que se prolonga até ao final do ano, em defesa da revisão e regulamentação da sua carreira, para que seja "reposta a igualdade de tratamento com outras carreiras".

Os sindicatos que representam estes profissionais tiveram uma reunião na segunda-feira, no Ministério da Saúde, em que lhes foi apresentada uma nova proposta que, segundo as estruturas sindicais, "traz alguns reajustes em posições salariais, contudo muito longe dos objectivos traçados" pelos sindicatos.

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